sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Manifestações impróprias

Cesar Vanucci *

“O representante do povo que votou a favor do aumento não é digno.
Isso não é um parlamentar, é para lamentar.”
(Dom Emanuel Edmilson da Cruz, Bispo de Limoeiro do Norte)

Guido Mantega, que se notabilizou como um dos artífices da bem sucedida política econômica na era Lula, recomeçou suas atividades como Ministro da Fazenda marcando bobeira. Duas declarações suas, pertinentes ao piso salarial, foram de molde a criar situação de visível constrangimento para o governo. Na primeira vez em que foi pilhado falando pelos cotovelos anunciou a disposição de “vetar” qualquer valor superior a R$ 540,00 para o salário mínimo. Essa “ultrapassagem” imprópria nos limites de sua alçada gerencial rendeu-lhe sonora e merecida reprimenda presidencial. Nem assim ele se quietou. Sem que o semblante se tingisse em momento algum de rubor, “acenou” generosamente com a possibilidade de ser adicionada à parcela já acordada a nível de governo outros polpudos... cinco reais. Fez jus, obviamente, a puxão de orelhas mais severo. Ignora-se tenha sido aplicado.

Manifestações como essas denotam ausência de sensibilidade social de quem as formule. Recendem, vamos e venhamos, a escrachado deboche. O homem da rua associa de pronto, tomado por sacrossanta indignação, os destramelados pronunciamentos, vindos afinal de contas de uma fonte do poder, com o descerimonioso reajuste salarial autoconcedido recentemente pelos congressistas, com extensão a setores do Executivo e Judiciário. Reajuste, por sinal, promulgado sem qualquer discussão prévia com os setores encarregados de formular a política orçamentária para o exercício. Está certo: a opinião pública possui consciência plena de que, nos últimos oito anos, período em que o país experimentou auspiciosamente o mais significativo avanço social da história, o salário mínimo cresceu em termos reais a um ritmo nunca dantes visto, bem acima dos índices inflacionários. O fato, entretanto, não consegue anular, de maneira alguma, o desconforto causado pela inevitável comparação que se faz compreensivelmente nas ruas entre os números citados nas declarações inoportunas do Ministro e a realidade factual do despropositado aumento de ganhos concedido a privilegiados servidores do Estado.

Manda a verdade reconhecer que o Ministro não tem culpa no cartório no tocante à estapafúrdia decisão do Parlamento. Decisão essa, bom que se reitere, afrontosa à Nação, ao cidadão e à cidadã contribuinte, conforme desassombradamente asseverou o bispo emérito de Limoeiro do Norte, Ceará, dom Manuel Edmilson da Cruz. Este aqui é o clérigo que recusou, em sinal de protesto, na tribuna do Senado, a condecoração que lhe foi conferida pelo trabalho pastoral promovido em favor dos excluídos sociais. Ele deu eco a um inconformismo popular que Guido Mantega não tinha o direito de desconhecer à hora em que se dispôs a comentar a questão salarial correspondente à turma do andar de baixo.

O melhor a ser feito pelo governo, nesse palpitante caso do salário mínimo oficial, objeto de debate político salpicado de rebates demagógicos por parte dos contendores de todas as correntes políticas, é estabelecer um índice de elevação mais substancioso do que o previsto. Isso se ajusta à perfeição ao compromisso da Presidenta Dilma Roussef em imprimir maior celeridade ainda ao resgate da dívida social acumulada por tantos anos em desfavorecimento da classe assalariada. E se o aumento sair de tamanho a mexer pesado nas contas, o aconselhável é determinar aos tecnocratas assessores da Fazenda e de repartições afins que dêem tratos à bola e descubram rubricas orçamentárias a serem devidamente alteradas, de modo a fazer justiça às parcelas menos favorecidas da população, para que possam ser contempladas com um quinhãozinho a mais do bolo da riqueza nacional.

E, por último. Já que mencionado acima o pito governamental dado no titular da Fazenda, cuidemos de anotar também a ressonância favorável perante a opinião pública da reprimenda atribuída pela presidenta, no exercício inconteste de sua autoridade, ao ilustre Chefe da Segurança Institucional, gen. José Elito Siqueira, pelas impropriedades cometidas nos comentários feitos a propósito da dorida questão dos desaparecidos políticos.

* Jornalista (cantonius@click21.com.br)

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