Cesar Vanucci *
“Se o Lula é o cara eu, então, sou o vice-cara.”
(Tirada bem humorada de José Alencar,
o vice do povo, diante do registro afetuoso
de Barack Obama ao Presidente Lula)
Deu-se com José Alencar coisa parecida com a de personagem ternamente retratado em magistral poema de Manuel Bandeira. Na chegada ao céu, São Pedro, o próprio, recebeu-o. Mandando abrir a porta, foi logo dizendo: - Vamos dispensar as formalidades. Trate de ir entrando.
Nada a dizer, a respeito do extraordinário ser humano que acaba de “partir primeiro” (lembrando verso de outro poeta, Camões), que já não tenha sido falado. Nas ruas e nos lares. Nas tribunas e púlpitos. Nas manchetes dos jornais. Nas cenas da televisão e nos microfones das estações de rádio. Na imensidão oceânica da navegação solidária dos internautas.
Colossal coral humano deu voz, reverentemente, a mais genuína das emoções. Exaltou por todas as formas de expressão conhecidas os dons invulgares do Vice que por mais tempo ocupou, na história brasileira, a Presidência da República. Louvou sua sabedoria e poder empreendedor. Sua conduta impecável do ponto de vista ético. A inteligência e criatividade assomadas em tudo quanto botou a mão. A crença fervorosa na democracia e o sentimento nacionalista que lhe impregnaram a vida. Sua sensibilidade social acurada na lida cotidiana e sua esperança inesgotável, brotada de impulso generoso da alma. A fé em valores transcendentes, que asseguraram pelo tempo inteiro da peregrinação pela pátria terrena a reconfortante certeza, como propõe outro poeta mais (Raul de Leone), de “que o sentido da vida e o seu arcano é a aspiração de ser divino no prazer de ser humano.”
Testemunha ocular, até por dever de ofício, de muitos acontecimentos relevantes destes nossos efervescentes tempos (na verdade, trinta e cinco anos já completados por duas vezes consecutivas), carrego a certeira convicção de que as manifestações de carinho da gente do povo, no adeus ao guerreiro JA, só podem encontrar equiparação nas despedidas dadas pelas multidões, observada a ordem cronológica, a Vargas, Juscelino e Tancredo. Basta tal constatação para se aquilatar a magnitude do real papel desempenhado por Alencar na cena pública brasileira. O sentimento das ruas não costuma falhar no julgamento de suas lideranças.
Desfrutei do privilégio de manter convivência próxima a Alencar por um bocado de tempo na Federação das Indústrias de Minas Gerais. Eu estava Superintendente Geral do Sistema Fiemg, cargo exercido, modéstia às favas, com zelo e dedicação, por três décadas, ao longo das gestões dos saudosos Fábio de Araújo Motta, Nansen Araujo e, dele próprio, JA. Sua militância como dirigente classista, principiada em Ubá, onde presidiu a Associação Comercial, estendeu-se em Belo Horizonte , num primeiro momento, ao âmbito da Associação Comercial de Minas. De sua ativa intervenção nos trabalhos da prestigiosa entidade tomava conhecimento amiúde por informações trazidas, subretudo, por Luiz de Paula Ferreira, seu leal parceiro em grandiosas empreitadas empresariais, e José Costa, saudosa e legendária figura da indústria da comunicação. Um determinado dia, Luiz de Paula, vice na Fiemg, anunciou aos demais dirigentes da casa a decisão tomada por Alencar de passar a concentrar prioritariamente suas atividades classistas na instituição representativa da indústria. Como não poderia deixar de ser, receberam-no ali com muita euforia. Ele já despontava, àquela altura, como o maior empresário do ramo têxtil no país. Galgara degrau importante na trajetória de líder patronal ao assumir a presidência do Sindicato das Indústrias de Fiação e Tecelagem do Estado de Minas Gerais.
No Sistema Fiemg, teve atuação fulgurante. Começou como diretor, membro e depois presidente do Conselho de Estudos Econômicos, vice-presidente e, finalmente, entre 1988 e 1994, presidente. Presidente que deixou o legado de obra incomparável, do ponto de vista de uma política empresarial centrada no desenvolvimento econômico e das ações sociais, culturais e educacionais atribuídas ao Sesi e ao Senai. O impacto das realizações foi de tal ordem que, a partir de certo momento aquele cidadão de forte personalidade e irradiante simpatia à testa da Fiemg, já admirado em muitos setores pela reluzente performance como arrojado empreendedor industrial, passou a atrair de modo todo especial a atenção da opinião pública e dos partidos políticos.
Deixo, pra sequência, o relato sobre alguma coisa dos feitos acumulados na gestão de JA no Sistema Fiemg.
* Jornalista (cantonius@click21.com.br)
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