Perguntas que não calam
Cesar Vanucci *
“Uma pergunta sem resposta é um engasgo contínuo.”
(Antônio Luiz da Costa, professor)
Quinze anos passados, a tremenda farsa criminosa foi oficialmente desfeita. O Supremo Tribunal Federal acaba de confirmar, de maneira cabal e insofismável, aquilo que todo mundo neste vasto território brasileiro – incluídos aí os aborígines das derradeiras tribos a serem ainda contatadas pelos sertanistas da Funai – estava calvo de saber.
PC Farias, considerado o elemento mais bem informado do colossal esquema de corrupção que arrastou os “cara pintadas” pras ruas e provocou o impedimento de Fernando Collor, não foi vítima de crime passional coisissima nenhuma. Ao contrário do que as autoridades alagoanas na época insistiram em alardear – sabe lá o diabo com que malignos intuitos! – louvados em laudos periciais fajutos, a trágica morte do ex-fiel tesoureiro da campanha do Presidente deposto não se deu em razão de disparos de revolver feitos por Suzana Marcolino, sua namorada. Namorada essa, como se recorda, que além de “eliminar” o parceiro, “acometida” de “sufocante remorso”, resolveu, logo após perpetrar o homicídio, em “ato de desespero”, com um tiro fatal na cabeça, “deixar” também, pra sempre, este nosso vale banhado de lagrimas.
Ambos, os dois, PC e Suzana, foram, isso sim, vítimas de assassinato encomendado por personagens até hoje, inexplicavelmente, não identificados. Esses misteriosos mandantes contrataram os serviços de pistolagem dos próprios seguranças da vítima. A saber, Adeildo dos Santos, Reinaldo Correira de Lima Filho, Josemar dos Santos e José Geraldo Silva, todos eles, ainda hoje, ao que se sabe, prestadores de serviços regulares a familiares de PC.
Analisando o farsesco processo em derradeira instância, o ministro Joaquim Barbosa, do STF, resolveu, agora em junho, debaixo de estranhável silêncio por parte da mídia, acolher a sentença, proferida em novembro de 2002, pelo Juiz Alberto Jorge Correia Lima, de uma das Varas Criminais de Maceió. A sentença em causa determina que os ex-seguranças de PC, denunciados em 1999 pelo Ministério Público, juntamente com o então deputado Augusto Farias, irmão da vítima, como autores do duplo homicídio, sejam conduzidos a julgamento popular. O nome de Augusto Farias foi excluído, na decisão do STF, da relação dos acusados sob a alegação de inconsistência de provas.
Os denunciados comparecerão a júri, provavelmente em setembro vindouro. Quem sabe se, até lá, outras revelações não possam vir a público! Posto que definida legalmente, pela mais alta Corte da Justiça no país, a verdadeira natureza do evento criminoso ocorrido em 23 de junho de 1996, em Guaxima, litoral alagoano, ficará restando ainda a ser devidamente esclarecido, a propósito dessa bem configurada “queima de arquivo”, um bocado de coisas. Coisas desse gênero: quem foi ou quem foram os mandantes do duplo assassinato? Relembremos que César Farias havia sido convocado pela Câmara dos Deputados a prestar depoimento numa CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). O interrogatório foi programado para a mesma semana em que acabou ocorrendo o sanguinário atentado. O objetivo da CPI era apurar o relacionamento promiscuo de algumas empreiteiras com o governo. O que acabou acontecendo, afinal de contas, com aquela investigação? Seguiu em frente? Chegou a alguma conclusão? Ou foi “abafada” após a retirada de cena, em circunstâncias trágicas oficialmente reconhecidas, do protagonista apontado como principal executor das operações ilícitas que envolveram movimentações no exterior de contas fantasmas de elevado valor pecuniário? A lista dos financiadores do esquema fraudulento, quem a possui? Em poder de quem ficou a grana depositada lá fora?
Difícil saber se as respostas a essas perguntas serão, algum dia, trazidas ao conhecimento da sociedade. Mas, de certo modo, a realização do julgamento de alguns dos elementos comprometidos na trama criminosa montada com a finalidade de ocultação dos fatos cria – quando pouco – ambiência propícia para a reabertura de discussões em torno desses incandescentes acontecimentos ligados ao caso mais rumoroso de corrupção registrado na história brasileira contemporânea.
* Jornalista (cantonius@click21.com.br)
“Conselhos” para um belo infarto
Cesar Vanucci *
“Se não puder permanecer no escritório à noite,
leve tarefas para casa e trabalhe até tarde.”
(Um dos “conselhos” do cardiologista Ernesto Artur)
Não resisto a tentação de passar adiante uma mensagem enviada pelo correio eletrônico por vários amigos, ao mesmo tempo. Imagino que todos eles levaram em conta a hipótese de que este desajeitado escriba acabasse se interessando por divulgá-la, de forma a atrair a atenção de alguns de seus 25 confessos leitores para os valiosos e úteis conselhos, em linguagem bem humorada, transmitidos na mensagem.
O texto tem como autor um cardiologista, Ernesto Artur. Intitula-se “Doze conselhos para se ter um infarto feliz!”
Anotem aí:
“Quando publiquei estes conselhos 'amigos-da-onça' em meu site, recebi uma enxurrada de e-mails, até mesmo do exterior, dizendo que isto lhes serviu de alerta, pois muitos estavam adotando esse tipo de vida inconscientemente. Aqui estão eles, novamente.
1. Cuide de seu trabalho antes de tudo. As necessidades pessoais e familiares são secundárias.
2. Trabalhe aos sábados o dia inteiro e se puder também aos domingos.
3. Se não puder permanecer no escritório à noite, leve tarefas para casa e trabalhe até tarde.
4. Ao invés de dizer não, diga sempre sim a tudo que lhe solicitarem.
5. Procure fazer parte de todas as comissões, comitês, diretorias, conselhos e aceite todos os convites para conferências, seminários, encontros, reuniões, simpósios etc.
6. Não se dê ao luxo de um café da manhã ou uma refeição tranquila. Pelo contrário, não perca tempo e aproveite o horário das refeições para fechar negócios ou fazer reuniões importantes.
7. Não perca tempo fazendo ginástica, nadando, pescando, jogando bola ou tênis. Afinal, tempo é dinheiro.
8. Nunca tire férias, você não precisa disso. Lembre-se que você é de ferro (e ferro, enferruja!).
9. Centralize todo o trabalho em você, controle e examine tudo para ver se nada dá errado. Delegar é pura bobagem; é tudo com você mesmo.
10. Se sentir que vem perdendo o ritmo, o fôlego e pintar aquela dor de estômago, tome logo estimulantes, energéticos e antiácidos. Eles vão “te” deixar tinindo.
11. Se tiver dificuldades em dormir não perca tempo: tome calmantes e sedativos de todos os tipos. Agem rápido e são baratos.
12. E, por último, o mais importante: não se permita ter momentos de oração, meditação, audição de uma boa música e reflexão sobre sua vida. Isto é para crédulos e tolos sensíveis.
Repita, com entusiasmo, para você mesmo: Eu não sou homem que perca tempo com bobagens. Duvido que você não tenha um belo infarto, se seguir à risca, tão “saudáveis” conselhos.
Anotação adicional importante sobre ataques de coração:
Há outros sintomas de ataques cardíacos, além da dor no braço esquerdo (direito). Há também, como sintomas vulgares, uma dor intensa no queixo, assim como náuseas e suores abundantes.
Pode-se não sentir nunca uma primeira dor no peito, durante um ataque cardíaco. 60% das pessoas que tiveram um ataque cardíaco enquanto dormiam, não se levantaram... Mas a dor no peito pode acordá-lo dum sono profundo.
Se assim for, dissolva imediatamente duas aspirinas na boca e engula-as com um bocadinho de água. Ligue para Emergência (193 ou 190) e diga ''ataque cardíaco'' e que tomou duas aspirinas. Sente-se numa cadeira ou sofá e force uma tosse. Sim, forçar a tosse, pois ela fará o coração pegar no tranco. Tussa de dois em dois segundos, até chegar o socorro. Não deite.
Passe adiante. Alguém, com toda certeza, se beneficiará.
* Jornalista (cantonius@click21.com.br)
Peripécias de orador
Cesar Vanucci *
“Quem fala muito dá bom dia a cavalo.”
(Adágio popular)
Chegou na Associação de Pais e Mestres no finzinho da reunião e foi logo recebendo da Presidente inesperada incumbência: saudar visitantes ilustres do exterior. Professores e estudantes da Pensilvânia, campeões de “wakeboarding”. “Enfatize o feito esportivo. Vamos entregar-lhes um troféu. Temos interesse em fortalecer o intercâmbio com eles.” Foi o que disse a presidente, sem lhe conceder tempo para argumentar, antes de deixar, às carreiras, a sala. Toda festiva, os braços abertos em sinal de fraterna acolhida, caprichando no timbre de voz para os “rauduidus” de praxe, ela conduziu a comitiva até o auditório. “Eles apreciam pontualidade e eu também”, asseverou.
- E essa agora? Questionou-se com os seus botões, pensamento embaralhado, o nosso indigitado orador. Lamentou haver comparecido à reunião. “Não estaria agora a pagar esse baita mico. E que diacho de coisa é esse tal de “wake sei lá o quê?!” Sentiu-se perdido em meio a solitárias e silenciosas indagações. Lançou um olhar súplice ao redor. Percebeu logo que ninguém ali estava a fim de compartilhar suas aflições. A mesa da sessão começava a ser composta. O público numeroso cuidava, em ruidosa movimentação, de se apoderar dos assentos não ocupados no auditório. Suas ruminações mentais não calavam. Tentava, embalde, consolar-se com a idéia de que, diante da inevitabilidade da incômoda situação, o melhor a fazer era relaxar. Classificava, tardiamente, de supina besteira a concordância dada, dias antes, para a inclusão de seu nome, como orador, na chapa da Associação. O hino de abertura da sessão acabara de ser entoado. A hora do pronunciamento se acercava e ele ainda sem saber como se arranjar na fala pros gringos. Pior, consciente da condição de analfabeto de pai e mãe com relação ao tal esporte de nome complicado. Que tal se invocasse ajuda da Medalha Milagrosa? Descartou a opção por lhe parecer oportunista, consideradas as circunstâncias de nunca lhe haver passado pela cachola a intenção de integrar o grupo de devotos fervorosos da santa. Na busca de auxílio providencial, agarrou-se à idéia de invocar São Judas Tadeu. Adepto do santo não podia, em boa e leal verdade, dizer que era. Mas, de qualquer maneira, pesava a favor o fato de haver acompanhado a patroa em celebrações no santuário erigido em louvor de São Judas pela veneração popular. Mesmo após a invocação sentiu a estrutura óssea balançar, no momento crucial da chamada à tribuna. O coração saltitante, esmerou-se em pronunciar pausadamente as palavras. Rodeou toco o quanto pôde, com filigranas retóricas. Não se atreveu, estrategicamente, uma vez sequer, a citar a modalidade esportiva em foco. Com algum domínio da situação, deixou-se arrastar pela empolgação. Proclamou então que os homenageados, educadores de escol e coisa e loisa, cumpriam exemplarmente histórica missão, aplicando os recursos de um esporte tão apaixonante e valoroso no burilamento da têmpera e caráter dos jovens. Lastimou que tão enriquecedora prática não recebesse entre nós o incentivo devido. Arrancou, para surpresa, uma ovação. Os desportistas campeões abraçaram-no efusivamente, impressionados com tão incisivo apoio á sua causa esportiva.
Um grupo de estudantes, seu filho entre eles, trouxe-lhe, na hora dos cumprimentos, inusitada proposta. Já que se confessara simpático à prática do “wakeboarding”, a moçada resolvera elegê-lo, ali mesmo, patrono do nascente time do educandário. Tocava-lhe, à vista disso, a suprema honra de abrir, com substanciosa doação, o livro de ouro instituído para a aquisição do material de treinamento. Meteu o chamegão no livro, sem tugir nem mugir, o sorriso amarelo, com a cara de quem estivesse conquistando o troféu de “cavalgadura do ano”.
Ainda por se refazer das imprevisíveis emoções do dia, sentiu a língua coçar de tanta vontade de perguntar ao filho, na volta pra casa, o que vinha a ser mesmo esse tal de “wake... sei lá bem o quê...”. Faltou coragem...
* Jornalista (cantonius@click21.com.br)
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