Faces múltiplas do terrorismo
Cesar Vanucci *
“Os judeus patrocinam a invasão da
Europa por imigrantes islâmicos.”
(Estapafúrdia tese de Anders Breivik,
o terrorista norueguês, que se diz cristão)
A apavorante tragédia norueguesa deixa insofismavelmente evidenciado que o terrorismo fundamentalista possui faces múltiplas. E serve para recolocar no centro dos debates momentosos da história de nosso tempo a necessidade de uma tomada de posição vigorosa da sociedade humana, como um todo, no sentido de estabelecer eficazes mecanismos de controle e defesa social com relação à atuação desvairada de radicais religiosos e políticos de diferentes crenças e matizes.
Não abrindo mão, a pretexto algum, dos valores éticos e preceitos de liberdade de expressão definidos nas convicções democráticas e humanísticas que devem permear sempre a convivência saudável entre nações, grupos e pessoas, a humanidade precisa concentrar atenções prioritárias nessas falanges incendiárias de pensamento extremista, fruto de um caldo de cultura corrosiva e deletéria, que estão a estender ameaçadoras ramificações por tantas paragens deste nosso planeta azul.
Tomemos emprestada ao Islã a expressão talebã para classificar esse tipo de vivente carregado de ódio pelos semelhantes que não compartilhem de suas confusas idéias religiosas ou políticas. Essa expressão, sabemos bem, mostra-se, de modo geral, desvirtuada de seu conceito original em decorrência dos desatinos praticados por radicais religiosos de facções muçulmanas que agem sobretudo no Paquistão e Afeganistão e que engrossam as fileiras da notória Al Quaeda. Mas, tão sinistros quanto os de lá, há os talebãs de cá. Como se viu, agora, por exemplo, em Oslo. E como se tem visto em ações alarmantes, sem a mesma fúria demolidora, em numerosas ocasiões noutros diferentes lugares. Os Estados Unidos, para acrescer novo exemplo.
Não está nada difícil perceber, para quem tenha olhos para enxergar e ouvidos pra escutar, os atos espalhafatosos e os ruídos raivosos produzidos por esses talebãs de diversificadas tendências religiosas e políticas com o objetivo de convulsionar o ambiente. Eles se fazem pregoeiros, em não poucos momentos com manifesta ferocidade verbal e física, de uma ordem de coisas retrógrada, que chega a tomar a feição, como já se disse, de uma “selvageria civilizada”. Propugnam pela manutenção de notórias iniquidades sociais. Trabalham infatigavelmente a derrocada dos postulados democráticos e humanísticos que conferem dignidade a aventura humana. Racistas de nascença, incorporam às praticas cotidianas atitudes preconceituosas contra minorias indefesas. Condenam, em diligentes esforços, procedimentos e projetos que possam desembocar em almejados avanços sociais, em conquistas científicas. E por ai vai. Profligam, enfim, com exacerbação mórbida tudo que não se encaixe devidamente no catálogo de restrições rançosas que alegam vivenciar e que desejam impor aos demais como dogmas de fé, na base inquisitorial do “crê ou morre”.
Esses talebãs de carteirinha, de etnias, nacionalidades e confissões religiosas diversificadas, proclamando-se até, por vezes, hostis uns aos outros (embora não passem de farinha do mesmo saco; é só por tento no que falam e como agem) representam potencialmente riscos para a paz e harmonia na convivência comunitária. Em qualquer lugar onde estejam a disseminar as idéias estapafúrdias de sua demente interpretação do jogo da vida.
Os adeptos das teorias fundamentalistas com inclinação terrorista, não importa se afegã ou norueguesa, ou de qualquer outra nacionalidade, representam desafortunadamente, nesta quadra da existência humana, apesar de sua expressão numericamente insignificante no contexto populacional, uma parcela de indivíduos bem mais encorpada do que seria de admitir no atual estágio de nosso desenvolvimento cultural e tecnológico.
Cartão vermelho e mosca azul
“Vou demiti-lo!”
(Exclamação da Presidenta Dilma, ao tomar
conhecimento da entrevista de Jobim à revista “Piauí”)
Mesmo sabendo que o enredo político possa comportar, nas linhas gerais, razoável dose de surrealismo, não há como deixar de admitir que a passagem de Nelson Jobim pelo palco governamental foi assinalada por excesso psicodélico.
O ex-titular da Defesa protagonizou, com certeza, o único caso conhecido na crônica política internacional contemporânea em que um elemento confessadamente de oposição foi chamado a integrar, como titular de pasta de importância estratégica, uma administração governamental da qual guardou sempre frontal discordância. Dono de forte personalidade e reconhecida erudição jurídica, com seu singular jeito de ser, timbrado por embriagante autossuficiência, Jobim acumulou evidências de posicionamentos pessoais assumidamente contrários às manifestações políticas do gabinete governamental de que fez parte. As inconfidências do “Wikileaks” que puseram em polvorosa um sem número de graduados na vida pública de numerosos países, surpreenderam-no em desconfortáveis circunstâncias. Em que pesasse sua condição de responsável por um Ministério importantíssimo no contexto da soberania nacional, ele foi flagrado, em interlocuções com agentes diplomáticos estrangeiros, a criticar abertamente a política externa de seu país, tendo como alvo sobretudo o companheiro de Ministério na pasta das Relações Exteriores. Por coincidência, o mesmíssimo personagem que, após o cartão vermelho mostrado a Jobim pela Presidenta Dilma Rousseff, convidando-o a deixar o gramado, foi distinguido com o honroso convite para assumir, em seu lugar, as relevantes funções. Noutro instante de perplexidade, ouviram-no empregar em voz alta, para ser ouvido por jornalistas, palavras de inequívoco menosprezo à qualificação e capacidade de colegas, como ele, componentes da equipe responsável pela gestão dos negócios públicos brasileiros. Na sequência, voltou a provocar aturdimento com a revelação, assim sem mais, nem menos, de que seu voto, na eleição presidencial passada, foi dado ao candidato da oposição.
No arremate das trapalhadas veio aquele grosseiro achincalhe, com inocultável sabor machista, em declarações a uma revista, a duas companheiras de Ministério. A tentativa tardia de desculpar-se pelo malfeito, com a “alegação” de que a entrevistadora interpretou equivocadamente suas palavras, não colou. A Presidenta, como de resto, a opinião pública, entendeu esgotados os limites da tolerância para com o comportamento estranho, pode-se dizer mesmo belicosamente frenético, do Ministro. A consequência foi seu defenestramento.
Tantas acabaram sendo, afinal, as aprontações de Nelson Jobim que, no espírito de muita gente, brotou até a impressão de que, com sua boquirrota e contínua presença na mídia, o ex-titular da Defesa, tocado – quem sabe – pela “mosca azul”, andou querendo mesmo firmar um conceito como protagonista político, que seja aproveitado, de certo modo, para cacifar eventuais pretensões eleitoreiras.
Suponho que o ilustre alcaide de Belo Horizonte, Márcio Lacerda, não seja o único gestor público a utilizar aeronaves fretadas para atendimento de alguns compromissos noutras regiões. Suponho, também, que existam ocasiões emergenciais, bem delineadas como tais, na lida de organizações com complexidade administrativa, em que o emprego dessa modalidade de transporte aéreo encontre fundada justificativa. Doutra parte, entendo convictamente que, adotado equivocadamente por quem quer que seja como prática usual, de modo a fazer da exceção uma regra, esse tipo de procedimento configura inapelável e indesculpavelmente esbanjamento do dinheiro do contribuinte. Todos sabemos que os aviões de carreira em nosso país são mais do que suficientes para prover as demandas rotineiras de locomoção.
* Jornalista (cantonius@click21.com.br)
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