Atentado à dignidade humana
Cesar Vanucci *
“Um crime contra a humanidade!”
(Presidente Álvaro Colom, presidente da Guatemala)
Colho num canto de página de jornal, um desses espaços reservados para o despejo de calhaus, como se diz no jargão jornalístico, informação estarrecedora. Apoquenta-me bastante a forma indesculpavelmente “discreta” adotada pela mídia para divulgá-la. Os feitos narrados tiveram impactos extremamente perversos na vida de inocentes de comunidades comprovadamente desprotegidas. Gente arrolada, pela arrogância e prepotência dos “senhores do mundo”, como cidadãos de terceira classe. Alvejados impiedosamente em sua dignidade humana.
Mas de que notícia se está mesmo a falar? Desta aqui: Comissão especial constituída pelo Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, chegou a chocante conclusão de que pelo menos 83 cidadãos foram mortos em experiências médicas secretas, promovidas por órgãos governamentais norte-americanos na Guatemala. Aconteceu na década de 40. O relatório a respeito explica que, aproximadamente, 5.500 guatemaltecos foram submetidos a exames e, desses, um total de 1.300 acabaram sendo infectados deliberadamente com doenças venéreas no curso de um programa de cunho alegadamente “cientifico”, elaborado e coordenado pelo “National Institute of Health”, agência vinculada ao Departamento de Saúde estadunidense.
O programa teve desdobramentos entre os anos 1946 e 1948. Os “pesquisadores” norte-americanos, chefiados por um “cientista” de nome John Cutler, usaram cobaias humanas, vários deles portadores de doenças mentais, para apurar se a penicilina, recém descoberta, poderia ser empregada na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. A ação “científica” consistia na inoculação de bactérias de blenorragia e sífilis nos elementos “selecionados”, na maioria, prostitutas. As “cobaias” foram estimuladas a manter relações sexuais com soldados, detentos, doentes mentais, por ai. Os “pesquisadores” acompanharam cuidadosamente a “evolução” dos experimentos, com vistas a compor um alentado acervo de “informações úteis” que pudessem vir a orientar ações terapêuticas futuras em ambientes sociais “mais refinados”, povoados obviamente por cidadãos de primeira classe.
O Presidente Obama, dias atrás, apresentou um pedido formal de desculpas ao Presidente da Guatemala, Álvaro Colom. Este, por sua vez, depois de classificar o apavorante incidente de “crime contra a humanidade”, ordenou fosse feita por cientistas guatemaltecos uma outra investigação.
Fica difícil, pacas, entender o comportamento indiferente, distante, da mídia com relação a assunto tão sério. A desnorteante história lança, também, no ar uma pergunta repleta de sombrios pressentimentos: a experiência levada a cabo pelos “cientistas malucos” teria ficado adstrita única e exclusivamente ao território da Guatemala, ou acabou se estendendo também a outras paragens, igualmente desguarnecidas na época (só naquela época?), do vasto “quintal” latino-americano?
Crise econômica e política
“O problema tem componentes políticos fortes.”
(Paul Krugman, Nobel de Economia, sobre a crise estadunidense)
Muitos consideraram inusitada a afirmação da Presidenta Dilma Rousseff classificando o rebaixamento da avaliação de risco dos Estados Unidos da categoria AAA para AA+ de “precipitado e incorreto”. O rebaixamento em questão, feito pela agência de risco “Standard & Poor’s”, equivale a dizer que o país, em termos financeiros, deixou de ser 100% confiável.
Mas Dilma não está sozinha nesse posicionamento crítico ao diagnóstico da agência. O Presidente Barack Obama, como é compreensível imaginar, foi o primeiro a rebater a reclassificação. “Nós sempre fomos e sempre seremos uma Nação AAA. Apesar de todas as crises, temos as melhores universidades, as melhores empresas e os mais inventivos empreendedores”, jactou-se. E não sem poderosos motivos, forçoso reconhecer.
As agências de risco, para muitos uma excrescência criada com intuitos sombrios a serviço da mega-especulação, costumam cometer equívocos terríveis. O Brasil que o diga. Essa aí mesmo, a “Standard & Poor’s”, ostenta em seu currículo, seguramente sem qualquer laivo de orgulho, a anotação de haver contribuído, de forma enfática, para a turbulência financeira que estremeceu o mundo a partir de 2006, com a assim denominada “crise da subprime”. Essa crise, como se recorda, produzindo reações em cadeia em diversas partes do planeta, lançou os Estados Unidos nos braços da recessão. A recessão se fez mais aguda nesse país com as ameaças de concordata, em 2008, de 274 poderosas instituições financeiras. Todas tiveram que ser socorridas pelo Tesouro, em controvertido processo de ajuda, de modo a conseguirem sobreviver. O “valioso contributo” da mencionada agência à formação da bolha que resultou na quebradeira generalizada consistiu no respaldo proporcionado a organizações que se achavam à beira do colapso total. A essas organizações, a agência não titubeou, na véspera da hecatombe, em atribuir, irresponsavelmente, notas de risco generosas.
Da mesma certeza externada pela nossa Presidenta quanto à inconveniência da reclassificação de risco do EUA partilham outros governantes e figuras exponenciais do mundo das finanças. Paul Krugman, detentor de um Prêmio Nobel de Economia, faz parte do time dos que condenam a atitude da agência. Crítico constante da política econômica de Obama, não deixa por menos: chama a “Standard” de “cara de pau”. Vai mais longe. Sustenta que o problema de seu país, neste momento, não se confina apenas ao jogo financeiro. É um embate declaradamente político. “Nossos problemas – assegura – são causados por um único lado. Mais especificamente pela ascensão de uma direita extremista que prefere criar crises a ceder um único centímetro em suas exigências.”
O que Krugman – volte-se a registrar, crítico veemente da ação política de Barack Obama – tenta passar é a idéia de que o problema que ora atormenta a maior economia do mundo tem componentes políticos fortes. Não se reveste das proporções que se lhe estão sendo dadas.
No Brasil, os ex-Ministros Delfim Neto e Luiz Carlos Bresser, entre outros personagens de destaque na vida econômica, estão também persuadidos de que a decisão da agência revelou-se errônea.
E como fica, afinal de contas, nessa encrenca toda, em cenário tão conturbado, a situação brasileira? É pergunta que se ouve com constância. “O Brasil está hoje mais bem preparado do que no passado para suportar um agravamento da crise mundial” – afiança o Ministro da Fazenda Guido Mantega.
Ele está com a razão. Falaremos disso na sequência.
* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)
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POEMA DO ACADÊMICO UBIRAJARA FRANCO
Recebemos, com satisfação, esta colaboração do Acadêmico Ubirajara Franco, da Academia de Letras do Triângulo Mineiro. Poema extraído do livro de sua autoria “O Grito da Terra”:
O CANTO DO UIRAPURU
De repente era um lamento...
Dentro da mata gigante,
como também no deserto,
qualquer barulho incerto,
é enredado pelo vento...
Da velha árvore imponente,
pela cruel serra abatida,
era o clamor inocente
de uma triste despedida.
qualquer barulho incerto,
é enredado pelo vento...
Da velha árvore imponente,
pela cruel serra abatida,
era o clamor inocente
de uma triste despedida.
De estalo em estalo tombando,
num triste adeus à floresta,
a silhueta de seus galhos
eram mãos postas rezando.
Os pássaros assustados,
seus ninhos abandonados,
partiam todos gritando...
E também a bicharada,
fugia em debandada,
a todos atropelando!...
E aquela virgem floresta,
que ficava bem à beira
do grande Rio Madeira,
viu quando o IRAPURU
- pássaro sagrado -
diante dessa malvadez,
partiu, voando de vez...
E aquela parte da mata,
ficou vazia de animais,
de pássaros e de aves,
que foram pra nunca mais...
E o que das árvores resta,
já não se chama floresta.
Quase todo santo dia,
por maldade, por ambição,
alguma daquelas velhas árvores
é morta sem compaixão!
Nunca mais do lobo o uivar,
seus ninhos abandonados,
partiam todos gritando...
E também a bicharada,
fugia em debandada,
a todos atropelando!...
E aquela virgem floresta,
que ficava bem à beira
do grande Rio Madeira,
viu quando o IRAPURU
- pássaro sagrado -
diante dessa malvadez,
partiu, voando de vez...
E aquela parte da mata,
ficou vazia de animais,
de pássaros e de aves,
que foram pra nunca mais...
E o que das árvores resta,
já não se chama floresta.
Quase todo santo dia,
por maldade, por ambição,
alguma daquelas velhas árvores
é morta sem compaixão!
Nunca mais do lobo o uivar,
naquelas noites de lua,
ou da pantera o rosnar,
ou da pantera o rosnar,
que sua força acentua...
Não mais o tamanduá as formigas devorando;
não mais fétido gambá,
Não mais o tamanduá as formigas devorando;
não mais fétido gambá,
seu predador espantando...
Também falantes araras,
Também falantes araras,
enfeitando o azul do céu,
e o bando de capivaras,
e o bando de capivaras,
nadando no brejo ao léu...
Ou o lamento do sofrê, o grito do gavião;
os arrulhos das juritis, o assobio do azulão.
Não mais aquela mina, a escorregar cristalina,
e também a cachoeira,
Ou o lamento do sofrê, o grito do gavião;
os arrulhos das juritis, o assobio do azulão.
Não mais aquela mina, a escorregar cristalina,
e também a cachoeira,
colorindo a mata inteira!...
E naquele santuário, fez-se pista clandestina,
onde pousam aviões, transportando cocaína!
E o canto do UIRAPURU,
E naquele santuário, fez-se pista clandestina,
onde pousam aviões, transportando cocaína!
E o canto do UIRAPURU,
desde então entristeceu,
e, cada vez, mais baixinho,
e, cada vez, mais baixinho,
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