Histórias inventadas
Cesar Vanucci *
“Muitos acontecimentos reais parecem
inverossímeis. O contrário também costuma ocorrer.”
(Antônio Luiz da Costa, professor)
A Internet abriu para a criatividade humana horizontes de amplitude inimaginável. Ruth de Aquino, colunista da revista “Época”, brinda-nos na edição de 8.10.12, no artigo “Sexo, mentiras e Internet”, com um conjunto de informações saborosissimas, recolhidas em meticulosa avaliação que se deu ao trabalho de promover em torno de algumas histórias inusitadas, propagadas com intensidade nas redes, que não passam, no frigir dos ovos, de invencionices armadas com o intuito de divertir. Mas sem que a maioria dos leitores se dê conta, minimamente, de seu teor fantasioso.
Como é explicado, com riqueza de pormenores no artigo, um bocado de pessoas com pendores para relatos engraçados, tem feito uso permanente dos inesgotáveis recursos dessa engrenagem midiática fabulosa, para exercícios delirantes de ficção, revestindo-os enganosamente, com certo charme, de um manto de veracidade. O embuste acaba colando e, muitas vezes, produzindo reações em cadeia inacreditáveis.
O protagonismo do Professor Fabio Flores, capixaba, 39 anos, escritor talentoso, nesse tipo de atividade intelectual, recebe atenção especial da articulista. Esmiuçando seu trabalho, ela o apresenta como um confesso criador de notícias falsas que não pretendem causar mal algum. Aliás, na concepção do próprio, inventor de historinhas que compõem um 1º de abril eterno, não se trata de notícias falsas, mas de notícias fantasiosas.
Muitas delas são conhecidas, por certo, da maioria dos leitores, tendo em vista o grau da repercussão alcançada, até mesmo no exterior. O autor dá nomes, cita lugares, descreve situações, fornece referências. Torna tudo, à uma primeira leitura, irrepreensível, fechando as portas para dúvidas.
Confessa-se verdadeiramente realizado, como criador de cenas e personagens, naqueles momentos especiais, quando, por força da divulgação assumida pelo caso, a história ganha vida própria, desencadeando discussões, provocando reações, sendo trazida a debate público. Essa passa a ser uma hora de comemoração. A invenção adquire a “legitimidade” desejada. Como os personagens só existem mesmo na cachola de quem as escreve, os relatos tendem a não causar dano a ninguém. O alvoroço levantado pelos “causos” pode, sim, dar vaza a efervescente troca de opiniões, a teses, como tantas vezes já ocorreu, mas não deixa de proporcionar aos envolvidos nas eventuais pendengas frutos de natureza pedagógica.
São numerosas as histórias boladas por Fabio e outros comunicadores que atuam nessa mesma excitante linha ficcionista que ganharam ressonância. Aqui estão algumas.
Lembram-se daquele cara que se separou da mulher, numa pequena cidade do interior, para convolar núpcias com o cunhado, um pastor? Foi um desses relatos inventados que tomou espaço considerável na mídia, inclusive no estrangeiro. E aquela outra história da mulher que impetrou ação judicial contra um sacerdote que se recusou a casá-la sob a alegação de que ela não estaria usando calcinha na hora de subir ao altar? Ou, ainda, aquele caso de outra personagem feminina que também bateu nas portas da Justiça, pedindo indenização pela circunstancia de haver sido dispensada do emprego sob a alegação do patrão de que se masturbara no banheiro durante o expediente? Se a memória do leitor está afiada, ele haverá de se recordar que esses dois temas, por incrível que possa parecer, foram parar na televisão, com bate-papos acalorados.
Não será, igualmente improvável que o próprio leitor surpreendido com o conhecimento dessas impensáveis “invenções de moda” já não tenha, nalgum momento, sido chamado, numa roda de conhecidos, a externar sua opinião sobre um desses episódios inusitados, passados marotamente ao distinto público como verazes. E, ao fazê-lo, não haja até se socorrido de argumentos sólidos para defender ou contestar o fato. Isso aí, gente boa. A vida é assim. Muitos acontecimentos reais parecem inverossímeis. O contrário também costuma ocorrer, como lembra o Professor Antônio Luiz da Costa.
Quem ganhou as eleições
“Nesse pleito, Lula confirmou o que já é do conhecimento
até do mundo mineral. (...) Trata-se da personalidade mais
forte da história política do País. (...)Dilma segue-lhe os passos.”
(Mino Carta, jornalista)
Por mais que a grande mídia nativa, por indisfarçável pirracice, se recuse a admitir, Lula e Dilma, seguidos de líderes da base aliada governamental, foram os grandes vitoriosos das eleições. Soou embaraçoso e, mais do que isso hilário, o frenético e sintomático esforço de alguns comentaristas de televisão, durante a marcha das apurações, no sentido de comparar o estrondoso triunfo eleitoral alcançado em São Paulo e adjacências com as derrotas sofridas pelo lulismo em Diadema e Salvador. O lance foi visto, ao lado de outros, como amostra loquaz da resistência obstinada que setores influentes na formação da opinião pública costumam oferecer à idéia de reconhecer a popularidade avassaladora, sem precedentes, em nossa história política, do ex-pau-de-arara e ex-metalurgico por duas vezes eleito Presidente. Resistência essa – não dá pra ocultar com sofismas – ancorada, antes de tudo mais, no preconceito cultivado quanto à sua origem pau-de-arara e operária.
Estabelecida essa constatação, há que se admitir também que os resultados eleitorais, face à complexidade das engrenagens políticas, oferecem sempre margem a interpretações as mais variadas. Isso conduz, no tocante ao pleito recente, à admissão de que a lista dos vitoriosos com visibilidade nacional está acrescida de outros nomes mais. A começar de confessos aliados de Lula e Dilma. O governador Eduardo Campos, neto de Miguel Arrais, desponta entre eles. Figura de maior expressão do PSB, partido da base, expandiu consideravelmente sua influencia na vida política brasileira, com vitórias bastante expressivas, algumas até em posição confrontante com a do governo central. Cacifou-se para voos mais ousados no cenário político. Outro governador de Estado, também engajado nas hostes governamentais, que viu aumentar o peso de sua participação nas decisões partidárias e na ação administrativa central, é Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro.
As próprias hostes oposicionistas, que experimentaram no conjunto, assinaladamente, o sabor acre de contundente derrota nas porfias mais importantes, nada obstante o alentador apoio midiático recebido de forma maciça no curso da campanha, puderam apontar, no final das apurações pelo menos uma situação triunfal entre suas grandes lideranças. É o caso do senador Aécio Neves. Menos pelas vitórias obtidas numa que outra cidade mineira em que deixou explicito seu apoio a candidaturas, o ex-governador viu-se alçado, pelas circunstâncias especiais do desempenho sofrível das lideranças tucanas paulistas, à condição de protagonista central de seu grupo partidário no jogo político brasileiro, daqui pra frente.
As eleições criaram também oportunidade para que outra liderança, apesar da derrota sofrida, ganhasse curiosamente chance toda especial de ascensão no cenário político. Caso do Prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, fundador e dirigente do PSD.
* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)
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