Drama
sombrio
“Sinistra inversão de valores!”
(Raniero Cantalanessa, pregador oficial do Vaticano)
Cesar Vanucci *
Esse
Papa, Deus louvado! Sem erro algum: é um enviado dos céus com a santificante e
espinhosa missão de reconectar o mundo com sua humanidade. As coisas que prega!
Suas palavras e gestos convocam as cabeças pensantes a uma reflexão aprofundada
sobre os dramas universais. Produzem
encantamento, surpresa e, em não pouco viventes entorpecidos pela
insensibilidade social, um certo grau de preocupação, tendo em vista as propostas
de mudanças comportamentais levantadas em favor da extinção de privilégios
despropositados.
Na
meditação da última sexta-feira santa, na Basílica de São Pedro, tivemos nova
amostra de seu estilo de liderança. Raniero Cantalamessa, frade capuchinho,
pregador da Casa Pontifícia, personagem que no ver de renomados vaticanistas
atua em perfeita sincronicidade, no plano das ideias, com o Sumo Pontífice, largou
o verbo, como se diz no popular, contra a idolatria do dinheiro. Vale a pena
conhecer o teor da pregação feita diante de Francisco e integrantes do colégio
cardinalício. Os dizeres vindos abaixo, encerrando uma condenação flamejante às
práticas neoliberalistas, foram extraídos de um artigo de Claudio Bernabucci
estampado na “CartaCapital”. Vejam só o que foi dito por Raniero:
“Judas
não nasceu traidor, tão pouco o era quando foi escolhido por Jesus. Tornou-se!
Estamos diante de um dos dramas mais sombrios da liberdade humana. Ele se
tornou traidor por dinheiro. Mamon, o dinheiro, não é um dos muitos ídolos; é o
ídolo por excelência. Ele é o verdadeiro inimigo, o rival de Deus neste mundo.
(...) Ele é o anti-Deus porque determina uma sinistra inversão de todos os
valores. Por trás de todo o mal da nossa sociedade está o dinheiro. O que está por
trás do tráfico de drogas que destrói tantas vidas humanas, a exploração da
prostituição, o fenômeno das várias máfias, a corrupção politica, a fabricação
e comercialização de armas e até mesmo – coisa horrível de se dizer – a venda
de órgãos humanos removidos das crianças? E a crise financeira que o mundo está
atravessando, não é, em grande parte, devida à deplorável ganancia de alguns
poucos? Judas começou roubando um pouco de dinheiro da bolsa comum. Isso não
diz nada para certos administradores do dinheiro publico? Sem pensar nesses
modos criminosos de ganhar dinheiro, já não é escandaloso, por acaso, que
alguns recebam salários e pensões cem vezes maiores daqueles que trabalham na
mesma casa? E que levantem a voz só com a ameaça de renunciar a algo, em vista
de maior justiça social?”
Essas
vergastadas traduzem cobranças sociais. Estão coerentes com a linha do
pensamento papal. Servem de ilustração ainda para um gesto emblemático de
Francisco adotado momentos depois da meditação aludida. Por determinação do “Papa
dos confins do mundo”, assessores seus saíram às ruas contatando famílias sem-teto,
espalhadas nas estações ferroviárias de Roma, para entregar-lhes junto com uma
mensagem pontifícia pela Páscoa, envelopes contendo generosa ajuda financeira.
Isso aconteceu enquanto se celebrava a Via-Crucis no Coliseu, com a presença
dos dignitários da Igreja.
Faltou
alguém em Nuremberg (2)
Cesar Vanucci*
“...os americanos procederam de maneira diferente
por
razoes diferentes nos casos da Alemanha e Japão”
(Daniel
Antunes Júnior, historiador)
A
propósito do comentário “Faltou alguém em Nuremberg”, o historiador, autor de livros, membro de várias Academias de Letras,
banqueiro e empresário rural Daniel Antunes Júnior, enviou-me mensagem que
considero interessante aqui reproduzir.
“Ave,
Cesar!
Na
minha visão, os americanos procederam de maneira diferente por razões
diferentes nos casos do julgamento de Nuremberg (que durou quase um ano) e da
capitulação do Japão, quando se permitiu que Hiroito continuasse como
imperador, mas sob uma nova constituição ditada pelos USA, e aceita e jurada
sem qualquer restrição.
Note-se
que no Extremo Oriente, ao contrário do que aconteceu na Europa, o conflito, praticamente,
foi apenas entre os americanos e os japoneses, estes sob o comando absoluto do general
Tojo que, condenado à morte pelos americanos, como criminoso de guerra, foi
executado.
No
julgamento de Nuremberg - cidade escolhida por ter sido sede do partido nazista
- o julgamento dos criminosos de guerra foi realizado por um tribunal militar
internacional. E este, afinal, com serenidade e retidão, condenou à forca quase
todos os hitleristas acusados de crimes de guerra, sendo os corpos levados aos
mesmos fornos onde eles cremaram as vítimas do Holocausto. A exterminação dos
judeus (muitos dos quais eram alemães de nascimento) - ponto alto das acusações
- foi qualificada como desumanidade sistemática na mais elevada escala.
Para
se avaliar a extensão da insanidade da chamada “solução final” de Hitler, basta
lembrar que, no interrogatório a que foi submetido, Rudolff Hess contestou
apenas um ponto das acusações que lhe foram feitas: que não era verdade que ele
mandara para as câmaras de gás dois e meio milhões de judeus; disse que foram
apenas um milhão e quinhentos, mesmo
porque Auschwitz tinha as suas limitações...
Consta
que, ao fim da primeira Guerra Mundial, com a vitória dos Aliados, Clemenceau,
ao atirar sobre a mesa os termos da rendição incondicional dos alemães, teria
dito que chegara a hora da vingança... E todo mundo sabe que este foi o germe
da segunda Grande Guerra, apenas cerca de 20 anos depois.
Era
preciso não humilhar os vencidos, que se renderam incondicionalmente; e até
criar condições para uma paz duradora. Nesse sentido, é inegável o esforço de
boa vontade dos americanos, a partir da Conferência de São Francisco e a
Organização das Nações Unidas, que sucedeu à Liga das Nações, tornada
inoperante a partir do momento em que os Estados Unidos dela se excluíram.
No
caso específico da Alemanha, o Plano Marshall, bem elaborado, construtivo e
substancial, bancado exclusivamente pelos Estados Unidos, foi fundamental para
o soerguimento do País que ficou literalmente arrasado com a derrocada do
Terceiro Reich. Nenhuma outra nação fez tanto pelos alemães. Em toda a história
da humanidade, nada se iguala a essa ajuda generosa do vencedor ao vencido.
Ninguém
ignora que os japoneses, assim como os alemães, são de índole beligerante,
militarista. Nos últimos tempos ambos se
envolveram com guerras de conquista.
No
caso do Japão, a constituição ditada pelos americanos, em moldes democráticos
(com as restrições em quatro pontos fundamentais de alto alcance), foi a
alavanca que possibilitou aquele País a erguer-se como grande potência
econômica. Sem manter exército, aeronáutica e marinha de guerra - uma das
restrições da nova constituição - sobrou aos japoneses tempo e recursos
suficientes para o seu invejável desenvolvimento tecnológico.”
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