Ganha quem tem mais voto
“Ação incabível, com potencial para arranhar a imagem do país.”(Ministro José Otávio de Noronha, corregedor do TSE)
É da essência democrática. Vitória
e derrota apresentam-se como contingencias naturais de um processo eleitoral.
Simples assim: quem soma mais votos, ganha; quem soma menos, perde. A regra
contempla até a inimaginável hipótese de empate.
Abrimos aqui parêntese, por não
resistir à tentação, a propósito dessa “inimaginável hipótese”, de contar o que
aconteceu, numa eleição nos idos de 50, em Uberaba, cidade de singulares e
inesgotáveis fascínios. Pra espanto geral e, de algum modo, ao inteiro agrado
dos dois grupos políticos locais mais influentes naquela época – petebistas
(PTB), aliados do PSD, e pessepistas (PSP – Partido Social Progressista) - a
disputa presidencial entre JK e Ademar de Barros terminou rigorosamente empatada.
Se a cuca não tá a fim de trair, cada candidato abocanhou 7.700 votos. Juarez Távora
(UDN) ficou bem atrás.
Parêntese fechado, retomando o
fio da narrativa, apraz-nos sublinhar, outra vez mais, fazendo coro com a
ufania das ruas, que a pujante democracia brasileira saiu muitíssimo
enriquecida, fortalecida para valer, da campanha eleitoral finda. Eleição
memorável, com epílogo eletrizante, irrepreensível do ponto de vista
institucional. Exuberante pela pluralidade de ideias e propostas apresentadas.
Eloquente na comprovação de que a democracia é território ecumênico aberto ao
diálogo e às discordâncias saudáveis.
A soberana vontade popular
apontou nas urnas, nos dois turnos, o caminho a ser trilhado pelo país na
invasão do futuro. A opinião pública deixou definidas claras responsabilidades,
no contexto do esforço nacional pelo progresso, para os protagonistas do embate
político.
Dos vitoriosos são esperadas
medidas urgentes que promovam, em ritmo acelerado, a retomada do crescimento;
que garantam o rigoroso controle da meta inflacionária, a ampliação dos programas
de inclusão social e a expansão da oferta de emprego e renda. Sem perder de
vista, em instante algum, o compromisso formal assumido com a Nação de mover
tenaz combate à corrupção, doa a quem doer, de executar as tão necessárias
reformas política e tributária, além de outras.
Dos perdedores, que saibam usar
competentemente o respeitável cacife político que se lhes foi outorgado pelo
eleitorado, participando dos grandes debates nacionais com visão crítica e
disposição construtiva.
Os desafios a enfrentar, as
mudanças a fazer são tarefas que reclamam poderosa conjugação de vontades. Na
democracia, a pluralidade de ideias oferece, por meio do diálogo e dos debates (os
mais acalorados que possam ser) a oportunidade de se firmar sólido sentimento
nacional. Ou seja, mostrarmos ao mundo quem somos e qual a contribuição que
estamos capacitados a dar na construção da aventura humana.
Assim avaliados, serena e objetivamente,
aspectos fundamentais do processo político democrático, cabe fazer, agora, um
registro da incontida surpresa, mais do que isso do enorme espanto causado
perante a opinião pública pela estapafúrdia decisão tomada por setores da
oposição, ao postularem do TSE “uma auditoria para verificar a lisura do
processo eleitoral, atendendo a dúvidas levantadas nas redes sociais.” Como bem
sublinhou o ministro João Otávio de Noronha, corregedor da Justiça Eleitoral, o
pedido não apresenta fato algum que possa colocar em xeque o sistema da
eleição. Trata-se de “ação incabível, com potencial para arranhar a imagem do
país”.
Lamentável que isso esteja
acontecendo na sequencia de um momento cívico-eleitoral da magnitude que
acabamos de viver no Brasil. As lideranças mais lúcidas da oposição estão na indeclinável
obrigação de conter essa ação desatinada, fadada naturalmente a estrondoso
insucesso. As circunstâncias dão vaza a que se reacenda na lembrança de muitos
de nós um incidente político desagradável de anos atrás. O injustificável
inconformismo de alguns dirigentes udenistas face ao triunfo insofismável de JK
na campanha presidencial levou adversários radicais a criarem artifícios ridículos
para contestar a manifesta preferência dos eleitores ao seu nome. Semearam a
confusão, mas perderam, do ponto de vista legal, a parada. Juscelino cumpriu
brilhantemente o mandato, tornando-se o personagem de maior projeção da cena
política nacional. O julgamento da história foi implacável com os talibãs da
UDN. É verdade que, mais adiante, em momento sombrio da vida brasileira, “eles”
se “vingaram”, como sabido, do grande estadista. Mas pagaram com amargo
ostracismo na memória nacional pelos atos cometidos.
Mensagens eletrônicas nocivas
“No segundo turno cresceu o volume dos conteúdos falsos.”(Silvana Batusi, da FGV)
A dedução a extrair dos fatos é
de que não existem, no momento atual, recursos legais e tecnológicos suficientes
mode garantir monitoramento adequado que impeça a ocorrência de operações
perversas nas velozes redes eletrônicas de comunicação. A cada instante pipoca um
aplicativo acenando com novidades ousadas. Ganha rapidamente espaço no
febricitante esquema de divulgação. As ferramentas lançadas ampliam o raio de
atuação fulminante dos usuários fissurados nessa variedade de diálogo. Diálogo,
como sabido, com regras bem específicas dando vaza a procedimentos
comportamentais singulares.
O jornalista Lucas Pavanelli coloca-nos,
em reportagem no “O Tempo”, diante de sugestivas informações sobre o que anda
pintando no pedaço. Focado na propagação de dados pelos avançados instrumentos
eletrônicos ao dispor do público, mostra que um aplicativo de mensagens
instantâneas foi bastante empregado em malfeitos no curso das eleições. É
revelado ao distinto público que, inteiramente fora de controle, o chamado “WhatsApp”,
adicionado recentemente ao “debate político”, virou um senhor “propagador de
mentiras”. Criando condições para trocas repentinas de mensagens de texto,
áudio e vídeo, o tal aplicativo despejou na rede de computadores um montão de
boatos. Alguns com o indisfarçável propósito de bagunçar pra valer o coreto...
É interessante acompanhar as
explicações do repórter sobre o assunto. Aqui estão exemplos arrolados: 1) Um
cara apontado como “estrategista político” postou nas redes, inicialmente no
“Facebook” e no “Twitter”, depois no “WhatsApp”, uma informação maldosa, dando
o TSE - Tribunal Superior Eleitoral - como fonte. A matéria posta para circular
“esclarece” que, “para evitar confrontos violentos”, face à circunstância da
campanha desenvolver-se em clima “muito acirrado”, as autoridades competentes resolveram
“fixar datas diferenciadas” para os votos dos eleitores da oposição (Aécio) e
da situação (Dilma). Os primeiros votariam no domingo 26; os outros no domingo
posterior, 2 de novembro”. A postagem do “WhatsApp” concernente ao caso foi
apagada tão logo um jornal registrou a solerte manobra.
Noutra postagem, transmitiu-se
“com detalhes” a “notícia” de que o ex-Presidente Lula “seria internado na
quinta-feira anterior à eleição, como forma de comover a população visando
atrair votos para sua candidata.”
No domingo, 26, das eleições, propagou-se
que Alberto Youssef, doleiro comprometido até o gorgomilo num número incontável
de falcatruas, encarcerado no Paraná, tinha morrido por envenenamento, num
típico caso de “queima de arquivo”. O tal doleiro tinha sido, na verdade,
internado, por conta de pressão baixa. A Justiça e a Polícia Federal
sentiram-se no dever de apor um desmentido público à criminosa especulação.
Outro boato maldoso propagado com
intensidade, seguindo o mesmo figurino, disse respeito ao “fato” de que “o Ministério
Público pediu o bloqueio dos bens de Lula no valor de R$ 9.526.070,64, por improbidade
administrativa.”
Ocorreu, ainda, segundo a reportagem,
outra farta divulgação sem suporte na realidade relacionada com os resultados
do pleito no segundo turno. Pouco antes do anúncio oficial dos números,
circulou intensamente a informação de que “Aécio acabou de receber telefonema.
É o novo presidente do Brasil!”
A Professora de Direito Silvana
Batusi, da Fundação Getúlio Vargas, ouvida na reportagem sobre a questão do
emprego desvirtuado dos aplicativos na campanha política, declarou que o uso
dessas ferramentas foi ainda mais frequente no segundo turno, período em que
cresceu o volume dos conteúdos falsos e dos boatos. Na opinião da especialista,
“você não pode condenar o meio por causa do mau uso.” “É óbvio que qualquer esforço
para espalhar boato e inverdade é irregular e pode enveredar para abusos na
comunicação”, embora seja difícil – pontua – “a apuração da irregularidade”.
Existe dificuldade – anota –em se
adequar a legislação à velocidade dos meios eletrônicos.
Depois de tomar tento de toda
essa encrenqueira pela boca do Pavanelli, a gente fica um tanto quanto
inclinado a admitir que nem costuma fazer o capiau lá dos cafundós triangulinos
quando topa na reta com a porqueira de um impasse sem saída: - “Tamo n’água,
seu zé, tamo n’água!”
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