segunda-feira, 30 de março de 2015

A aventura humana

Cesar Vanucci *

Somos uma ilhota desgarrada num
oceano infinito repleto de inexplicabilidades.
(Aldous Huxley)

“Admirável mundo novo - Reflexões sobre a Aventura Humana, suas venturas e desventuras”: foi este o tema de uma exposição feita por este escriba num encontro do Lions, realizado em Belo Horizonte, que reuniu no dia 6 de março passado a cúpula do Movimento Leonistico brasileiro. No trabalho em questão, reproduzido na íntegra abaixo, defendo crenças e conceitos frequentemente trazidos às considerações expendidas há anos neste espaço de ideias e quimeras.

“Sou apenas um repórter.
O que sei são simplesmente muito poucas coisas.

Mundo fantástico
Este nosso mundo velho de guerra sem porteira é fantástico.
Não apenas tão fantástico quanto a gente, dando trela à imaginação, é capaz de supor.
Mas muito mais fantástico do que a cachola mais ousadamente criativa conseguirá jamais conceber.
Ocupamos no espaço sideral, ao lado de zilhões de corpos celestes, de formatos e tamanhos diversificados, minúscula porção territorial – três quartos de água – situada entre a vastidão cósmica e a imperscrutável eternidade.
Somos, como lembra Aldous Huxley, uma ilhota desgarrada num oceano infinito repleto de inexplicabilidades.


   Qual é o papel desempenhado pelo ser humano nessa história
O que, afinal de contas, fazemos aqui? Esses 9 bilhões de seres de nacionalidades, etnias, crenças políticas e religiosas distintas, habitantes deste convulsionado planeta azul?
De onde brotou a Natureza, esse colosso de coisas, estuante de vida, que compartilhamos, de forma perdulária e inconsequente, com milhões de espécies animais e vegetais?
É um nunca acabar de perguntas sobre o sentido da vida.

As respostas esbarram nos limites do conhecimento consolidado, difíceis pacas de serem transpostos.

O conhecimento consolidado é insuficiente
O conhecimento aceito – insuficiente para explicar as coisas – prega-nos peças à pamparra.
Temos, adiante, ligeiro e emblemático desfile de amostras, colhidas ao acaso, de posturas humanas impregnadas de intransigência dogmática e preconceitos rançosos, típicos de uma interpretação equivocada da fascinante aventura humana.
A intransigência e o preconceito são posturas que não sabem distinguir mudanças essenciais, de conteúdo remoçante, dos modismos desagregadores.

A sinalização da vida
Os radicais, avessos a transformações, consideram o mundo pronto e acabado. Quando, por injunções variadas, participam de um que outro processo de reforma, fazem de tudo para que não saia reforma nenhuma. Confinam-se nos restritos domínios dos conhecimentos tolerados. Não entendem bulhufas da vasta sinalização da vida.
Galileu passou pelo que passou, por causa da atrevida teoria de que a Terra se movia ao redor do Sol. Não o contrário, como a ciência de então asseverava.
Por afirmar que a vida inteligente não constituía privilégio deste planeta, Giordano Bruno purgou nas santas chamas a heresia.
O papa Silvestre II, no século 10, foi acusado por cardeais, aliados a matemáticos, de pacto com o maligno. “Motivo”: “o incentivo dado, no ensino da matemática, à substituição dos algarismos romanos pelos algarismos arábicos.

A recepção do fonógrafo na Academia de Ciência da França
Quando o fonógrafo, tetravô dos aparelhos de sons sofisticados de hoje, foi apresentado na Academia de Ciências da França, instituição tida como a mais alta instância da sabedoria naqueles tempos, o secretário, tomado de santa ira, acusou o operador de ser “ventríloquo”. Ao depois, à vista do exótico aparelho, sem a presença do suposto “ventríloquo”, insistir em emitir sons incríveis, partiu para veredicto fulminante: “coisa do demo!”
Quando a eletricidade brotou, como um clarão de tempos novos, pareceu a muitos cientistas conceituados que o mundo ia (mais uma vez) acabar. “Ruas iluminadas por outro processo, que não o do lampião a gás? Pura fantasia!” - asseguraram doutas criaturas, do alto do pedestal.

As surpresas provocadas pelo inesgotável talento humano
Curioso anotar, nessas negações ininterruptas e hilárias das novidades nascidas dos inesgotáveis engenho e talento humanos, a presença insuspeitada, até mesmo, de personagens que, em dado instante, estimularam técnicas que alteraram a face do mundo.
Vejam só!
O presidente da IBM - essa empresa que andou criando mecanismos avançados, a pedido de Hitler, objetivando a codificação de informações que facilitassem o encaminhamento de vítimas inocentes aos sinistros campos de extermínio -, profetizou no início da era do computador, que o mundo não comportaria tão cedo mais do que uma dúzia de aparelhos de processamento de dados.
Outro saboroso prognóstico foi o de Henry Ford, no lançamento dos primeiros carros. A perspectiva de comercialização de veículos em substituição a carruagens, assegurava ele, seria bem reduzida. E não haveria chance alguma para autos que não ostentassem cor padrão – ou seja, a cor preta.

Quebrar paradigma não é nada fácil
Preconceitos geram paradigmas.
Quebrar paradigma é mais difícil do que quebrar átomo, proclamou Einstein.
Sei que na benevolente plateia que acompanha estas ruminações existem pessoas canhotas. Juntarei por isso a esta série de exemplos de reações comportamentais despropositadas, que retardam a evolução civilizatória, cenas de tempos escolares recentes.
Anos 50. Situação trivial que hoje, provavelmente, dá margem a estupefação. Alunos canhotos eram submetidos nas salas de aula a “processos educativos” especiais, mode aprenderem a escrever direito. Ou seja, com a mão direita. Surpreendi, na adolescência, colegas “esquerdistas” matriculados em escola para portadores de necessidades especiais, por conta - vejam só! - desse “defeito de nascença”.
Um derradeiro exemplo: a alucinatória condenação às historinhas em quadrinhos. Os gibis eram vistos, em tempos de antanho, como um instrumento nocivo à formação, muito embora as aventuras de Flash Gordon, Buck Rogers e outros “heróis” permitissem a embevecidos leitores a chance de informações inéditas sobre assombrosas tecnologias.
Tecnologias que acabariam incorporadas ao cotidiano: energia nuclear, raio laser, naves espaciais, esquemas inacreditáveis de comunicação à distância. E por aí vai...

Um vasto “campo minado”
Está visto pois que existe vasto “campo minado” nos roteiros palmilhados nesta nossa trepidante jornada pela pátria dos homens, no rumo do bem-estar proporcionado pelas descobertas e invenções.
Mas mesmo confrontando dissabores de toda ordem, provocados por escancarada ignorância, a civilização efetuou, com ênfase redobrada a partir do século 20, conquistas impressionantes. Realizações riquíssimas em possibilidades.
O temor do fantástico, do inexplorado ainda prolifera, até mesmo em escalões detentores dos poderes de decisão.
Advêm daí as dificuldades históricas que se contrapõem às aspirações globais de incorporar logo ao conforto humano os frutos das inovações.

Encarando o semblante da realidade
Dá pra perceber, todavia, num mundão de lugares, a presença sempre crescente, de cidadãos dispostos a encararem sem receio o semblante fantástico da realidade. Dispostos a rebaterem preconceitos e acomodações.
Batalha renhida!
Antes de empregado como meio de transporte formidável, o avião virou mortífero instrumento de guerra.
A bomba nuclear devastadora veio antes das usinas de energia.
Os laboratórios que armazenam apavorantes armas bacteriológicas são em número superior aos das pesquisas pra curas de doenças.
O preço de um único porta-aviões super equipado é superior ao PIB de dezenas de países periféricos.

Os colossais gastos com armamentos
Parte ínfima dos gastos globais com armamentos, na casa dos quadrilhões, garantiria a solução do problema da fome que assola um bilhão de criaturas; a erradicação da aids, do ebola e de outras endemias e de outros males subjacentes que martirizam multidões e agridem contundentemente a consciência humana.

Perguntas que não querem calar
Perguntas desassossegantes: quem mesmo, na clandestinidade protegida, garante o suprimento permanente de armas aos contendores das guerras intermináveis, espalhadas por tudo quanto é canto?
De onde sai essa dinheirama para aquisições de armas?
Como as armas chegam às mãos dos ativistas do terror?
Como são feitas as operações financeiras referentes a esse tenebroso comércio?

As agressões ao meio ambiente
E o que temos, afinal de contas, a dizer acerca das agressões incontroladas ao meio ambiente?
A questão da água deixa o mundo inteiro em suspense.
Na embriagadora autossuficiência e arrogância de alguns setores vale tudo para defesa de interesses nebulosos.
Um estrategista aloprado chegou a propor, certa feita, que fossem feitos testes nucleares também no solo lunar, minha Nossa Senhora da Abadia da Água Suja!

Os poderosos aliados do preconceito e da ignorância
Aliados circunstanciais do preconceito e da ignorância, o radicalismo, o fundamentalismo político e religioso, o extremismo incendiário, a prepotência, a arrogância hegemônica, a ambição descomedida por ganhos materiais, a insensibilidade social, desencadeiam desfile interminável de situações indesejáveis. Vamos a elas.
As guerras do terror e o terror das guerras. As guerras abominadas pelas mães.
A pandemia da corrupção universal.
As discriminações odiosas por causa de raça, gênero e credo.
Os sofrimentos atrozes impostos pelo machismo e racismo a negros, índios e mulheres.
As alianças diplomáticas impregnadas de hipocrisia em torno de conveniências espúrias na seara internacional.

Como é que pode?
As desigualdades sociais gritantes.
Os oitenta caras mais ricos do mundo acumulam riqueza, segundo a ONU, equivalente aos bens somados de dois terços da humanidade. Como é que pode?
O dono da maior fortuna individual do planeta possui haveres que superam o PIB de vários países africanos.
Pode ser alegado que a fortuna foi adquirida de acordo com as regras vigentes, pontuando mérito pessoal. O raciocínio parece coerente, mas dá margem a uma indagação intrigante: se o que deve prevalecer, de verdade, no jogo da vida, é o mérito pessoal, que valores, no frigir dos ovos, deveriam alcançar, então, as fortunas deixadas por Tereza de Calcutá? Mahatma Gandhi? Chico Xavier?

A economia é meio e não fim
A economia não é um fim em si mesma. Tanto quanto a ciência e a tecnologia é um meio para se atingir a um fim, sempre social.
A medida correta das coisas é o ser humano.
Nossa noção de valores está despojada de sentido humanístico e espiritual.
Isso conta – e como! – na aventura humana acorde com os ditames das mensagens de inspiração transcendente que chegam do fundo e do alto dos tempos.

Conquistas capazes de transformar o mundo
Retomemos as considerações sobre as conquistas que, apesar de tantas vicissitudes, a Humanidade amealhou como patrimônio universal potencialmente capaz de operar transformações substanciais neste maltratado planeta.
As conquistas espaciais.
Os avanços da eletrônica.
Os cliques mágicos espantosos que fazem brotar na imaginação até a ideia da transposição futura, de um ponto para outro, de qualquer tipo de matéria.
A redução das distâncias pela velocidade cada vez mais vertiginosa. Dos quase cem quilômetros horários do galope mais rápido chegamos, pouco mais de um século, passando pelos recordes dos carros, trens-balas, aeronaves, dos 250 mil quilômetros horários das viagens cósmicas.
Proponho uma equação pra queimar a mufa de qualquer vivente. Imaginemos a eventualidade de num certo momento, utilizar tal  tecnologia na mobilidade urbana. Duzentos e cinquenta mil quilômetros horários!
Alguém, no auditório, resolve deslocar-se urgentemente até Pedro Leopoldo. Ida e volta em fração infinitesimal de tempo. Será que a volta se dará num tempo anterior ao tempo da partida? Hein?
Alguém, com conhecimentos de física quântica, talvez consiga explicar melhor aquilo que este modesto repórter, com suas percepções quiméricas da aventura da vida, introduz nestas despretensiosas reflexões.

O espírito humano só funciona aberto
O espírito humano é que nem o paraquedas! Só funciona aberto, sublinham Louis Pauwells e Jacques Bergie.
O mundo que conhecemos chega a uma encruzilhada crucial.
Limiar de uma nova história.
Acumulou, de um lado, saberes e experiências que podem perfeitamente catapultar-nos a saltos de qualidade inimagináveis. Estágios evolutivos fenomenais, com a disseminação de benefícios já definidos ou potencialmente descortinados ao alcance de todos.
Mas, de outro lado, acossado pelo radicalismo de variados matizes, pelo egoísmo despojado de humanismo e de espiritualidade, pelas crueldades inerentes a essa visão distorcida dos acontecimentos, pelas meias verdades despejadas na mídia, esse mundo do bom Deus, onde o diabo costuma implantar também armadilhas, pode, de supetão, desmoronar diante de nossa apavorada contemplação.

Dá para sonhar, sim
De um lado, dá pra sonhar, sim, com a perspectiva de mais descobertas fabulosas. Por exemplo, na área das energias sutis.
Dá pra pensar, sim, no surgimento de novas fontes matriciais de energia, extraídas da Natureza, do Cosmos.
Energias que dispensem, aventando outra benfazeja hipótese, cortes cirúrgicos na assistência medicinal.
Energias que prolonguem a vida física; que possam até abolir, como profetizou o genial Nicola Tesla, as gigantescas e onerosas engrenagens modernas de produção da eletricidade. Isso tudo sem mencionar, também, avanços terapêuticos prováveis em função da decifração do código genético.

Temores existem
Mas, de outra parte, dá para temer, outrossim, que um tresloucado qualquer, impulsionado por paixão incendiária, resolva de repente apertar o botão apocalíptico, desencadeando hecatombe nuclear capaz de reduzir a escombros tudo que aí está.
Os estoques bélicos nucleares, espalhados por numerosos países, são suficientes para estilhaçar várias vezes – como se uma só não bastasse – todo vestígio de vida. E se um artefato desses caísse nas mãos de um grupo radical terrorista?
Constituem também motivos de preocupação as situações imprevisíveis, originárias de tensões levadas a extremos.
E se aquele míssil de origem desconhecida que abateu na Ucrânia um avião comercial, dizimando inocentes vidas, tivesse atingido o aparelho que, instantes antes, singrando a mesma rota, transportava de volta de uma viagem ao Brasil o presidente russo que aqui veio para o encontro dos BRICS?
E se o inofensivo drone que burlou a rígida vigilância do serviço secreto estadunidense, acercando-se da residência do Presidente do país, portasse carga explosiva?
E se os ousados e inescrupulosos invasores dos espaços cibernéticos cismassem de promover o caos nas comunicações eletrônicas, imprescindíveis ao funcionamento de praticamente tudo na vida contemporânea?

A responsabilidade dos homens e mulheres de boa vontade
Vozes místicas embebidas de generosas intenções, acionadas por esse impulso heroico da alma chamado esperança, chamam a atenção para os riscos de datas-limite. Paradoxalmente, também, profetas do catastrofismo apostam pesado na corda esticada até o limite da ruptura.
As mulheres e homens de boa vontade - esmagadora maioria - carregam na hora atual a inarredável responsabilidade de segurar firme essa barra. Como agir?
Sugiro um receituário exequível ancorado no bom senso. Utilizando, constantemente, com serenidade à mostra, os recursos especiais ao nosso alcance no enfrentamento dos problemas existenciais.
O iluminismo espiritual, as práticas humanísticas, o solidarismo social, a aceitação plena do ecumenismo, a transparência na conduta mundana. Isso aí!
Somos, os seres pensantes desta pátria terrena, portadores de alma revestida de indumentária física, pontos luminosos de refulgente irradiação energética.

Vibrações positivas pessoais contam bastante
Nossas vibrações positivas pessoais contam bastante no processo de construção de uma consciência coletiva universal; na formação de um estado de espírito global propositivo, sintonizado com os sentimentos e emoções inerentes à dignidade da espécie.

O sentido da vida
O sentido da vida e o seu arcano, proclama o poeta, é a aspiração de ser divino no supremo prazer de ser humano.
Fazer prevalecer, nas tarefas do dia-a-dia, os valores humanísticos; trabalhar com denodo a causa da justiça social; respeitar as diversidades; rechaçar o fanatismo, os preconceitos e as intolerâncias; defender a liberdade plena de os cidadãos exporem, na convivência comunitária, suas ideias, crenças, valores, costumes, culturas; enfrentar, resolutos, dentro dos ordenamentos éticos, democráticos e jurídicos, toda mazela comportamental que alveje a dignidade da vida: eis aí alinhados alguns preceitos básicos indissociáveis da trajetória pessoal dos cidadãos empenhados em contribuir para transformações que o mundo reclama.

Reinventar o mundo
É nossa, só nossa, a missão de reinventar o mundo, para que ele se torne melhor, mais justo e mais fraterno.
Fica claro que, como Leões, não podemos jamais desconhecer que Leonismo faz rima nobre com Humanismo, com Espiritualismo, com Vanguardismo, com Solidarismo, com Ecumenismo.

Agentes de transformação
Somos, homens e mulheres de boa vontade, agentes de transformação.
As vibrações positivas que emanam de nossos atos, de nossas orações, meditações, propósitos, dos ideais que alimentamos, compõem poderosa e contagiante teia de energia incandescente em condições de abrasar mentes e corações em paragens onde a esperança não tenha ainda se esvaído.
Assim a empreitada!
Francisco pede-nos não deixemos de nos indignar diante do mal, da crueldade e também não nos esquecermos de apelar para o melhor de nossos sentimentos e devoções, de tal sorte que os bons fluidos deles projetados impactem positivamente as lideranças encarregadas de tomar decisões em nosso nome, em nome da Humanidade. E que esses fluidos copiosos cheguem a envolver, até mesmo, os inimigos, de maneira a neutralizá-los nas arremetidas destrutivas.  
É o caso de botar tento na fala deste Papa providencial, bem como nas falas de tantos quantos, ao longo da história, disseram coisas parecidas.

Reflexões de um simples repórter
Vou parando por aqui.
Apraz-me imaginar haver passado aos Companheiros material razoável para reflexões sobre as venturas e desventuras de nosso admirável posto que tumultuado mundo.
Se a arenga produzida, ao contrário da expectativa, trouxe desaponto, queiram, fraternalmente, perdoar este desajeitado Companheiro.
Como alertei no comecinho da fala sou apenas, tão simplesmente, um repórter.
Não sei senão muito poucas coisas.  
Tenho dito!   Palavra de Leão!”


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