Espantoso recado
Cesar Vanucci
“Há muito mais coisas entre o Céu e a Terra
do que pode
imaginar nossa vã filosofia.”
(Shakespeare)
As mensagens dos
leitores são iguarias saboreadas com especial deleite pelos praticantes do
oficio da escrita. Mesmo quando as observações registradas fiquem em desacordo
com as ideias expostas. Se todos os que acompanham com habitualidade os textos
dos articulistas se dessem conta do prazer proporcionado por esse gênero de
manifestação é certo que um proveitoso diálogo, com valiosas sugestões, poderia
ser estabelecido entre as partes.
Falo disso para anotar,
com satisfação, mensagem encaminhada pelo leitor Clésio Lima, reportando-se a
uma história por mim narrada há um bocado de tempo, por ele considerada
“comprovação irretorquível da continuidade da vida após a morte”. Atendendo à
sua solicitação, reproduzo-a linhas abaixo.
Em meados de 1965, vim
de muda para Belo Horizonte. Advogado do SESI em Uberaba fui distinguido, pelo
saudoso Fábio de Araújo Motta, com convite para assumir a Superintendência
Geral da Federação das Indústrias. Dias antes da partida recebi carinhosa
homenagem, organizada por instituições classistas e culturais, entre elas a
ACIU - Associação Comercial e Industrial de Uberaba, à época presidida por
amigo de infância, dinâmico empresário, homem de muita sensibilidade social,
Aurélio Luiz da Costa.
Alguns meses
transcorridos fui surpreendido com a infausta notícia da morte de Aurélio, por afogamento,
num rio que banhava as terras de sua fazenda em Mato Grosso, trazida pelo amigo
Joaquim Roberto Leão Borges, valoroso deputado estadual, de saudosa memória. A
convite de Leão Borges, acompanhei-o a Uberaba, participando da cerimônia de
despedida do dileto companheiro que havia “partido primeiro”. No avião, em tom
confidencial, pedindo-me reserva, Joaquim expressou preocupação quanto a
rumores circulantes em torno da hipótese de que Aurélio houvesse sido vítima de
um atentado. Por força da imprecisão e inconsistência dos dados colhidos a
respeito, estava havendo compreensível relutância dos parentes em pedir a
abertura de um inquérito formal. Guardei a informação debaixo de reserva. Não
abordei jamais o assunto com nenhuma outra pessoa, a não ser o próprio Joaquim
Roberto e, ao que me lembre, em apenas uma outra oportunidade.
Vinte anos se
passaram. Numa noite de sexta-feira, durante viagem que costumava fazer quase
que mensalmente em visita a familiares radicados no Rio de Janeiro, acompanhei
meu saudoso irmão, Augusto Cesar Vanucci, então diretor da linha de espetáculos
musicais e programas de humor da Rede Globo, a um centro espírita de Caxias.
Espiritista convicto, Augusto era recebido ali como uma espécie de patrono da
instituição, coordenando também ações humanitárias promovidas em favor da
inclusão social.
Nessas suas idas
semanais ao Centro levava sempre conhecidos e colaboradores. Fazia parte do
grupo de acompanhantes daquela noite uma cantora famosa, às voltas com
problemas que acreditava pudessem ser solucionados com a orientação espiritual
fornecida no local. Cerca de doze sensitivos movimentaram os chamados trabalhos
de incorporação mediúnica. Faziam-se intérpretes de mensagens, em sua
totalidade de tom edificante, em meio a citações de passagens evangélicas de
inspirado conteúdo. Ao final de cada mensagem era declinado o nome do autor,
figura conhecida no meio artístico, já desapartada de nosso convívio.
Na última manifestação
ouvida declinou-se também, no final, um nome: Aurélio. Tendo em conta os
antecedentes exclusivamente artísticos dos outros nomes mencionados, palpitei,
de mim para comigo, que o tal Aurélio tivesse sido, talvez, violoncelista da
Sinfônica Brasileira. Mais não avancei em especulações, ansioso que estava, com
o almejado final da extensa reunião, em poder deixar o local, para colocar, com
o mano, em lugar mais apropriado, a prosa familiar em dia.
No exato momento da
saída, aproximou-se, semblante acolhedor, gestos profusos de simpatia, o último
dos sensitivos a se pronunciar. Foi logo dizendo que o Aurélio da derradeira
mensagem era alguém que, em vida, partilhou de minha convivência. A reação
sincera que tive, de pronto, foi registrar que não me lembrava de ninguém, de
minhas relações, com esse nome. Sem me dar tempo para reflexão, o médium
retornou à carga, revelando, para meu completo aturdimento, nada mais nada
menos do que isso: o nome todo do ser desencarnado responsável pela mensagem
era Aurélio Luiz da Costa, falecido há 20 anos. Ele, Aurélio, pedia-me – asseverou
meu interlocutor – passasse um recado ao seu também amigo, Joaquim Roberto Leão
Borges, a fim de desfazer um tremendo equívoco. Sua morte, por afogamento, no
rio, fora acidental, causada por uma convulsão, e não fruto de qualquer ação
criminosa.
Foi exatamente desse
jeito, sem tirar nem por, que se passou essa história incrível vinda a lume por
meio de um processo desconcertante e misterioso de comunicação com o além. Um
processo que, naturalmente, cria para muita gente dificuldades intransponíveis
de entendimento e explicação.
Argutas
ponderações
Cesar Vanucci
“Há décadas mantemos a maior taxa de juros real
do universo.”
(Delfim
Neto)
Delfim
Neto continua proporcionando com análises objetivas, despojadas do
passionalismo ideológico frequentemente empregado por outros comentaristas de
presença destacada na praça, uma visão bastante lúcida da política econômica
vigente. Vale a pena conhecer um pouco das avaliações por ele feitas nesta hora
de tantas leituras equivocadas.
A
revista “CartaCapital” estampa semanalmente seus comentários. Num deles, edição
nº 874, de 4 de novembro passado, deparamo-nos com revelações sumamente
relevantes que convidam à reflexão.
O respeitado
economista assinala que defrontamo-nos na atualidade com “a destruição do equilíbrio
estrutural numa velocidade assustadora”. Depois de registrar que o déficit
fiscal médio no período de 2011 a 2013 foi bem comportado (2.6 por cento do
PIB), lamenta que em 2014 os efeitos do que chama de “voluntarismo” sobre a
evolução da economia emergiram em plenitude, disso resultando “inacreditável aumento
de 16% na relação Dívida Bruta/PIB em apenas quatro anos!” Delfim não deixa por
menos: compara nossa taxa de juros a um animal teratológico. Emite conceitos a
respeito que lembra a pregação persistente, desassombrada, contra o juro alto,
de um personagem ilustre da história política e empresarial brasileira, o
saudoso vice José Alencar. Constata: há décadas cultivamos a maior taxa de
juros real do universo. Faz um prognóstico desagradável: vamos continuar a
tê-la, a não ser que nos mostremos dispostos a alterar os rumos das coisas.
Aponta saídas: “a coordenação entre a política fiscal, a política monetária e a
política de administração da dívida pública, tecnicamente muito boa, precisa de
uma mudança radical para transformar a economia brasileira numa economia
“normal”, com taxa de juro real “normal”, que reflita as condições e as
expectativas de um país com sólidas instituições (as nossas estão cada vez mais
fortes), com uma política econômica inteligente, adotada com cuidado e respeito
às restrições físicas, históricas e geográficas.”
Delfim
Neto lança uma pergunta no ar. Abre aspas: como um governo que começou tão
virtuoso em 2011 perdeu-se num emaranhado de intervenções setoriais que conduziram
à confusão que estamos vivendo em 2015? Fecha aspas. Na resposta à própria
interrogação emite a hipótese de que o governo Dilma Rousseff não entendeu corretamente
a sinalização dos acontecimentos à sua volta. “A virtude de 2011 elevou a
aprovação do governo Dilma a 92 por cento no início de 2012 (65% de
“ótimo-bom”, mais 27% de “regular”, segundo a “Data Folha”), mas ela a leu
muito mal. Apoiada nesses números iniciou uma intervenção arbitrária na taxa de
juros.” Deu no que deu. Os movimentos da taxa Selic influenciaram negativamente
os negócios afetos às atividades produtivas. Conclui, então: “Com o juro
arbitrariamente no nível mais baixo e sua aprovação no máximo, ela aprofundou o
voluntarismo ativo: emitiu a Medida Provisória 579, em setembro de 2012, com o
objetivo louvável de construir a “modicidade tarifaria” e tornar o setor
produtivo mais competitivo, o que, infelizmente, terminou no desastre
antecipadamente anunciado... Daí para a frente, as intervenções voluntaristas
se sucederam nos portos, nas concessões etc. Nunca, na história deste país,
tanta boa intenção, com tanto apoio na sociedade, terminou tão mal...”
Argutas
ponderações!
A
assustadora tragédia de Mariana
Cesar Vanucci
“Perdão foi feito pra gente pedir”.
(Verso
do cancioneiro popular brasileiro)
Tenho
também algo a dizer sobre a espantosa tragédia de Mariana.
A
esperança é a última que morre, como consta da saborosa fala das ruas. Abranda
as asperezas da caminhada. Esse impulso generoso da alma bebe inspiração nas
fontes humanísticas. E o humanismo, no sábio modo de pensar de Oto Maria
Carpeaux, representa para o ser humano a própria razão de viver.
Mas,
“pera” lá! O que têm a ver os edificantes conceitos acima alinhados - interrogarão,
por certo, os condescendentes leitores destas mal datilografadas – com o
aterrorizante acidente de Mariana que este desajeitado escriba se propõe a
comentar? Explico tudo, com detalhes, mais adiante.
O que
toca reconhecer na história reportada, antes de mais nada, é que não há mesmo
como desfazer o estado calamitoso de coisas gerado a partir do rompimento das
barragens. A avalancha de rejeitos de mineração consumiu vidas preciosas.
Varreu do mapa povoados inteiros. Destruiu plantações. Assoreou de forma
irreparável rios e pequenos cursos d’água. Danificou seriamente o meio
ambiente. Estilhaçou empreendimentos produtivos. Afetou o abastecimento de água
em dezenas de localidades. Arrasou monumentos históricos, entre eles a Capela
de Bento Rodrigues, erguida em 1718. Em suma, instalou o caos em vastíssima
extensão geográfica, revolvendo dramaticamente o cotidiano de milhares de
pessoas.
É de
se presumir que, a esta altura, já tenham sido mapeados e avaliados os avassaladores
efeitos do tsunami que desabou da montanha de minério. Enquanto se processam as
investigações dos órgãos técnicos competentes, com vistas a precisar causas e a
definir responsabilidades legais, acumulam-se no ar perguntas suscitadas pela
indignação e sofrimento das vitimas e pela perplexidade e inconformismo da
sociedade. Paralelamente a isso, como decorrência do clima de comoção existente,
assiste-se também a mais uma exemplar demonstração coletiva de solidariedade,
sob a forma de substanciosa ajuda popular aos desabrigados.
Até
aqui, o que se tem, em termos formais de prestação de contas, por parte do
poderoso complexo empresarial responsável pela atividade minerária na região e
dos setores oficiais com explícito protagonismo no palco da dolorosa
ocorrência, deixa muito a desejar. Nas fugidias manifestações trazidas a público
pouca coisa foi feita ou dita que possa ser considerado, mesmo com boa vontade
na apreciação, em condições de amortecer ligeiramente o desencanto, pra não
dizer a revolta reinante no seio da opinião pública. As apurações apontam imperdoável
displicência na forma de agir dos donos do negócio da exploração mineral de
Mariana, no pertinente à prevenção de riscos. A constatação soa como crítica,
igualmente, à atuação dos órgãos fiscalizatórios.
O que
vem de ser exposto remete a irretorquível certeza. A comunidade alvejada pelo
traumatizante episódio sente-se desamparada. Reclama esclarecimentos
indispensáveis até aqui sonegados.
Aí,
precisamente neste ponto, é que me permito encaixar os conceitos alinhados no
preâmbulo do comentário. Ponho-me a imaginar, com a força de uma aspiração legítima,
carregada de inquieta esperança – eco, como não? do sentimento popular – que a
qualquer momento desses, com atraso que a indulgente opinião pública saberá
relevar, os dirigentes das empresas e os representantes dos órgãos públicos
envolvidos no desgastante processo convocarão rede de televisão e cadeia de
jornais e rádios para um mea culpa histórico. Abandonando a postura arredia
assumida, que enodoa a história pessoal de cada um, farão um anúncio solene,
começando com pedido de desculpas à sociedade, das providências completas que,
a curto, médio e longo prazos, pretendem colocar em execução no sentido da
reconstrução, reparação e compensação exigidas por essa situação terrível que virou
de cabeça pra baixo a vida de tanta gente.
Perdão,
como se diz na canção famosa, foi feito pra gente pedir. Quanto à esperança,
repita-se, ela é a última que morre. O tempo, no caso reportado, ainda não se
esvaiu de todo. Isso alenta a expectativa de que, de súbito, um sopro de bom
senso e lucidez possa brotar no coração dos personagens que detêm o poder das
decisões nessa tormentosa história, animando-os a adotar a atitude correta
aguardada. Mesmo que eles se vejam forçados, em seus efervescentes afazeres cotidianos,
a lidar por vezes com interpretações equivocadas e utilitaristas da aventura da
vida. Interpretações essas suscetíveis de desencorajar gestos de grandeza como
o que acima se preconiza.
O AMARGO FIM DO RIO DOCE
O Engenheiro Agrônomo
Augusto César Soares dos Santos, membro da Academia Mineira de Leonismo, é o
autor deste elucidativo vídeo a respeito do tsunami de lama provocado com a
ruptura das barragens em área de exploração minerária de Mariana, MG.
Para assisti-lo na integra é só clicar no link abaixo.
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