Francisco,
pontífice e estadista
Cesar
Vanucci
“Cada ser humano é mais importante do
que o deus dinheiro”.
(Papa
Francisco)
Para
uma humanidade aturdida com os desmandos econômicos, as distorções sociais, o
radicalismo ideológico, a prepotência política originária de incontroláveis
ambições hegemônicas, a palavra de Francisco ressoa como um lenitivo. Um reconfortante
jato de esperança.
Na
recente peregrinação pela África, continente largado à própria sorte pelos
homens e, às vezes, pelos próprios deuses das diversificadas crenças cultivadas
por seus injustiçados habitantes, vemo-lo, novamente, no impecável exercício do
magistério espiritual e no altivo desempenho da função de grande estadista. O
Papa dos confins do mundo expediu de novo convocação às lideranças e às
criaturas providas de consciência social. Pediu-lhes repensem os rumos
trilhados pela sociedade neste mundo do bom Deus em que o tinhoso, com a
cumplicidade de um montão de gente, costuma plantar atemorizantes enclaves.
Mostrou a necessidade imperiosa da reformulação das estruturas socioeconômicas
de modo a proteger a essência da vida.
Quênia,
Uganda e República Centro-africana, países que simbolizam com crueza a injustiça
e miséria imperantes neste planeta azul, ouviram-no dizer que se sentia em casa
nos contatos feitos com as periferias profanadas em sua dignidade humana. Na
formulação da agenda de viagem tentaram dissuadir Chico de botar os pés nos
citados países. Os riscos em matéria de segurança seriam demasiados. “Vou de
qualquer jeito”, redarguiu. “Se não puderem me levar, eu me atiro de
paraquedas”. Acerca de possíveis ameaças de atentado (declaração atribuída a
enfezado dirigente do ”Califado”, dizia que ele seria o último Pontífice), fez
uso também de seu bom humor: “Mais do que das pessoas, na África tenho medo dos
mosquitos”.
Circulando
em veículo sem proteção blindada nas regiões visitadas proferiu palavras de incomum
sabedoria. Sobre o terrorismo: “A experiência demonstra que a violência, o
conflito e o terrorismo se alimentam do medo, da desconfiança e do desespero
que nascem da pobreza e da frustração”. Acentuou ainda que o nome de Deus “não
pode ser usado para justificar o ódio e a violência”. Voltou a profligar a
sistemática da corrupção, espalhada como erva daninha por tudo quanto é canto:
“A corrupção é um caminho de morte, existindo em todas as instituições, também
no Vaticano”. Proclamou que os pobres representam a estrela guia de seu
pontificado, fazendo alusão ao que chamou de “sabedoria das periferias”. “Uma sabedoria que brota de obstinada
resistência do que é autêntico, dos valores evangélicos que a sociedade do bem
estar, entorpecida pelo consumo desenfreado, parece ter esquecido”. Arrematando
um dos pronunciamentos, registrou que “cada ser humano é mais importante do que
o deus dinheiro”, anotando que a ninguém é concedido o direito de “desconhecer
a terrível injustiça da marginalização urbana” (...), “uma ferida provocada
pelas minorias que concentram o poder e a riqueza, que os dilapidam
egoisticamente, enquanto a crescente maioria das pessoas precisa refugiar-se
nas periferias abandonadas, poluídas, descartadas”.
Esses
luminosos conceitos foram extraídos de um relato, rico em pormenores, sobre a
viagem de Francisco, feito pelo jornalista Claudio Bernabucci, da
“CartaCapital”.
Tenda
de Deus
Cesar
Vanucci
“Natal é a exuberância vital de Deus
derramada no mundo.”
(Juvenal
Arduini)
Vasculhei
os arquivos à cata de texto natalino, com mais de duas décadas, da lavra deste
desajeitado escriba. Não consegui localizá-lo, mas em compensação “recuperei”,
por assim dizer, uma genial mensagem, guardadinha lá no fundo da gaveta, o
papel já com aquela tonalidade amarelecida do desgaste do tempo, de ninguém
mais, ninguém menos, que Juvenal Arduini. Exatamente, do sábio orientador de inúmeras
gerações universitárias. Saudoso e lendário personagem de lutas memoráveis, uma
vida inteira consagrada à construção humana. Sacerdote, professor, sociólogo,
deixou gravadas, com ternura infinda, nos corações e mentes de milhares de
pessoas, imagens de sua presença fulgurante no púlpito e na cátedra. O fascínio
de seu verbo e a universalidade de sua pregação ficam bem evidenciadas nesse
trabalho de sua autoria, a propósito da magna data do calendário cristão, que será
estampado hoje neste espaço, com notória vantagem para os leitores. A todos meus
votos de um Feliz Natal!
“Natal
é a exuberância vital de Deus derramada no mundo. Ele veio ao mundo para ficar
conosco e misturar seus passos aos nossos. Deus quis chegar à humanidade
passando pelos caminhos humanos. Fez-se criança. Veio com olhar de criança,
ternura de criança, inocência de criança, beleza de criança. Chegou como
criança para não assustar-nos. Deus não gosta de amedrontar. Nós é que usamos o
“nome” de Deus para intimidar os outros. E para nominá-los.
Jesus
nasceu pobre. “Não havia lugar” para ele. Foi colocado na manjedoura de
animais. Quis ser solidário com os pobres. Ensinou-nos a anunciar o Evangelho e
a “lavar os pés” dos pobres.
O
pintor Georges de la Tuor mostra Maria que apresenta o Menino, com as mãos
generosas, em gesto de oferta. Maria está a dizer que a Criança não lhe
pertence. Pertence à humanidade. As mãos de Maria entregam o Projeto de Deus a
todos nós. Cumpre-nos concretizá-lo.
O
Verbo se fez carne. A Palavra de Deus comparece ao mundo envolta em tecido
humano. A humanidade esconde e revela o significado de Jesus, que pensa, fala,
alegra-se, chora, angustia-se, sente compaixão pelos doentes e famintos. É
profundamente humano, sem deixar de ser Deus.
A
Criança de Belém é tenda, onde Deus habita. Nessa tenda, o pastor nômade vai
buscar a humanidade nas encostas e nas veredas. O amor do Pai enviou o Filho
para salvar a humanidade. Natal lembra a humanidade toda, mas de modo especial
o desempregado, o enfermo, o desnutrido, o angustiado, o injustiçado, o morador
de rua. Cristo quis morar entre nós para repartir a vida plena, para valorizar
o ser humano, para dignificar a criança, a mulher e o excluído.
Natal
é festa e compromisso. É alegria e práxis. Celebrar o Natal é prolongar a
presença viva de Jesus. Natal é agir hoje, como Cristo agiu em seu tempo. Natal
é limpar a consciência, é espalhar o amor, plantar a justiça, ativar a
solidariedade, repensar a história, suscitar o clamor profético, é intensificar
a libertação radical. Natal é sacudir o torpor, quebrar a rotina, desencarvoar
o rosto cínico, fazer saltos, é ousar o inédito, recuperar a ética vitalista, é
atalhar a decomposição política. Natal é reativar a Fé, enraizar a
fraternidade, abolir o trabalho infantil nocivo, é resgatar a dignidade
daqueles que foram expropriados de sua humanidade. Natal é partir mais uma vez
com Jesus.
É
teu Natal, Jesus. Ajuda-nos a espantar as sombras. Ajuda-nos a sair da noite.
Ajuda-nos a “refazer” o mundo, para que nossa humanidade tenha teu semblante,
tua voz, tua ternura, teus gestos, tua esperança. Criança de Natal ajuda-nos a
crescer contigo. Ajuda-nos a ter a coragem de seguir tua audácia. Criança do Natal:
és água da sabedoria, és arquiteta do universo, és palavra escrita em carne, és
tenda de Deus.”
A
carta de Temer
Cesar
Vanucci
“Agravo vulgar à política é confundi-la
com a astúcia.”
(Gracián,
pensador espanhol)
A
carta endereçada por Michel Temer a Dilma Rousseff, apontada por alguns de seus
correligionários como um gesto de astúcia política para o momento, é um
documento desprovido de grandeza. Empobrece a biografia do Vice-presidente.
Encaminhada às redações dos telejornais na mesma hora (ou quem sabe até antes)
da entrega à destinatária, faz pouco caso da inteligência das pessoas.
Não
há como o Vice, por mais que se esforce, desvencilhar-se do importante papel
exercido como protagonista de proa, tanto pras coisas boas quanto pras
negativas, neste enredo politico administrativo dos últimos cinco anos de
governo. Seu partido, revelando-se cada dia mais peemedebista do que nunca, ocupa com reconhecida voracidade postos e
instâncias decisórias num punhado de ministérios, secretarias, organizações
estatais, empresas mistas. Muitos nomes de projeção de seus quadros estão sob
mira nas investigações da Justiça. Querer, então, de hora pra outra,
descerimoniosamente, passar para o respeitável público, até subliminarmente, a
ideia da existência de uma antiga dissociação de interesses, de uma
discordância aguda em torno de questões capitais na condução dos negócios
administrativos em relação ao governo do qual faz parte, chega a ser risível,
pra não dizer melancólico.
O
que se recolhe do episódio é uma sinalização a mais de que a Nação brasileira
vê-se diante de uma conjuntura política amarga e confusa, frustrada por identificar
nas lideranças, em todas as legendas, personagens despojados de ideias,
imaginação e criatividade.
E,
por falar nisso, não é que o Eduardo Cunha continua desafiando abertamente a
consciência cívica e democrática brasileira com suas danações?
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