quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Incrível profecia

Cesar Vanucci


“Está na vida o mistério.”
(Henriqueta Lisboa)

Amável mensagem do renomado escritor Carlos Perktold, a proposito do artigo “Espantoso recado”, publicado na edição de 14 de novembro do DC, animou-nos a trazer outro relato instigante na linha da chamada “temática transcendente”. Antes, entretanto, de recontar a estranha história, vejamos o que Perktold falou:  “Ave Cesar, Incrível sua coluna de hoje, da qual acredito de A-Z. São mistérios que vamos demorar milhões de anos para descobrir.
Maior surpresa ainda foi sabê-lo irmão do Augusto Cesar Vanucci, que nos deixou cedo e era brilhante diretor de espetáculos da Globo, ator, participou de vários filmes nacionais. Era meu admirado à distância. Meu abraço”.

Agora, sim, vem o relato prometido.

Tanto quanto a morte, a vida é recheada de mistérios imperscrutáveis. É como, aliás, sublinha Henriqueta Lisboa, em sugestivo registro poético: “Não na morte. Está na vida o mistério. Em cada palavra ou abstinência.” Fatos desconcertantes e enigmáticos, inexplicáveis sob as luzes mais profusas do conhecimento consolidado, deixam gravada na memória e na emoção da gente, por vezes, uma interrogação que nos acompanha pela existência inteira. Ao longo de extensa caminhada como repórter e como estudioso de fenômenos transcendentes, pude reunir expressivo acervo de casos instigantes que, pelo tradicional enfoque da lógica racional, não passam de tremendas charadas de interpretação impossível.

Aqui está um desses casos.

Abril de 1952. Eu deixava a redação do “Diário do Triângulo”, localizada na avenida Leopoldino de Oliveira, centro da cidade de Uberaba, para uma reportagem.  Naquele tempo o córrego das Lajes deslizava, como sugestivo adorno, por toda a extensão da avenida. Não havia ainda sido enclausurado nas entranhas da terra em nome de uma questionável modernice urbanística. O jornal era dirigido por Souza Junior, filho de Nicanor de Souza, pioneiro no jornalismo diário na região do Triângulo Mineiro.

Procurava um transporte, quando avistei, estacionando nas imediações, o jipe de um grande amigo, o então pracista de produtos farmacêuticos José Marcus Cherém. Ele ofereceu-me carona e, atraído pelo assunto da pauta que iria cumprir, dispôs-se a acompanhar-me pelo tempo necessário na coleta dos dados.

É hora, a esta altura, de explicar que o meu deslocamento, naquela manhã, a uma casa modesta, de cinco cômodos, na região da Abadia, prendia-se à intrigante revelação de que no local estava ocorrendo uma sucessão de fenômenos sobrenaturais que mantinham moradores e vizinhos em verdadeiro sobressalto. Objetos se movimentavam de um lugar pra outro como se mãos invisíveis os empurrassem. Escritos a carvão eram impressos, de repente, nas paredes, ao mesmo tempo que pequenos focos de incêndio irrompiam, brusca e assustadoramente, num ou noutro ponto do lugar. Tinha-se ali bem configurado o que especialistas em parapsicologia costumam denominar de “polstergeist”, expressão vinda do alemão. Cabe, agora, esclarecer que muitos especialistas na matéria costumam estabelecer uma estranha conexão entre o fenômeno e a presença, nas moradias em que ocorre esse tipo de manifestação, de adolescente em fase inicial de menstruação. Para o pessoal da redondeza a casa era mal assombrada e regida por forças demoníacas.

Seguindo com máxima atenção o que vinha rolando, depois de providenciar a limpeza das paredes da sala onde a escrita a carvão era misteriosamente produzida, trancamos a porta que dava acesso à dependência por uns poucos minutos. Ao reabri-la, o inacreditável explodiu diante dos olhos. Paredes, teto e piso estavam coalhados de dizeres. A frase mais saliente, espalhada por tudo quanto é canto, anunciava: “Cherém, futuro deputado!” Tomados de assombro, pudemos testemunhar que os registros caligráficos, nos termos descritos, se repetiram por mais de uma vez, até o fenômeno, passados alguns dias, se extinguir tão subitamente quanto começou.

Os dizeres a carvão tiveram força de presságio. Anos mais tarde, José Marcus Cherém, optando de repente pela carreira política, foi eleito, sucessivamente, vereador, presidente da Câmara de Uberaba, vice-prefeito, deputado estadual, vindo a exercer o cargo de Secretário de Estado. Bem provavelmente, teria chegado, por força de talento, simpatia e méritos, ao Congresso Nacional, caso não houvesse sido arrebatado prematuramente de nosso convívio por uma enfermidade cardíaca. Lembro-me bem: na semana que antecedeu sua partida, visitando-o no hospital, consagramos, os dois, um bom pedaço do papo fraternal entre amigos de longos anos à rememoração daquela incrível profecia, expressa de modo tão perturbador e enigmático numa manhã de abril do ano de 1952, no bairro da Abadia, em Uberaba.


Interrogações inquietantes

Cesar Vanucci

“Pergunta, em tom entre intrigado e irônico: mas quem será
que vende as armas ao Estado Islâmico e seus terroristas?”
(Mino Carta, jornalista)

A trajetória do “Califado Islâmico”, com sua apavorante visão do mundo, é repleta de inquietadoras interrogações. A crueldade dos atos praticados pela falange fundamentalista deixa um rastro de aturdimento e indignação no espírito popular. Leva as pessoas a matutarem sobre quais poderiam vir a ser mesmo as causas mais remotas de tão incontrolável fúria.

Fica inadmissível supor que a intolerância religiosa, mesmo no grau de exacerbação mais elevado, seja capaz de desencadear tantas manifestações hostis aos que professem ideias diferentes das expressas nos “dogmas de fé” do EI. “Dogmas” esses criados nas cacholas enfermas desses falsos arautos do Islã. Aliás, porta-vozes credenciados do Islã, uma corrente espiritual de nobres inspirações humanísticas, ocupam as fileiras da frente na condenação pública veemente às execráveis interpretações dos textos sagrados feitas por esses fanáticos engajados em “guerra santa” contra a civilização. O Papa Francisco classificou, recentemente, de “blasfema” a alegação de que as calamidades produzidas por obra do Califado atendem à vontade divina. Mas, olhando bem por dentro a questão, é possível chegar-se também à conclusão de que a busca de justificativa para a maldade constitui, desde sempre, um esforço totalmente inócuo.

A expansão crescente do Califado gera um punhado de desassossegantes interrogações. As explicações fornecidas a respeito das situações cabulosas detectadas deixam muito a desejar.

De onde procede essa dinheirama toda aplicada pelo EI? Ainda agora, depois do “massacre de inocentes” em Paris, repetiu-se que os recursos do movimento terrorista advêm da venda de produtos extraídos dos poços de petróleo sob seu controle. Mas, “pera aí”. Tal explicação chega a ser simplória. É lógico supor que um bombardeio aéreo bem articulado, dos numerosos feitos pelas aviações mais bem equipadas do planeta, possa desmantelar em poucos momentos qualquer estrutura de produção, refino e armazenamento de combustível. Existiriam, por acaso, razões supervenientes, bastante poderosas, acima da compreensão comum, que desaconselhassem reação armada nesses termos?

Avancemos um pouco mais. A comercialização de combustível pressupõe montagem de esquemas logísticos eficazes para que o produto seja levado do ponto de partida ao destino. Estamos falando de oleodutos, frota de caminhões, transportes marítimo e ferroviário. Desnecessário sublinhar que tudo isso também pode ser neutralizado em curta fração de tempo com ataques aéreos.

Outro lance intrigante. Venda e compra de óleo não são feitas, obviamente, sem intercessão bancária. Qual é o sistema bancário que dá sustentação às  transações? Seria impraticável para órgãos de segurança dos governos interessados averiguarem como se operam as negociações?

Há outros aspectos nebulosos (ou serão tenebrosos?) a comentar. As tropas do EI, a televisão não cansa de mostrar, dispõem de considerável equipamento bélico. São tanques, mísseis, carros de assalto, artilharia pesada, por aí. Aceitando, para fins de argumentação, a discutível tese de que esse arsenal tenha sido formado com exclusivo material capturado aos adversários, deparamo-nos com um probleminha logístico de solução complicada. Como é que os terroristas se arranjam com a reposição de peças? E com a renovação dos estoques de munição? Como tudo chega até eles? As fontes fornecedoras das mercadorias essenciais ficam localizadas onde mesmo? E, de novo, quais são as conexões bancárias utilizadas?

Já se aventou a hipótese de que o Califado seja financiado, nos bastidores, por forças ocultas. Fundamentalistas encastelados em centros decisórios do poder político de outro país. Talvez até de algum país integrante da coalizão montada para combate a aguerrida facção. Caso de relembrar aqui desnorteante revelação há tempos trazida a público pelo jornalista e cineasta Michael Moore. Conta ele que nas mesquitas de Riad, capital da Arábia Saudita, ocorreram efusivas celebrações por ocasião da derrubada das Torres Gêmeas em Nova Iorque.

São numerosas, visto está, as charadas que clamam por decifração. A começar pela tremenda dificuldade que os observadores encontram, em não raros momentos, para definir com precisão quem está inteiramente contra ou inteiramente a favor de quem.  Confusão das arábias. O caótico cenário está tomado por movediços interesses e conveniências geopolíticos, econômicos, militares.
                                                                                                                                                                 

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