Fatos
alentadores em meio à crise
Cesar Vanucci
“O trabalho persistente vence tudo.”
(Virgilio)
Tens razão. A situação anda mesmo
braba. Abracadabrante, diria o “primo rico”, do inesquecível Paulo Gracindo. “Indomável
que nem potranca no cio”, como por certo registraria também o saudoso coronel
Ranulfo, lá das bandas do Triângulo, nos bons tempos de fastígio político, em
seu proseado de tinturas sertanejas.
A paisagem dos negócios não exibe,
pra desconforto geral, a floração exuberante que nos acostumamos a ver em
épocas afortunadas. Mas no fundo, bem no fundo da alma popular, ainda não se
esvaiu de todo a inquieta esperança por dias mais bonançosos. Cada brasileiro
carrega esse impulso heroico, sabedor das incomparáveis potencialidades deste
País. Confiante na capacidade empreendedora da valorosa gente brasileira,
sente-se à vontade em apostar as fichas na perspectiva de que iremos conseguir,
nalgum instante, sobrepujar as adversidades. A marcha em direção ao futuro não
pode ser interrompida.
A comparação do Brasil com o mar, já empregada
noutras ocasiões, conserva atualidade. Na contemplação do mar não se pode falar
apenas de enjoo. O enjoo se aplica unicamente a travessia de duração limitada.
Mesmo com essa profusão de
indicadores negativos no plano econômico, derivados em grande parte de
políticas governamentais reconhecidamente equivocadas, dá pra identificar em
numerosos setores registros encorajadores de ações positivas. São exemplos de
construção humana dados por cidadãos empenhados em suplantar percalços com
vistas à expansão dos negócios. São acionados pela benfazeja ambição de conquistar
novos patamares de desenvolvimento.
Atento à leitura de notícias
estampadas, dia desses, numa única edição de jornal, este desajeitado escriba
conseguiu coletar, de uma só tacada, facilmente, significativa amostra da
saudável disposição que move muita gente, com o espírito de cidadania aflorado,
em antepor iniciativas produtivas à crise que nos ronda.
Fatos, vamos aos fatos. A “Ansia
Motors”, montadora de veículos sino-árabe, acaba de bater o martelo em torno da
implantação em Minas Gerais, município de Sete Lagoas, de unidade destinada a
produzir, já no primeiro ano, 25 mil carros. O investimento de 2 bilhões prevê a
criação de 2.500 empregos diretos. Além de modelos convencionais, a fábrica
produzirá carros elétricos e híbridos. Investirá, adiante, em motores, tratores
e eletroeletrônicos. Está prevista também a exportação dos produtos para países
da América Latina e Estados Unidos. O diretor da empresa, Moeth Ahmed, declara
peremptoriamente não temer a situação econômica vivida pelo Brasil. “Entendo
todos os desafios por que passa o País e tenho conhecimento de todos os índices
importantes, como PIB, inflação e desemprego, mas entendo que o Brasil dispõe
de mercado muito poderoso, na medida em que 30% dos 230 milhões de habitantes
têm carro”, assinala.
Enquanto isso, a “RPC Group” confirma
investimentos de 250 milhões na instalação de uma fábrica de embalagens em
Montes Claros. A linha de produção contemplará as áreas de alimentos, cosméticos
e medicamentos. O “Café Três Corações” informa, por sua vez, que estará implantando,
também em Montes Claros, já agora no primeiro trimestre de 2016, uma unidade
produtora de cápsulas.
De Uberaba chegam informações de que
duas empresas firmaram compromisso para instalação de unidades no Parque
Tecnológico do município. São elas a Araunch e a Nelltec. A “Oi” revelou
haver fechado financiamento de 1 bilhão e 200 milhões de dólares, mais de 4
bilhões de reais, com o “China Development Bank”. Dinheiro a ser aplicado em
modernização tecnológica.
Acusando crescimento de 15% no
faturamento, que alcançou 1 bilhão e 600 milhões de reais, a “Drogarias Araujo”
vai aplicar 100 milhões em um novo centro de distribuição em Contagem. O dirigente
da rede, Modesto Araujo Neto, acentua que a expectativa da cadeia é passar das
atuais 150 lojas para 450, em 5 anos. Lembra que o ano de 2015 começou
desafiador, já que as vendas caíram nos primeiros meses. “Mas o impacto
negativo acabou virando uma alavanca para que a rede reagisse. Isso permitiu
retomássemos a rota de expansão”, acrescentou.
Os números globais do varejo
farmacêutico são, aliás, alvissareiros. É o que a Associação Brasileira de Rede
de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) deixa evidenciado ao acusar crescimento de
13.55% nos negócios das redes associadas no último exercício. Os “não
medicamentos” (itens de higiene, perfumaria e cosméticos) se destacaram no
balanço. As vendas globais foram da ordem de 31 bilhões e 42 milhões. As vendas
de medicamentos totalizaram 21 bilhões e oito milhões, enquanto as vendas de “não
medicamentos” 10 bilhões e 330 milhões.
As farmácias “Pague-Menos”, com
projeção de 150 milhões de investimentos em 2016, antecipam que chegarão em
2017 a mil pontos de venda no País. Só em novembro passado esse conglomerado
farmacêutico abriu 14 novos pontos de vendas e a previsão do grupo é gerar dois
mil novos empregos.
Boas falas. A vida ensina que o
trabalho persistente e a criatividade são virtudes humanas capazes de operar
prodígios. Um deles: afugentar o desalento e o pessimismo.
“Entendi,
mas não compreendi...”
Cesar Vanucci
“Tudo aquilo que
não se compreende, envenena.”
(Eugenio d’Ors, filósofo
espanhol)
Vagando pelas veredas da memória
revejo dona Jerônima, sua irradiante simpatia, tempos da escola risonha e
franca. Guardiã serena da ordem na hora do recreio, acompanhava com solicitude
maternal o vai-e-vem da gurizada. Dona de simplicidade roceira, participava com
extrema boa vontade dos atos escolares. Cumpria com zelo inexcedível as tarefas
recomendadas, encontrando dificuldade notória para assimilar informações que
extrapolassem os padrões rotineiros de seu abecedário profissional. Expunha as
limitações numa frase sugestiva: “Entendi, mas não compreendi...”
A frase de dona Jerônima, pelo que
este desajeitado escriba vem observando, ajusta-se como luva de pelica para
descrever na atualidade o aturdimento das pessoas com relação ao que anda
pintando nos convulsionados pedaços territoriais árabes que hoje galvanizam as
atenções do planeta inteiro.
“Entendi, mas não compreendi” é o que
parece estar sendo transmitido, em tudo quanto é canto, por atônitos cidadãos
desejosos de se inteirarem dos pormenores da aterrorizante contenda. Ou será
que não fica mais apropriado dizer “aterrorizantes contendas”?
Vamos ver se dá pra resumir essa
história de horror e seus desconcertantes e surreais detalhes. Falemos dos
protagonistas do enredo. Existe uma coalizão internacional, liderada pelos
Estados Unidos. Conta com apoio de alguns países ocidentais e árabes. Seus
objetivos são a derrubada do ditador Bashar al-Assad e a destruição do
“Califado do terror”. França, Inglaterra, Canadá, Austrália, Catar, Jordânia,
Arábia Saudita e Turquia fazem parte desse agrupamento, que conta, também,
aparentemente, com o apoio de grupos rebeldes sírios. Tais grupos, amparados
pelos Estados Unidos e Emirados do Golfo, são vistos por observadores
qualificados com enorme desconfiança. Há suspeitas de que desenvolvam uma
espécie de “jogo duplo” com relação ao “Califado”.
Forças curdas são apontadas como aliadas
da coalizão. Constituem a “infantaria” nos combates aos radicais islâmicos. Mas
– atentem aí –, não concordam com a queda de Bashar al-Assad. Presentes nos
campos de batalha, milícias iranianas agem nos moldes dos curdos. Opõem-se ao “Califado”, mas ajudam o
governante sírio. Os curdos deixam também claro o interesse de constituírem,
com anexação de partes dos territórios iraquiano e turco, seu próprio Estado. A
Turquia, integrante da coalizão, confronta Assad, contrapõe-se ao Estado
Islâmico, mas promove também ataques militares às posições curdas. A dita
coalizão atua, predominantemente, na base de ataques aéreos e no fornecimento
de armas e suprimentos para os curdos e “grupos rebeldes” que divergem de
Assad.
A seu turno, o regime sírio combate o
Califado desde o surgimento do movimento ultrarradical islâmico. Recebe ajuda
da Rússia e do Irã. Os propósitos de Assad são a destruição do EI e,
obviamente, conservar o poder. Tem como aliado o governo do Iraque, que é
também aliado dos Estados Unidos...
O Califado quer a saída de Assad. Recebe
farta ajuda para derrubá-lo. Passou a ser, de algum tempo a esta parte, alvo
prioritário nas ações bélicas da coalizão liderada pelos EUA. Outro inimigo do
governante sírio também combatido pela coalizão, nada obstante receba ajuda
militar do Ocidente, é a “Al Qaeda”, que não esconde suas inflamadas
divergências com o Califado.
A Rússia colocou forças aérea e naval
no enfrentamento ao EI, assegurando ao mesmo tempo proteção ao governo sírio. Firmou
com a França, depois dos atentados terroristas no Sinai e em Paris, pacto para
ações integradas contra os extremistas islâmicos.
Enquanto tudo isso acontece, parte
das tropas iraquianas treinadas pelos Estados Unidos resolve aderir ao
“inimigo” (o EI). O Hezbollah, grupo xiita
acantonado no Líbano, marca presença militar nos campos de batalha, hostilizando
o ISIS e ajudando Damasco. Não se perca de vista que tal grupo figura no rol
das organizações radicais combatidas por Washington.
No meio dessa baita confusão, a
Arábia Saudita, desafeta ostensiva do Irã, utiliza aviões para atacar posições
dos “adversários”, ou seja, por um lado, o “Califado” e, por outro lado, o governo
sírio. Os Emirados Árabes seguem a estratégia saudita. São apontados por
muitos, tal qual acontece com a Arábia Saudita, como incentivadores ideológicos
e financeiros do EI. Segundo o Kremlin, a Turquia procede de forma parecida.
Mantém negócios escusos com o “Califado” na comercialização de petróleo.
Não sei dizer, em reta e lisa
verdade, se a explicação acima ajuda alguém a decifrar esse charabiá armado lá no
Oriente Médio. De minha parte, dando uma de dona Jerônima, confesso
singelamente que procuro entender, mas não consigo jeito maneira compreender...
Umas e outras
Cesar Vanucci
“Não se pode levar muito a sério a disposição da Arábia Saudita
em articular uma coalizão para combater os terroristas do Califado.”
(Antônio Luiz da Costa, professor)
· Vi na tevê. Um
grupo de pessoas ligadas à cúpula política e empresarial chinesa, diante de uma
profusão de câmeras, holofotes, microfones, pediu humildemente perdão aos
compatriotas pela tragédia - motivada por falha humana, não por causas naturais
– que resultou no desabamento de vários prédios construídos em área imprópria,
numa província do país. Será que, mostradas uma, duas ou mais vezes aos
dirigentes da Samarco e dos órgãos governamentais responsáveis pela catástrofe
ambiental de Mariana, essas imagens conseguiriam comovê-los a ponto de se
disporem a repetir o mesmo gesto de arrependimento?
· Está dando pra
perceber, com extrema facilidade, que a opinião pública não vem digerindo muito
bem as explicações dadas pelas autoridades de saúde sobre os fatores
determinantes do surto de microcefalia que assola determinadas regiões. Pra
muita gente, bem analisadas todas as circunstâncias dessa história, pode ser
que o “aedes aegypti” seja o transmissor do vírus, mas também pode ser que não
seja. Afigura-se indispensável, a esta altura dos acontecimentos, uma
investigação mais aprofundada do que vem na realidade ocorrendo.
· A Arábia
Saudita anunciou uma coalizão de forças militares de 36 países islâmicos para
combater o sinistro “Califado do Terror”. Alguns observadores das tricas
internacionais acolhem com olhares de esguelha esse anúncio. Temem tratar-se de
mais uma manobra “só pra inglês ver”... Melhor dizendo, pra americano, francês,
alemão, russo, inglês verem... Quando se investiga a fundo as ligações de
bastidores dos coléricos jihadistas acantonados em áreas do Iraque e da Síria
chega-se rápido à conclusão de que eles encontrariam tremendas dificuldades de
sobrevivência não fossem as ajudas clandestinas substanciosas destinadas ao
financiamento das ações terroristas desencadeadas. Esse apoio, ao que tudo
indica, provém de setores do mundo árabe aparentemente comprometidos em enfrenta-los.
Tais setores estariam localizados em alguns dos países que integram a tal coalizão
articulada pelos sauditas. Eles próprios, sauditas, são apontados, com
destaque, na lista dos colaboracionistas suspeitos.
· O talebanismo
tupiniquim não esmorece no propósito de semear o ódio e a intolerância.
Indoutrodia alvejou, com impertinências verbais, o íntegro ministro Patrus
Ananias. Depois, resolveu importunar o compositor Chico Buarque de Holanda,
figura de irrecusável expressão cultural. Em sua vertente racista e machista,
inundou as redes sociais com dizeres pejorativos a quatro talentosas e lindas
mulheres negras, as atrizes Tais Araújo, Sheron Menezzes, Cris Vianna e a
apresentadora dos boletins de previsão do tempo da Globo, Maria Julia Coutinho
(Maju). Aos cidadãos que acreditam nos valores humanísticos e democráticos que
conferem dignidade à aventura da vida incumbe o dever de rechaçar com vigor essa
destrambelhada ofensiva fundamentalista.
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