segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Fatos alentadores em meio à crise

Cesar Vanucci

“O trabalho persistente vence tudo.”
(Virgilio)


Tens razão. A situação anda mesmo braba. Abracadabrante, diria o “primo rico”, do inesquecível Paulo Gracindo. “Indomável que nem potranca no cio”, como por certo registraria também o saudoso coronel Ranulfo, lá das bandas do Triângulo, nos bons tempos de fastígio político, em seu proseado de tinturas sertanejas.

A paisagem dos negócios não exibe, pra desconforto geral, a floração exuberante que nos acostumamos a ver em épocas afortunadas. Mas no fundo, bem no fundo da alma popular, ainda não se esvaiu de todo a inquieta esperança por dias mais bonançosos. Cada brasileiro carrega esse impulso heroico, sabedor das incomparáveis potencialidades deste País. Confiante na capacidade empreendedora da valorosa gente brasileira, sente-se à vontade em apostar as fichas na perspectiva de que iremos conseguir, nalgum instante, sobrepujar as adversidades. A marcha em direção ao futuro não pode ser interrompida.

A comparação do Brasil com o mar, já empregada noutras ocasiões, conserva atualidade. Na contemplação do mar não se pode falar apenas de enjoo. O enjoo se aplica unicamente a travessia de duração limitada.

Mesmo com essa profusão de indicadores negativos no plano econômico, derivados em grande parte de políticas governamentais reconhecidamente equivocadas, dá pra identificar em numerosos setores registros encorajadores de ações positivas. São exemplos de construção humana dados por cidadãos empenhados em suplantar percalços com vistas à expansão dos negócios. São acionados pela benfazeja ambição de conquistar novos patamares de desenvolvimento.

Atento à leitura de notícias estampadas, dia desses, numa única edição de jornal, este desajeitado escriba conseguiu coletar, de uma só tacada, facilmente, significativa amostra da saudável disposição que move muita gente, com o espírito de cidadania aflorado, em antepor iniciativas produtivas à crise que nos ronda.

Fatos, vamos aos fatos. A “Ansia Motors”, montadora de veículos sino-árabe, acaba de bater o martelo em torno da implantação em Minas Gerais, município de Sete Lagoas, de unidade destinada a produzir, já no primeiro ano, 25 mil carros. O investimento de 2 bilhões prevê a criação de 2.500 empregos diretos. Além de modelos convencionais, a fábrica produzirá carros elétricos e híbridos. Investirá, adiante, em motores, tratores e eletroeletrônicos. Está prevista também a exportação dos produtos para países da América Latina e Estados Unidos. O diretor da empresa, Moeth Ahmed, declara peremptoriamente não temer a situação econômica vivida pelo Brasil. “Entendo todos os desafios por que passa o País e tenho conhecimento de todos os índices importantes, como PIB, inflação e desemprego, mas entendo que o Brasil dispõe de mercado muito poderoso, na medida em que 30% dos 230 milhões de habitantes têm carro”, assinala.

Enquanto isso, a “RPC Group” confirma investimentos de 250 milhões na instalação de uma fábrica de embalagens em Montes Claros. A linha de produção contemplará as áreas de alimentos, cosméticos e medicamentos. O “Café Três Corações” informa, por sua vez, que estará implantando, também em Montes Claros, já agora no primeiro trimestre de 2016, uma unidade produtora de cápsulas.

De Uberaba chegam informações de que duas empresas firmaram compromisso para instalação de unidades no Parque Tecnológico do município. São elas a Araunch e a Nelltec. A “Oi” revelou haver fechado financiamento de 1 bilhão e 200 milhões de dólares, mais de 4 bilhões de reais, com o “China Development Bank”. Dinheiro a ser aplicado em modernização tecnológica.

Acusando crescimento de 15% no faturamento, que alcançou 1 bilhão e 600 milhões de reais, a “Drogarias Araujo” vai aplicar 100 milhões em um novo centro de distribuição em Contagem. O dirigente da rede, Modesto Araujo Neto, acentua que a expectativa da cadeia é passar das atuais 150 lojas para 450, em 5 anos. Lembra que o ano de 2015 começou desafiador, já que as vendas caíram nos primeiros meses. “Mas o impacto negativo acabou virando uma alavanca para que a rede reagisse. Isso permitiu retomássemos a rota de expansão”, acrescentou.

Os números globais do varejo farmacêutico são, aliás, alvissareiros. É o que a Associação Brasileira de Rede de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) deixa evidenciado ao acusar crescimento de 13.55% nos negócios das redes associadas no último exercício. Os “não medicamentos” (itens de higiene, perfumaria e cosméticos) se destacaram no balanço. As vendas globais foram da ordem de 31 bilhões e 42 milhões. As vendas de medicamentos totalizaram 21 bilhões e oito milhões, enquanto as vendas de “não medicamentos” 10 bilhões e 330 milhões.

As farmácias “Pague-Menos”, com projeção de 150 milhões de investimentos em 2016, antecipam que chegarão em 2017 a mil pontos de venda no País. Só em novembro passado esse conglomerado farmacêutico abriu 14 novos pontos de vendas e a previsão do grupo é gerar dois mil novos empregos.

Boas falas. A vida ensina que o trabalho persistente e a criatividade são virtudes humanas capazes de operar prodígios. Um deles: afugentar o desalento e o pessimismo.


“Entendi, mas não compreendi...”

Cesar Vanucci

“Tudo aquilo que não se compreende, envenena.”
(Eugenio d’Ors, filósofo espanhol)

Vagando pelas veredas da memória revejo dona Jerônima, sua irradiante simpatia, tempos da escola risonha e franca. Guardiã serena da ordem na hora do recreio, acompanhava com solicitude maternal o vai-e-vem da gurizada. Dona de simplicidade roceira, participava com extrema boa vontade dos atos escolares. Cumpria com zelo inexcedível as tarefas recomendadas, encontrando dificuldade notória para assimilar informações que extrapolassem os padrões rotineiros de seu abecedário profissional. Expunha as limitações numa frase sugestiva: “Entendi, mas não compreendi...”

A frase de dona Jerônima, pelo que este desajeitado escriba vem observando, ajusta-se como luva de pelica para descrever na atualidade o aturdimento das pessoas com relação ao que anda pintando nos convulsionados pedaços territoriais árabes que hoje galvanizam as atenções do planeta inteiro.

“Entendi, mas não compreendi” é o que parece estar sendo transmitido, em tudo quanto é canto, por atônitos cidadãos desejosos de se inteirarem dos pormenores da aterrorizante contenda. Ou será que não fica mais apropriado dizer “aterrorizantes contendas”?

Vamos ver se dá pra resumir essa história de horror e seus desconcertantes e surreais detalhes. Falemos dos protagonistas do enredo. Existe uma coalizão internacional, liderada pelos Estados Unidos. Conta com apoio de alguns países ocidentais e árabes. Seus objetivos são a derrubada do ditador Bashar al-Assad e a destruição do “Califado do terror”. França, Inglaterra, Canadá, Austrália, Catar, Jordânia, Arábia Saudita e Turquia fazem parte desse agrupamento, que conta, também, aparentemente, com o apoio de grupos rebeldes sírios. Tais grupos, amparados pelos Estados Unidos e Emirados do Golfo, são vistos por observadores qualificados com enorme desconfiança. Há suspeitas de que desenvolvam uma espécie de “jogo duplo” com relação ao “Califado”.

Forças curdas são apontadas como aliadas da coalizão. Constituem a “infantaria” nos combates aos radicais islâmicos. Mas – atentem aí –, não concordam com a queda de Bashar al-Assad. Presentes nos campos de batalha, milícias iranianas agem nos moldes dos curdos.  Opõem-se ao “Califado”, mas ajudam o governante sírio. Os curdos deixam também claro o interesse de constituírem, com anexação de partes dos territórios iraquiano e turco, seu próprio Estado. A Turquia, integrante da coalizão, confronta Assad, contrapõe-se ao Estado Islâmico, mas promove também ataques militares às posições curdas. A dita coalizão atua, predominantemente, na base de ataques aéreos e no fornecimento de armas e suprimentos para os curdos e “grupos rebeldes” que divergem de Assad.

A seu turno, o regime sírio combate o Califado desde o surgimento do movimento ultrarradical islâmico. Recebe ajuda da Rússia e do Irã. Os propósitos de Assad são a destruição do EI e, obviamente, conservar o poder. Tem como aliado o governo do Iraque, que é também aliado dos Estados Unidos...

O Califado quer a saída de Assad. Recebe farta ajuda para derrubá-lo. Passou a ser, de algum tempo a esta parte, alvo prioritário nas ações bélicas da coalizão liderada pelos EUA. Outro inimigo do governante sírio também combatido pela coalizão, nada obstante receba ajuda militar do Ocidente, é a “Al Qaeda”, que não esconde suas inflamadas divergências com o Califado.

A Rússia colocou forças aérea e naval no enfrentamento ao EI, assegurando ao mesmo tempo proteção ao governo sírio. Firmou com a França, depois dos atentados terroristas no Sinai e em Paris, pacto para ações integradas contra os extremistas islâmicos.

Enquanto tudo isso acontece, parte das tropas iraquianas treinadas pelos Estados Unidos resolve aderir ao “inimigo” (o EI). O Hezbollah, grupo xiita acantonado no Líbano, marca presença militar nos campos de batalha, hostilizando o ISIS e ajudando Damasco. Não se perca de vista que tal grupo figura no rol das organizações radicais combatidas por Washington.

No meio dessa baita confusão, a Arábia Saudita, desafeta ostensiva do Irã, utiliza aviões para atacar posições dos “adversários”, ou seja, por um lado, o “Califado” e, por outro lado, o governo sírio. Os Emirados Árabes seguem a estratégia saudita. São apontados por muitos, tal qual acontece com a Arábia Saudita, como incentivadores ideológicos e financeiros do EI. Segundo o Kremlin, a Turquia procede de forma parecida. Mantém negócios escusos com o “Califado” na comercialização de petróleo.

Não sei dizer, em reta e lisa verdade, se a explicação acima ajuda alguém a decifrar esse charabiá armado lá no Oriente Médio. De minha parte, dando uma de dona Jerônima, confesso singelamente que procuro entender, mas não consigo jeito maneira compreender...


Umas e outras

Cesar Vanucci

“Não se pode levar muito a sério a disposição da Arábia Saudita
em articular uma coalizão para combater os terroristas do Califado.”
(Antônio Luiz da Costa, professor)

· Vi na tevê. Um grupo de pessoas ligadas à cúpula política e empresarial chinesa, diante de uma profusão de câmeras, holofotes, microfones, pediu humildemente perdão aos compatriotas pela tragédia - motivada por falha humana, não por causas naturais – que resultou no desabamento de vários prédios construídos em área imprópria, numa província do país. Será que, mostradas uma, duas ou mais vezes aos dirigentes da Samarco e dos órgãos governamentais responsáveis pela catástrofe ambiental de Mariana, essas imagens conseguiriam comovê-los a ponto de se disporem a repetir o mesmo gesto de arrependimento?

· Está dando pra perceber, com extrema facilidade, que a opinião pública não vem digerindo muito bem as explicações dadas pelas autoridades de saúde sobre os fatores determinantes do surto de microcefalia que assola determinadas regiões. Pra muita gente, bem analisadas todas as circunstâncias dessa história, pode ser que o “aedes aegypti” seja o transmissor do vírus, mas também pode ser que não seja. Afigura-se indispensável, a esta altura dos acontecimentos, uma investigação mais aprofundada do que vem na realidade ocorrendo.

· A Arábia Saudita anunciou uma coalizão de forças militares de 36 países islâmicos para combater o sinistro “Califado do Terror”. Alguns observadores das tricas internacionais acolhem com olhares de esguelha esse anúncio. Temem tratar-se de mais uma manobra “só pra inglês ver”... Melhor dizendo, pra americano, francês, alemão, russo, inglês verem... Quando se investiga a fundo as ligações de bastidores dos coléricos jihadistas acantonados em áreas do Iraque e da Síria chega-se rápido à conclusão de que eles encontrariam tremendas dificuldades de sobrevivência não fossem as ajudas clandestinas substanciosas destinadas ao financiamento das ações terroristas desencadeadas. Esse apoio, ao que tudo indica, provém de setores do mundo árabe aparentemente comprometidos em enfrenta-los. Tais setores estariam localizados em alguns dos países que integram a tal coalizão articulada pelos sauditas. Eles próprios, sauditas, são apontados, com destaque, na lista dos colaboracionistas suspeitos.

· O talebanismo tupiniquim não esmorece no propósito de semear o ódio e a intolerância. Indoutrodia alvejou, com impertinências verbais, o íntegro ministro Patrus Ananias. Depois, resolveu importunar o compositor Chico Buarque de Holanda, figura de irrecusável expressão cultural. Em sua vertente racista e machista, inundou as redes sociais com dizeres pejorativos a quatro talentosas e lindas mulheres negras, as atrizes Tais Araújo, Sheron Menezzes, Cris Vianna e a apresentadora dos boletins de previsão do tempo da Globo, Maria Julia Coutinho (Maju). Aos cidadãos que acreditam nos valores humanísticos e democráticos que conferem dignidade à aventura da vida incumbe o dever de rechaçar com vigor essa destrambelhada ofensiva fundamentalista.



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