Chorando de barriga cheia
Cesar Vanucci
“Se
colocarmos 2 milhões, 569 mil veículos um atrás do outro o tamanho da fila dará
para cobrir o percurso entre os limites extremos, no sentido norte-sul,
Oiapoque ao Chui, do continente brasileiro.”
(Antônio Luiz da Costa, professor)
Acontece, por vezes, de os números e as
estatísticas embaralharem o entendimento no trepidante mundo dos negócios. Isso
dá causa a temerárias conclusões, interpretações que pecam por não exprimir com
justeza a realidade.
As avaliações ouvidas acerca do desempenho do
setor automobilístico no momento documentam a pertinência da observação. A
impressão que se procura passar ao respeitável público, da parte de uns com
matreirice, é que neste nosso Brasil – país, sem dúvida, um tanto quanto fora
de ritmo na atualidade -, o importante segmento vê-se às voltas com devastadora
intempérie, alvejado em cheio pela turbulência econômica. Mas, bem medidos, os
fatos não sustentam pessimismo. Os índices estampam, verdade, declínio de
produção. Nem por isso, entretanto, a atividade deixa de ostentar senhora
vitalidade. O Brasil posiciona-se em honroso sétimo lugar no ranking global da
fabricação. É superado apenas pela China, Estados Unidos, Japão, Alemanha,
Índia, Inglaterra. Estivemos, em tempos recentes, na frente dos três últimos
países. Já a Rússia, França, Itália. Espanha, Canadá, Coreia do Sul, Austrália,
Turquia, México, Argentina aparecem na relação com volumes de unidades inferiores.
Apesar dos pesares a quantidade de carros comercializados
em 2015 mostrou-se elevada: 2.569.000. Comparativamente com 2014, a variação pra baixo foi de 25%. Os
emplacamentos a partir de 2006, excluídas as motos, proporcionam visão assaz positiva
sobre comportamento mercadológico. Em 2006, foram 1.927.318 carros. Em 2007,
2.462.410; ano depois, 2.819.909. A expansão levou em 2012 a recorde histórico:
3.801.180 veículos. De lá pra cá, ligeiras quedas. Em 2013, o emplacamento
apontou 3.767.188 veículos. Já em 2014 a soma apurada foi de 3.497.805.
Os dados dizem respeito a carros novos. O
avantajado esquema de vendas de seminovos, usados de modo geral, movimentou
nesses anos todos, 2015 incluído, um mundão de dinheiro. A elevação percentual
relativa a esse tópico tem sido sempre significativa. De outra parte, as
exportações, tanto de veículos leves quanto de caminhões e ônibus, acusaram ano
findo robusto incremento: 19%.
À vista de tudo isso, qualquer sinal de desalento
em torno da performance do setor, desprezando-se elementos analíticos tão preciosos,
carece totalmente de fundamento. Anos a
fio, o Brasil tem representado para as montadoras verdadeiro “eldorado”. Parece
até, em termos de rentabilidade, que suas sedes centrais acham-se aqui
localizadas. Não há como olvidar também que as fábricas, desde os inolvidáveis
tempos de JK, foram instaladas graças a abundantes benefícios governamentais.
Falar verdade, apoio exagerado. Deu origem, nalguns casos, a abusos. O
crescimento, na produção e comercialização, no curso dos tempos, não encontra
paralelo em canto algum. Não se pode ainda desconsiderar a circunstância de que
os valores praticados na comercialização interna foram e continuam sendo infinitamente
superiores aos padrões universais. Vêm daí os balanços invejáveis das empresas.
E não se venha com a manjada cantiga de que os preços elevados decorrem de
taxação fiscal pesada. Estamos todos carecas de saber que isso não passa de
papo furado. O carro custa mais caro, nestas bandas do sul do Equador, pela
simples razão de que a cadeia de negócios do segmento acostumou-se a auferir
bem maiores ganhos aqui do que noutras paragens.
Mais coisas podem ser ditas. De anos pra cá, a
movimentação de veículos nas ruas está associada às imagens das frenéticas
coreografias de cardumes em época de desova nas águas de nossos caudalosos
rios. Noves fora, obviamente, para o rio Doce por lamacentos motivos. Pergunta
inevitável: Onde, então, responda quem se animar, enfiar mais carro nessas ruas
apinhadas, de fluxo complicado e estressante, com espaços insuficientes para
parar, com vagas de estacionamento custando o olho da cara por força da despudorada
ganância dos que exploram tão despoliciado ramo de serviço? Outra indagação:
Será que com tanto veículo rodando, não chega fatalmente uma hora em que a
cadência de vendas tende a diminuir? E, por derradeiro, se o negócio não é mais
sedutor, por que cargas d’água, então, mal pergunte, a indústria continua
acenando com a implantação de mais fábricas a curto prazo?
Chororô de barriga cheia não cola. Lamúria de
mentira atrai ziquizira. Dá incontinência urinária e intestinal e depressão.
Tudo amontoado.
Os investimentos estrangeiros
Cesar Vanucci
“O fluxo de
investimentos globais não retornou aos índices de 2007.”
(Luiz Afonso Lima, analista econômico)
Em que pesem os solavancos do acidentado percurso
econômico, com seus indesejáveis desdobramentos no campo social, o Brasil ainda
não perdeu, em termos relativos, a condição de mercado atraente para
investimentos. Esta a leitura correta a ser feita, malgrado o colosso de
informações negativas circulantes sobre a conjuntura econômica, em função de
dados liberados recentemente pela UNCTAD (Conferência
das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento).
Na acumulação de 12 meses, os
investimentos diretos aportados no Brasil atingiram, em dólares, no ano de
2014, a soma de 62 bilhões e 500 milhões. Comparativamente com os números de
2013, houve na verdade uma ligeira queda (2.35 por cento). O valor alcançado
foi de 64 bilhões de dólares. Entretanto, ao proceder-se a uma análise
meticulosa do fluxo de investimentos estrangeiros no mundo segundo o destino do
capital, chega-se à constatação de que o retrocesso nas aplicações teve caráter
global. Todos os países com potencial para aplicações se viram afetados. A
marcha à ré não foi apenas nos domínios brasileiros. Foi geral.
Alinhamos na sequência os
indicadores demonstrativos da situação real enfrentada pela economia. No mundo
inteiro o volume de investimentos estrangeiros totalizou, em 2013, 1 trilhão,
467 bilhões e 200 milhões de dólares. Em 2014, a redução chegou a quase 17 por
cento: 1 trilhão 228 bilhões e 300 milhões de dólares.
Fixando o olhar nas frações
canalizadas para os chamados países desenvolvidos, a relação entre os dois
períodos foi essa aqui: 696 bilhões e 900 milhões de dólares em 2013; 498
bilhões e 800 milhões de dólares em 2014. Redução, por conseguinte, de 28,43
por cento. Utilizando o mesmo modelo de avaliação no tocante à América Latina e
Caribe, detectamos investimentos da
ordem de 186 bilhões e 200 milhões de dólares em 2013 e de 159 bilhões 400
milhões de dólares em 2014, queda de 14.37 por cento. Desses totais, como já
explicado, 64 bilhões foram carreados para o Brasil em 2013 e 62 bilhões e 500
milhões em 2014. Ressalte-se que, no nosso caso, o índice de redução foi bem
menor do que nos demais cenários analisados.
Pelos elementos divulgados pela
UNCTAD revela-se que apenas no item “países em desenvolvimento” ocorreu ligeira
elevação (1.58%) de investimento estrangeiro segundo o destino. As aplicações
no caso foram de 670 bilhões e 800 milhões em 2013 e 681 bilhões e 400 milhões
no ano seguinte.
Uma outra indicação de que o
Brasil conservou a condição de mercado sedutor para investimentos estrangeiros está
representada na circunstância de o País haver galgado em 2014, segundo também a
UNCTAD, o sexto lugar no ranking dos países mais procurados para investimentos,
posição superior à do ano precedente.
Há um outro aspecto interessante
a ser considerado nessa modalidade de análise. O Banco Central do Brasil adota,
ao que parece, uma metodologia diferente da UNCTAD no que diz respeito à
captação de investimentos estrangeiros. É o que se pode deduzir de um quadro
estatístico por ele divulgado, no qual se comprova que a situação, como se
imagina, já foi melhor, mas onde os números mostrados, relativos a 2014,
diferem dos números apresentados pela agência da ONU. De acordo com esse
quadro, em dezembro de 2014 os investimentos diretos no Brasil em bilhões de
dólares, na acumulação de 12 meses, alcançaram a cifra de 96 bilhões e 900
milhões, bem superior aos 69 bilhões e 200 milhões de dólares registrados em
dezembro de 2013 e, igualmente, maior do que os números anotados, agora, em
outubro de 2015: 70 bilhões e 700 milhões de dólares.
A respeito do que rola
atualmente no plano internacional, no capítulo dos investimentos, é oportuno
conhecer elucidativo comentário de Luiz Afonso Lima, presidente da Sociedade
Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica
(Sobeet), em depoimento à jornalista Juliana Elias, da “CartaCapital”: “O fluxo
de investimentos globais não retornou aos níveis de 2007, anteriores à crise.
As economias centrais ainda estão com capacidade ociosa, demanda fraca e alguns
países continuam muito endividados. É uma crise sistêmica do capitalismo. E
isso, agora, se espalha para os países emergentes.”
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