Os ponteiros do relógio
Cesar Vanucci
“A
Dinamarca resolveu, no melhor estilo nazista, confiscar bens
dos refugiados como compensação para o asilo
concedido.”
(Antônio Luiz da Costa, educador)
Para
os numerosos (e fervorosos) adeptos das teorias catastrofistas essas notícias
de pé de página vêm bem a calhar. O nível dos oceanos, em consequência do
aquecimento global, continua se elevando. Os ponteiros do chamado “Relógio do
Juízo Final” estão bastante próximos das badaladas fatídicas da meia noite.
Trocando
em miúdos esse papo meio chegado ao agourento. Pesquisadores europeus sustentam
haver equívoco nas estimativas científicas a respeito dos efeitos do aumento da
temperatura sobre os mares deste nosso planeta constituído de três quartos de
volume líquido. O índice de crescimento já é duas vezes maior do que os
cálculos divulgados. Em função desse – chamemos assim – erro de cálculo, a
subida das águas, projetada em dados colhidos por satélites, não é tão somente
de 0,7mm a 1mm por ano, como propagado, mas de 1,4mm por ano. Essa revisão
numeral prenuncia a incidência daqui pra frente de tempestades cada vez mais
devastadoras, modificações atmosféricas com grau de periculosidade sempre
crescente.
Já
no que diz respeito aos “presságios” do famoso “Boletim dos Cientistas
Atômicos”, BPA na sigla em inglês (“The Bulletin of the Atomic Scientists”), a
má notícia reservada aos vulneráveis cidadãos terráqueos é de que restam apenas
3 minutos para os ponteiros do “Relógio do Juízo Final” cruzarem na casa dos
12, fazendo soar as trombetas apocalípticas. Há dois anos a marca horária não é mexida nem pra frente nem pra
trás. Fica no mesmo lugar. Os indicadores constituem o patamar mais próximo do
“momento fatal” a que se chegou nas atemorizantes previsões dos cientistas
desde 1984, época das tensões produzidas na fervente “guerra fria”. Criado em
1945 por cientistas estadunidenses, o “Relógio” é alterado de horário à medida
que a insanidade humana demonstra desejos de expansão. Quanto mais perto da
“meia noite” maior se faz o risco da eclosão de uma hecatombe capaz de
extinguir a vida humana neste dadivoso planeta azul dilacerado por desatinos
sem conta.
Numerosos
fatores concorrem para que os ponteiros do “Relógio” estejam onde estão.
Anotemos alguns deles. Os ameaçadores arsenais nucleares e bacteriológicos
mantidos por um punhado de países que se dizem “fiadores da paz”. A saber,
Estados Unidos, Rússia, China, França, Inglaterra, Índia, Paquistão, Israel,
Coreia do Norte e, quem sabe lá, outros mais deste mundo tão pródigo em
artimanhas geopolíticas. Basta apertar meia dúzia de botões para tudo ser
reduzido a estilhaços. Os virulentos atentados à Natureza também figuram no rol
dos indesejáveis fatores. Tal qual, aliás, os conflitos bélicos sem perspectiva
de solução e os flagelos a que se acham expostas multidões socialmente
excluídas. A movimentação dos ponteiros do relógio está sujeita ainda à
barbárie belicosa terrorista e ao desapiedado terrorismo proveniente da
intolerância, da injustiça e da indiferença, configurado em não poucas posturas
emblemáticas. Dá pra citá-las: discriminações de cunho racista expressas em
atos como esse do inimaginável confisco de bens (?), à moda hitlerista, dos
infelizes refugiados, adotado (ora, veja, pois!) pela Dinamarca como
“compensação” pelo “asilo concedido”; propostas republicanas de proibição do
culto e do ingresso de cidadãos muçulmanos nos Estados Unidos e de construção
de “muro fortificado” na fronteira com o México.
Eta
mundo velho de guerra sem porteira!
Coisas desse
mundo de Deus
Cesar Vanucci
“Soa estranho que as manchetes sobre
tragédias com perdas humanas, ocorridas em partes diferentes do
planeta, ganhem intensidade maior ou menor conforme o peso político,
econômico e social do país.”
(Domingos
Justino Pinto, educador)
Essas imperscrutáveis sendas
percorridas nos domínios geopolíticos! O papo com o Irã dos raivosos aiatolás
agora é outro. Mudou da noite pro dia. Com a retirada das sanções, que se
estenderam por décadas, a diferença de tratamento oscilou de 8 pra 80. O
presidente iraniano Hassan Rohani, de perfil moderado e aparência simpática,
sobretudo se confrontado com o antecessor Mahmoud Ahmadinejad, famoso pela
catadura inamistosa, acaba de ser recepcionado com todos os salamaleques
diplomáticos, com direito a tapete vermelho e dobrados retumbantes,
impecavelmente executados por guardas militares em roupagens de gala.
Mirando o potencial de promissores
negócios existente no país do Golfo, detentor de respeitáveis jazidas petrolíferas
e com voraz apetite por modernização tecnológica, os governos europeus abriram
suas portas de par em par para acolher a primeira delegação oficial persa a
pisar, depois de longo tempo, o solo do “Velho Mundo”. Em meio a mesuras requintadas nasceram
operações comerciais de monta. E na troca de gentilezas entre os amigos
recentes pipocaram impensáveis concessões. Na Itália, nús greco-romanos dos
chamados museus capitalinos foram pudicamente cobertos, às pressas e
temporariamente, pra não ferir melindres. A hipótese de se suprimir vinho no
banquete, de mode também a não ocasionar suscetibilidades, chegou a ser
cogitada. Mas o que acabou prevalecendo mesmo, no final das contas, foi a
supressão do próprio banquete oficial que o governo francês ofereceria nos “Champs
Elisees” aos puritanos delegados iranianos. O acordo nuclear celebrado, que
teve seu começo –interessante lembrar - em negociações conduzidas pela
diplomacia brasileira com contribuição turca, estabeleceu a ensancha oportunosa
para que se pudesse operar essa benfazeja metamorfose no relacionamento da
comunidade europeia com os atuais dirigentes persas. E já que se falou acima em
boas perspectivas de negócios, cabe encaixar aqui uma perguntinha ao nosso
Itamaraty: será que não vai sobrar alguma chance para uma ofensiva comercial
brasileira de jeito nesse mercado persa tão sedutor, disputado agora por países
que, ao contrário do Brasil, se mostraram até tempos bem próximos refratários a
aproximações com Teerã?
Enquanto
isso, na Nigéria e Paquistão...
Na maltratada Nigéria e no enigmático e
conturbado Paquistão, refúgio derradeiro do chefão terrorista Bin Laden, as
sinistras falanges fundamentalistas islâmicas produziram, de novo, dias atrás, espantosas
tragédias. Os atentados tiveram custos em vidas humanas equiparáveis aos dos
fatídicos acontecimentos registrados no território francês no final do ano que
passou. Mas o relato jornalístico internacional dedicado aos apavorantes
episódios foi muitíssimo diferente. Em razão das manchetes e comentários
excessivamente comedidos não houve, como seria lógico admitir, aquela mesma
avassaladora comoção mundial dos momentos anteriores. Motivos de sobra – há de
se ver – não faltam a africanos e povos de outras paragens do terceiro mundo
pra se queixarem do tratamento ostensivamente diferenciado que o ocidente costuma
dispensar, em suas manifestações de preocupação com os dramas humanos, às
coisas angustiantes, doloridas que acontecem na parte de lá e na parte de cá deste
mundo do bom Deus onde o tinhoso zela pela preservação dos espaços apropriados
para suas lúgubres maquinações.
Escritos
de ontem ainda atuais
Cesar Vanucci
“Recordar é
viver.”
(Adágio popular)
Graças ao zelo da
dedicada secretária Clélia Ferreira, conservo nas estantes de minha biblioteca,
devidamente encadernados, textos produzidos ao longo de mais de meio século de
atividade jornalística. De quando em vez, passo os olhos no copioso material
publicado. Das releituras feitas costuma emergir a sensação de que os fatos
enfocados, guardando similitude com situações agora vividas, não perderam ainda
de todo sua atualidade.
Juntando aqui algumas
amostras desses registros, espero de meus poucos e benevolentes (posto que
leais) leitores uma avaliação acerca da procedência do que acabo de assinalar.
Catorze anos atrás, dois
de fevereiro de 2002, lancei no papel, sob o título “Caneta cheia”, o
comentário abaixo reproduzido.
“Caneta. O
jornalista Cláudio Humberto, que tem bom acesso aos bastidores do poder, acaba
de informar que o ex-presidente da Petrobras, Henri Reichstul, ao deixar o
cargo, presenteou o fundo de pensão da empresa, a Petros, com 5,2 bilhões de
reais. Dinheiro pra encardir, saído dos cofres de uma instituição que é
propriedade do povo brasileiro. Esperei alguns dias pra ver se alguém desmentia
ou esclarecia melhor o fato. Nada mais li, nem ouvi. Pus-me, então, a recordar
episódios parecidos onde a imprensa documentou o poder ilimitado de que
desfrutam, neste nosso país, alguns tecnocratas em posições-chave. Dispõem
eles, sempre, de caneta cheia para assinar. Vamos registrar aí, por favor, que
5,2 bilhões de reais representam quase o dobro dos recursos que o governo teme
perder na receita deste ano, em decorrência da decisão do Congresso – que exigiu
meses de discussões e negociações – atualizando a tabela de descontos do
Imposto de Renda. É superior também, em cerca de 1,2 bilhões, ao valor das
aplicações anuais previstas na proposta do senador Antônio Carlos Magalhães de
estruturação de uma campanha para erradicar a fome, conforme, aliás, lembra o
próprio Carlos Humberto.
Dever. O
governo do Estado de São Paulo está no indeclinável dever de trazer a público,
com rapidez, uma explicação cabal e convincente sobre todas as circunstâncias
que envolvem o deplorável episódio do sequestro da filha de Sílvio Santos. As
coisas estão, até aqui, à hora em que batucamos estas linhas, muito mal
ajambradas, como se costuma dizer em papo de rua. As extravagantes versões da
troca de tiros entre o sequestrador e os policiais e da morte recente,
altamente suspeitosa, do delinquente na casa de custódia precisam ser devida e
competentemente esclarecidas. A opinião pública agarra-se, à falta de
comunicado consistente, à desagradável sensação de estar sendo montada mais uma
armação, no mesmo e manjado formato da morte de PC Farias. A honorabilidade das
autoridades paulistas não pode alimentar, pela omissão, acomodação, conivência,
mórbido espírito corporativista, qualquer deslize de comunicação.”
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