Reflexões sobre a fala das ruas
Cesar
Vanucci
“Diálogo
à exaustão!”
(Aconselhamento
da CNBB)
A
mensagem das ruas foi de clareza solar. As lideranças políticas e as dos outros
setores com reconhecida influência decisória na vida nacional não podem se
furtar, jeito maneira, ao dever de assimilá-la em suas propostas essenciais.
Elas exprimem o sentimento popular.
Os
métodos de fazer política estão sendo veementemente questionados. A mesma
contestação se aplica aos privilégios oligárquicos originários de nefastos
conluios de agentes públicos inidôneos com gananciosos e inescrupulosos
empreendedores da iniciativa privada. Das cabeças pensantes mais lúcidas,
verdadeiramente comprometidas com as grandes causas, temos os brasileiros o
direito de aguardar, tomados de generosa expectativa, posicionamento capaz de
amortecer os impulsos negativos da crise. E cumulativamente constituir ambiente
favorável à efetivação das mudanças fundamentais nos processos de gestão da
coisa pública, tão reclamadas pela sociedade.
Importa,
nesta hora, reconhecer as virtualidades incomparáveis da índole brasileira.
Essas virtualidades foram postas à prova, mais uma vez. O tom vibrantemente
pacífico das passeatas, as palavras de ordem diversificadas intensamente
propagadas, o exercício amplo e irrestrito da liberdade de expressão compuseram
um cenário formidável de pujança democrática. O que se desvelou serenamente aos
olhares gerais, atrás do clamor ouvido, foi novo e retumbante brado de
esperança.
O
contexto político atual confere reluzente oportunidade à convocação feita, a
dirigentes políticos de todos os matizes, pela respeitada Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil (CNBB). Anunciando apoio às manifestações populares e
frisando que “adversários políticos não podem se tornar inimigos”, a entidade
proclamou que o Brasil anda precisado de “diálogo à exaustão”. Revelando
preocupações com a ausência de valores éticos e morais na “crise política
econômica institucional”, a CNBB assinala também ser dever do Congresso Nacional
e dos partidos políticos “fortificar a governabilidade”. O momento, diz ainda,
“não é de acirrar ânimos”. Faz-se necessário que as pessoas não percam o bom
senso, “querendo defender suas opiniões de forma tão veemente que acabam se
esquecendo do respeito aos outros e, assim, ferindo-se mutuamente”. Palavras
lúcidas e sensatas, as dos Prelados! Servem de balizamento para as atitudes dos
interessados nas soluções dos problemas que nos afligem.
Outra
contribuição oportuna para que sejam dissipadas compreensíveis ansiedades e
angústias, nascidas do desejo de que as mudanças comportamentais demandadas se
processem em ritmo mais acelerado, provém da sabedoria oriental. O ensinamento
é do guru indiano Sai Baba. Procuremos adaptá-lo à realidade brasileira. Ao nos
deparar com os resultados produzidos pelo satisfatório funcionamento de nossas
instituições democráticas no combate a malfeitos sistemáticos, poderemos ser
levados, equivocadamente, a inferir que tudo está perdido. Estaríamos
atravessando momento de asfixiante penumbra. Que tal mudar o enfoque para
admitir que, ao contrário, este momento é de luminosidade? Aqui está, para
reflexão, registro comparativo
sugestivo. A troca de uma lâmpada de 40 watts por outra de 100 watts no quarto
de despejo leva-nos a enxergar no lugar sinais de desordem e de sujeira que nem
de leve imaginaríamos existir. A luminosidade abundante, derivada de uma
mudança de patamar da consciência, tem o condão de expandir a percepção para
engodos, ilusões, por aí... Chama atenção pra coisas que não vinham sendo
lançadas nos sacos de lixo, mas empurradas pra debaixo do tapete. Estamos sendo
convocados, neste instante, a fazer arrumação no quarto de despejo. O bom senso
aconselha aprender a assimilar em plenitude esta positiva vibração energética.
Isso aí!
Notícias
ligeiras
Cesar Vanucci
“Recuso-me a acreditar nas notícias...”
(Henriqueta
Lisboa, 1901-1985)
O ranking das mentes científicas mais
influentes deste mundo de Deus, povoado por 7,5 bilhões de seres humanos,
aponta os nomes de quatro brasileiros: Ado Jório, Adriano Nunes-Nesi, Alvaro
Avezum e Paulo Artaxo. Os dois primeiros atuam em Minas. Jório é da área de
física da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Adriano faz parte do
corpo de pesquisadores da área de ciências das plantas e dos animais da
Universidade Federal de Viçosa (UFV). Avezum trabalha em medicina clínica no
Instituto de Cardiologia Dante Pazzanese e Antaxo no departamento de física da
Universidade de São Paulo (USP).
Este fato extraordinário, merecedor de
todos os aplausos e louvores, foi laconicamente registrado em notas de pé de
página, em letra bem miúda, no noticiário nosso de cada dia. Em debochado
contraste – assinale-se – com a divulgação estardalhante que, dia sim, outro
também, a mídia impressa e televisiva reserva para os conflitos existenciais e
os gloriosos feitos dos célebres ocupantes da casa do “Big Brother Brasil”...,
minha nossa!
Naná Vasconcelos. No ver dos
críticos, era o melhor percussionista do mundo. Abiscoitou por oito vezes o
“Grammy” e outros laureis internacionais. Usava da arte para promover mudanças
sociais relevantes. Um de seus projetos, o “Língua Mãe”, beneficiou crianças
carentes no Brasil e países latino-americanos, europeus e africanos. O nome
deste patrício brilhante, pernambucano, 71 anos, vítima de câncer, que acaba de
nos deixar, era Naná Vasconcelos.
O mosquito-vilão. Ninguém
provido de juízo e bom senso cometerá, com certeza, a insensatez de recusar
apoio às recomendações das autoridades sanitárias pertinentes ao combate do
incômodo mosquito apontado como transmissor dos vírus da zika, dengue,
chicungunya e de outros malefícios ainda por serem devidamente classificados.
Mas, de outra parte, não há como fugir à constatação de que no espírito popular
ganha consistência uma certa perplexidade com relação a essa súbita elevação do
grau de periculosidade atribuído a um inseto que sempre circulou solto por aí
sem causar aparentemente os transtornos que lhe são agora debitados. Fica-se
com a sensação de que, nessa engrenagem toda de divulgação montada para alertar
a população, em centenas de países, dos riscos produzidos pelo vilão do momento
em matéria de saúde pública, andam faltando peças fundamentais pra encaixar no
quebra-cabeça armado, de modo a garantir possa ser decifrado por inteiro.
O barulho. Uma grande
amiga com realçante participação na vida literária, integrante do reduzido,
posto que leal, quadro de leitores deste desajeitado escriba, encaminhou-me
texto poético de William Morris bastante apropriado para o momento: Vejam se
não é mesmo assim: “Que é isso, esse som e barulho? / Que é isso que todos
ouvem, / Como o vento em vales ocos quando a tempestade se aproxima, / Como o
rolar do oceano no anoitecer do medo? / É o povo em marcha...”
Notícias. De um poema
(“Pousada do Ser”), de Henriqueta Lisboa, selecionado por Paulo Rónai para seu
“Dicionário de Citações”: “Recuso-me acreditar nas notícias / mas elas se impõem
de cátedra / com implacável desfaçatez / talvez para convencer-nos / de que
somos todos culpados.”
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