Fatos são fatos
“Governo
acaba, crise só começa.”
(Ricardo
Corrêa, jornalista)
A
política é um jogo complexo onde as cartas são embaralhadas de forma a gerar
inimagináveis composições. E onde as hipóteses mais improváveis tornam-se de repente
factíveis. A crônica do setor é fértil em circunstâncias reveladoras de
posicionamentos políticos aparentemente sólidos que se viram submetidos a
inesperadas alterações na vigésima quinta hora.
Mas,
falar verdade, no episódio do impeachment a perspectiva claramente delineada,
neste preciso e incandescente momento, aponta na direção de uma inarredável
disposição parlamentar de encurtar irremediavelmente o mandato de Dilma
Rousseff. Tudo deixa crer que a votação do Senado, nas restantes etapas de avaliação
do processo, acompanhará fatalmente a tendência pró-afastamento manifestada na Câmara
dos Deputados. Profusa sinalização dá conta de que o Governo carece de base de
sustentação nas bancadas partidárias capaz de garantir a reversão dos fatos.
Vários
fatores de peso contribuíram para que a situação chegasse a esse caminho
supostamente sem volta nessas penosas definições assumidas na esfera legislativa.
Realce especial deve ser atribuído, na
lista dos fatores negativos, à ineficiência gerencial estridente do Executivo.
A inoperância atraiu volumosa onda de impopularidade. Impopularidade essa –
forçoso reconhecer – exacerbada pela intensidade de certas falas midiáticas
influentes, despojadas de isenção. A notória incapacidade da Chefe de Governo
para promover diálogos propositivos com as lideranças políticas e comunitárias
e ainda para compor equipes de colaboradores e assessores competentes e
confiáveis influiu, também, marcantemente, para que a crise ganhasse os
contornos conhecidos. Não merece ser olvidada, nada obstante, a argumentação de
não ter ficado devidamente configurado, até aqui pelo menos, o crime de
responsabilidade que se lhe foi atribuído. Taí argumento que poderá sobreviver
às intempéries ditadas pelas paixões.
Respeitável
entendimento jurídico, expresso nas vozes de conceituados intérpretes constitucionais,
estipula que o impeachment não é instrumento a ser empregado para destituição
de um governo diante da constatação de que contra ele se acumularam enormes
discordâncias nos variados segmentos comunitários. Os regimes presidencialista
e parlamentarista diferem fundamentalmente no tratamento dispensado aos
titulares de cargos executivos atingidos por inequívocas demonstrações de
impopularidade. O impeachment no caso atual impõe, necessariamente, em assim
sendo, a caracterização da responsabilidade. Não há como relativizar o
conceito. Na eventualidade de que isso seja subestimado, poderá ocorrer de
preceitos jurídicos fundamentais, intrínsecos ao Estado democrático, ficarem na
temerária dependência do juízo de casuísmos políticos, de conveniências de
ocasião.
Mas,
fatos são fatos. Os recentes acontecimentos prenunciam que o governo Dilma está
inexoravelmente com os dias contados. Mesmo que o deprimente espetáculo
circense encenado por numerosos deputados, nas declarações de votos que
asseguraram o encaminhamento ao Senado do processo de impeachment, tenha de
certo modo robustecido a tese da carência de configuração do crime de
responsabilidade, o que agora se projeta, diante do olhar da Nação, de forma
insofismável, é a vontade política parlamentar, agregando poderosos apoios, de
afastar Dilma do poder.
Nada
de ilusões. Enganoso supor que a crise política, com seus efeitos perversos
sobre as atividades produtivas, geradoras da riqueza social, findará aí. Os
sucessores de Dilma na linha constitucional, Michel Temer e Eduardo Cunha, por
mil e um motivos sem que se precise declinar de momento qualquer deles, não
reúnem as condições, do ponto de vista majoritário da sociedade, para colocar
em prática as medidas que o Brasil tanto almeja e que possam permitir-lhe
reencontrar, urgentemente, os caminhos do desenvolvimento social e econômico.
Programa de
tevê
Cesar Vanucci
“Contemplar a mediocridade de certos
programas de televisão é uma experiência
acabrunhante...”
(Antônio
Luiz da Costa, professor)
O apresentador: Encerrado o desfile, vamos ao julgamento. Recordo aos componentes do júri que não estará em causa, para efeito de avaliação, o traje do candidato. O que conta é apenas a estatura, a calvície e o bigode dos participantes. Qual o anão bigodudo careca mais simpático? Para aponta-lo, entre os candidatos reunidos, classificados nos testes eliminatórios, é que se encontra aqui reunida a nossa douta banca, hoje enriquecida com a presença da conhecida manequim profissional Lindalva Jabaquara. Em julgamento!
Um dos jurados: Um momento, por favor. Antes da votação, não poderia ser fornecida a relação dos prêmios destinados ao felizardo ganhador?
O apresentador: Oportuna a sugestão. Vamos atendê-lo. O anão calvo bigodudo mais simpático ganhará uma viagem a Lhassa, para visita aos monges budistas da cabeça raspada, oferta das Linhas Aéreas Conchichinenses; visita a Hollywood, para almoço na mansão que pertenceu ao saudoso Yull Brynner; integrará o elenco da novela “Manuel Joaquim, o norueguês”; ganhará uma tesoura de madrepérola, com incrustações de esmeralda trabalhada. Essa tesoura, diz a lenda, pertenceu ao Conde Calabouço, da Casa Real da Prússia. O conde a usava para aparar excessos capilares. A preciosidade pertence ao acervo particular de madame Fifi Ventura, de nossa “haute gomme”. Fará jus ainda a um guarda-roupa completo para as viagens, oferta do consagrado estilista Fred Dondoca. E, por último, receberá uma coleção da obra, em dezessete volumes, encadernação de luxo, “Choveu orquídea no meu aquário”, de Nenê Turner, nosso maior especialista em etiqueta, por sinal, presente como convidado especial ao programa de hoje.
Passemos, agora, então, ao julgamento.
O seu voto...
Primeiro jurado: Num tá fácil... O candidato número dois tem um bigode muito interessante, ligeiramente pontiagudo nas extremidades. Com jeito assim de Dom Ameche na paquera de Alice Faye, misturado com um pouco de Pedro Armendariz. Mas, por outra parte, sua careca não é lá tão exuberante assim. Quer saber duma coisa? Voto no número quatro.
Segundo jurado: Como disse o brilhante colega que me antecedeu, a escolha não é nada mole... A gente não poderia dar uma nota para a careca e outra para o bigode? Há candidatos de bigodes irrepreensíveis e de careca nem tanto. E vice-versa...
O apresentador: Não dá pra atender o que o colega pede. O candidato terá que ser julgado no conjunto. O seu voto, rápido, rápido, por favor: “Time is money”, como dizem os Hermanos argentinos...
Segundo jurado: Sendo assim, fico com o número cinco...
O apresentador: O voto seguinte, rápido...
Terceiro jurado: Poderia fazer um “close” da careca do número sete? Obrigado. Achei o bigode do moço muito bem cultivado. Aparado com perfeição. Dir-se-ia até tratar-se de um espadachim valenciano, da época renascentista. Já a careca, à distância, não me parecia – como diria? – bem delineada. Com o “close” a dúvida se desfez. Fico com o sete.
Quarto jurado: Gostaria de saber do candidato número sete se o seu bigode é herança de família, ou foi por ele mesmo ideado? Acho, sinceramente, que nenhum candidato reúne condições tão especiais para arrebatar o prêmio...
Candidato número sete: Muito obrigado, muito obrigado. Não sei como agradecer tanta demonstração de carinho... Aproveito para mandar um beijo e um abraço para meus queridos genitores e toda a patota lá de Fervedouro, minha terra natal...
O apresentador: Boniiiiiito! É assim que se fala! Palmas para o número sete, que ele merece!
Quinto jurado: E se o bigode do anão escolhido for falso? Não ri, não... Pode acontecer. Já ouvi falar de fraudes cometidas noutros concursos.
O apresentador: A produção do programa já considerou esse aspecto e afastou a possibilidade de ocorrer qualquer embuste. Mas como você insiste, faremos uma verificação no intervalo.
Nossos comerciais, por favor!
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