sexta-feira, 5 de agosto de 2016



Alucinatórias interpretações do universo


Cesar Vanucci

“O que está no céu é igual ao que está na Terra.”
(Hermes Trismegisto)

Aceito, com absoluta tranquilidade de espírito, mesmo confrontando a alegação da ciência de não haver ainda reunido evidências concretas a respeito, a intrigante ideia da pluralidade de mundos povoados de vida inteligente no infinito cósmico. Não me entra pela cabeça, definitivamente, a tese de que este nosso minúsculo planeta azul, uma gotícula d’água na inimaginável imensidão oceânica, possa ser a morada exclusiva de seres providos de razão (será que é bem assim?), emoção e criatividade. Imagino que o futuro próximo reserve aos cientistas a esplendorosa chance de colecionarem as provas que faltam para o reconhecimento dessa realidade.

A crença que nutro acerca da existência de vida fora de nosso turbulento habitat me conduz, também, de quando em vez, a reflexões em torno das reações comportamentais humanas, algumas muito estranhas, em relação ao que nos circunda no espaço próximo, ou no espaço mais longínquo.

No curso da história têm sido numerosas as demonstrações de arrogância provindas das reações dos sempre atuantes “donos da verdade”, encastelados na sede do poder em épocas diferentes, diante dos arcanos do mundo exterior. Um exemplo famoso vem daquele período marcado por pesado obscurantismo cultural em que Galileu Galilei, por “condescendente” decisão de seus julgadores, foi arrastado à “prisão domiciliar”. Segundo os conceitos científicos, com sólida escora religiosa, dominantes na época, a Terra era um ponto fixo no universo. Ao seu redor giravam disciplinadamente o sol, os planetas, as estrelas, por aí.

O genial cientista revelou, num dado momento, para escândalo geral, que as coisas não eram bem assim. Foi piedosamente intimado a desdizer-se. Caso contrário... Menos afortunado, Giordano Buno não conseguiu safar-se, jeito maneira, das labaredas sagradas. Condenaram-no à expiação dos crimes hediondos cometidos. Também pudera! O frade rebelde sustentava conceitos, os mais heréticos, acerca do funcionamento da mecânica celeste. Acreditava, por exemplo, não se envergonhando da sacrílega crença, na pluralidade de vida nos planetas.

O bem informado leitor sabe tanto ou mais do que eu que estes 2016 anos de civilização estão atulhados de ocorrências parecidas, provocadas pelo fanatismo com suas visões distorcidas e cruéis. Os doutos de hoje já não mais condenam à fogueira, pelo menos em boa parte do planeta, pessoas que discordem das teorias solidamente assentadas sobre o que ocorre, lá em cima e cá embaixo, nas vastidões do firmamento. Mas conservam intata a arrogância. Carregam inteira a certeza de que, aqui mesmo na Terra é que continuam sendo traçadas regras e exercida alguma espécie de controle sobre os destinos cósmicos.

Quando o ser humano teve acesso à tecnologia nuclear, utilizando-a, para não fugir ao padrão, com fitos obviamente bélicos, um amalucado qualquer, com assento no conselho dos “senhores da guerra”, aventou a possibilidade da realização de experiências com artefatos bélicos na lua. A incrível ideia não foi levada avante. Mas, de modo geral, foi recebida com naturalidade. Com a sensação confiante de que o nosso satélite pudesse ser mesmo utilizado como uma espécie de “quarto de despejo” para fins os mais variados. Algumas semanas atrás, por sinal, correu mundo a notícia de que a agência espacial estadunidense e algumas corporações empresariais estavam estudando a exploração futura das “prováveis jazidas minerais” do satélite.

É de registro recente ainda uma outra ruidosa manifestação, esta sem efeitos belicosos, da embriagante autossuficiência do ser humano em suas alucinatórias interpretações do universo desconhecido. Num conclave internacional, astrônomos renomados entenderam de lançar um édito, proclamando simplesmente, por “a” mais “b”, que o distante e, até aqui, inacessível Plutão deixou de ser um planeta. E “tamos” conversados.
Diante da notícia, pus-me a matutar, cá com os botões de meu pijama listrado, numa noite de céu estrelado, fixando como sendo Plutão um ponto luminoso qualquer do firmamento, como é que uma decisão dessas poderia vir a ser recebida num eventual conselho intergaláctico de sábios? Concebi assim a cena: transmitida a desnorteante informação, alguém entre os sábios provavelmente pediria da palavra para dizer, tom caridoso na voz, o seguinte: “É, esses humanos não se emendam...”


Façam seus jogos, senhores!

Cesar Vanucci

"A hipocrisia é a homenagem que 
a corrupção paga à probidade."
(La Rochefoucauld)


Nada de rodear toco. Direto ao assunto. Eu não "se" dou bem com jogo, como diria folclórico retireiro do sítio de amigo em Macacos. Querem saber outra? Sinto total desconforto no interior de um cassino, ou de qualquer outro ambiente enfumaçado e enregelante onde baralhos, cartelas, roletas, dados e fichas, com o concurso de empertigados crupiês, exerçam poder de sedução pra cima da fervorosa legião dos aficionados em apostas. E olhem que na única vez na vida em que resolvi introduzir uma moeda na greta de um caça-níqueis o aparelho descarregou, para agradável surpresa, todo o conteúdo de moedas na bolsa que carregava. Foi num cassino em Katmandu, Nepal. Recolhi a bolada e me mandei, indiferente às ponderações à volta de que não deveria arredar pé do local já que a sorte estava soprando forte a meu favor.

Vou mais longe: considero extremamente tediosa, como passatempo, uma simples e inofensiva mão de “buraco” no recesso doméstico. Fico sonolento, tanto quanto diante de corridas de fórmula 1  ou fórmula indi mostradas na televisão, se me aventuro a acompanhar a movimentação das cartas. Essa idiossincrasia, ou que outro nome se aplique ao fato deste amigo de vocês não ser ligado no chamado “jogo de azar”, não me retira, contudo, o ânimo de arriscar, vez por outra, uma fezinha na mega-sena acumulada. Bem entendido, desde que a fila na lotérica não esteja muito espichada.

Definido este posicionamento, confesso, em boa e lisa verdade, considerar inócua, desprovida de bom senso, a resistência oferecida por alguns setores ao propósito, quando em vez anunciado, alardeado novamente em dias recentes por inspiração governamental com apoio parlamentar, de regulamentar algumas modalidades de apostas. Tal resistência, mesmo quando inspirada em reta intenção (desapartada, tá na cara, da realidade), ajuda a estender ampla cortina de fumaça diante de uma realidade que a hipocrisia social e o farisaísmo teimam desconhecer. Dizer que no Brasil o “jogo é proibido”, como se assevera há decênios, é favorecer a propagação, com intuitos sibilinos, de deslavada mentira. Ou se preferirem, uma lorota boa, como diz conhecido estribilho musical.

Se o que existe, espalhado do Oiapoque ao Chuí, não merece ser pudica e oficialmente classificado como jogo, que denominação então se atribuir às incontáveis versões de jogos bancados, quase que diariamente, pelas loterias, instituições beneficentes, clubes recreativos e, ainda, na moita ou escancaradamente dependendo da hora e do lugar, por agremiações esportivas ou outras quaisquer engajadas no rendoso negócio do bingo? Com o célebre "jogo do bicho", originário dos tempos do Império, acontece algo, pra dizer o mínimo, desnorteante. O “bicho é proibido”, não é mesmo? Mundão de gente assegura tal coisa, solenemente, com a mão no Código de Contravenções e uma piscadela marota no olhar. Mas é mole, mole, mesmo para não apostadores contumazes, apontar-se sem vacilações os numerosos pontos espalhados por toda a vastidão territorial brasileira onde os palpites são religiosamente recolhidos, do primeiro ao quinto, duas ou até três vezes por dia. Esse aí é um dos inúmeros jogos operados em larga escala, apesar de “não regulamentados”, sabe-se lá por quais insondáveis (e tilintantes) razões. A situação dos cassinos é parecida. Funcionam em alguns locais de afluência turística com amplo, geral e irrestrito conhecimento comunitário. E não é que acontece o mesmo com o chamado carteado de aposta alta? É também “proibido”, mas não deixa de ser atração em clubes grã-finos. Como nas outras versões de jogo acima citadas, nenhuma receita, sob forma de taxas, entretanto, carreia... para o erário.

Dentro de um contexto psicodélico desses, quer me parecer destituída de sentido a obsessiva implicância cultivada em alguns redutos quanto à denominada “legalização do jogo”. A abertura de cassinos, a regulamentação do bingo, a regulamentação do jogo de bicho são medidas recomendáveis do ponto de vista do interesse econômico, turístico e social. No mundo inteiro, a começar por países limítrofes do Brasil, inseridos marcantemente no fluxo do turismo brasileiro que demanda outras plagas, o jogo é fonte de atração, proporcionando postos de trabalho e renda de apreciável monta. Expurgando-se dessas modalidades de apostas eventuais mazelas de origem, decorrentes da clandestinidade hoje vigente, colocados a funcionar sob a égide de órgãos públicos confiáveis, essas atividades, além da abertura de frentes de trabalho, com realce também para o setor do entretenimento artístico, absorverão para o país recursos consideráveis. Recursos a serem convertidos, como acontece por aí afora, em iniciativas de conteúdo social. Nosso país clama muito por tudo isso, por empregos e realizações de proveito social.






DISCURSO DA ACADÊMICA ELIZABETH RENNÓ, PRESIDENTE DA ACADEMIA MINEIRA DE LETRAS, EM MINHA POSSE COMO PRESIDENTE DA AMULMIG

Reproduzimos na sequência a integra do esplêndido pronunciamento da acadêmica Elizabeth Rennó, primeira mulher a presidir Academia Mineira de Letras, na solenidade de posse em que fui investido das funções de presidente da Academia Municipalista de Letras de Minas  Gerais (Amulmig), dia 19 de julho de 2016.
                                                       
“A 8 de abril de 1963, por um grupo de intelectuais, tendo à frente Alfredo Viana de Góes, foi fundada a Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais.
Alfredo de Góes, o fundador, foi o marco primeiro de um conjunto literário, amplidão que se compõe de representantes de municípios mineiros, brasileiros e do exterior.
A alma, a inteligência criativa e o valor de Alfredo Marques Viana de Góes, expressos em sua obra, sob o pseudônimo de H. Buyutrago de la Contria, caracterizam a sensibilidade do autor.
Alfredo foi exemplo de participação, na literatura, no trabalho, pelo entusiasmo que nunca o abandonou e o incentivou a diplomar-se em Direito, já entrado em anos.
É este o objetivo da nossa Municipalista herdado de seu fundador, seguir os caminhos da Literatura, do Humanismo, da Cordialidade, como templo de luz e de trabalho.
Outros intelectuais perseguiram a exploração da palavra nos textos e nos poemas construindo o corpo acadêmico.
A Comunidade da Amulmig destaca-se pela integração de seus membros, o que torna as Sessões Literárias um encontro cordial e amigo.   
A sede atual foi conseguida pelo esforço e persistência do ex- Presidente Jésus Trindade Barreto e da Professora e Deputada Marta Nair Monteiro, junto ao Governo Municipal.
O que era, a princípio, uma casinha rodeada de árvores centenárias, apresenta-se hoje como a sede da Amulmig, agradável, bem conservada, ampliada, acolhedora.
O segundo Presidente de nossa Academia foi Tasso Ramos de Carvalho, que, apesar do pouco tempo à frente do mandato assumido, realizou tarefa eficiente, conservando os legítimos interesses e a tradição de nossa entidade.
Jésus Trindade Barreto assumiu a Presidência da Amulmig em dois mandatos: o terceiro e o quinto, dignificados por um comando digno de sua postura realizadora.
O quarto Presidente foi Luiz Carlos Abritta, que abriu as portas da realização literária, com sua programação exemplar para a divulgação e a manutenção do egrégio cultivo de cultura, nos oito anos que esteve à frente deste trabalho construtor.
Após o Presidente Jésus Trindade Barreto, assumi este honroso posto há oito anos, tendo sido empossada como Acadêmica em setembro de 1990.
Procurei, com as bênçãos de São Francisco, nosso Patrono, exercer o fazer literário pela fraternidade e união entre os nossos Acadêmicos, na doação da palavra, instrumental primeiro para um labor consciente.
Sob a luz do Espírito Santo, desejamos que a imortalidade que coroa o nosso mister seja a da benemerência, da caridade e do dever cumprido.
Agradecemos os bens que nos foram concedidos.
As pedras do caminho já se foram. Elas também nos favoreceram. Os obstáculos, os desencontros e as tristezas são instrumentos que contribuíram para o crescimento e a fortaleza do caráter.
Longe de ser um organismo apático e desinteressado pelo mundo que o rodeia, as Academias de Letras têm como escopo, gravado no seu Compromisso de Posse, o pugnar pela pureza do idioma pátrio, procurando sempre os sítios do Bem, do Belo e da Verdade. A Língua é a nossa Pátria, digna em seu exato e claro desempenho, interpretada pelo nosso trabalho literário e acadêmico, louvada em ação participativa.
As Academias de Letras serão anacrônicas, reuniões de literatos em desfile de apresentações, se não perseguirem a objetivação de um crescimento global produtivo, envolvendo as várias áreas do conhecimento e do florescimento do ser. Da criação, a partida é dada pela reflexão e pela visão crítica de um pensar mais profundo.
Uma academia repetitiva em suas reuniões apresentadas como mero desfilar de autores não encarna aquela totalidade de que nos fala Henry James ao definir o texto como “um ser vivo, contínuo e uno e como um corpo, seus elementos devem funcionar em integração.”
A Academia Municipalista procura desenvolver o seu trabalho na procura de ascensão para todos os seus membros, com a promoção de palestras, concursos e estímulo para publicações.
O nosso Boletim anual, desenvolve um exercício criativo e estimulante incrementando a publicação das obras de seus acadêmicos; o Boletim da Biblioteca instrui e favorece o conhecimento de áreas educativas e literárias, além de resgatar a memória histórica da Academia.
O nosso trabalho representa o propósito que parte de um cotidiano e se transpõe pela palavra a patamar mais elevado procurando preservar a memória histórica e perseguindo os valores constitutivos de consciente modernidade, traduzida pelo exercício do social em prol dos ideais da comunidade em suas necessidades globais.
Temos o dever de plantar a semente da confiança no futuro brasileiro. É imperiosa a nossa contribuição, como artífices do fazer literário, na divulgação de páginas de conteúdo formativo para que se ilumine a escuridão vivencial.
Tornamo-nos educadores.
A Cultura é inseparável da Educação. Para Cecília Meireles, a Educação deve ser voltada ao sentimento humanístico. E acrescenta os conceitos sobre os verdadeiros educados: os que sabem, os que creem, os que agem, os que não vacilam diante de nada, porque não desservem a um ideal que é o seu, os que jamais seriam capazes de trocar um pequeno interesse coletivo por um grande interesse próprio; os que não vergam, os que não suplicam, os que não mentem e os que não temem.
Segundo Paulo Freire, a educação só pode ser encarada como um quê fazer humano, o que remete a uma ação humanística. Será cada vez mais libertadora esta ação quando encarar o homem como pessoa.  
Depreende-se que os homens se educam a si, mediatizados pelo mundo, a partir de uma posição reflexiva crítica, tanto do educando quanto do educador, em consciente fazer humano.
Educação não se separa de Cultura, são interdependentes no seu propósito de que educar é imprescindível aliada do desenvolvimento ético e humanista.
O território acadêmico é constituído pelos postulados educacionais. É o que fazem as Academias de Letras, posicionando ensinamentos através de palestras, seminários, sessões literárias: disseminam Cultura.  
A história da Municipalista é a história de Minas Gerais, traduzida pelo universo que compõe o seu conjunto de membros ilustres, de representantes de municípios de todo o Brasil, e de outros países, que constroem o corpo literário da entidade.
A Palavra é o instrumental de um escritor, que a maneja na concretização de seus ideais literários.
Que a nossa palavra esteja voltada para as exigências da matéria e do espírito, na acepção tomista de que o ser é composto de corpo e alma. Nesta dicotomia, é preciso separar o joio do trigo visando ao crescimento do ser.
É a Cultura, através da Educação, que forma o caráter de um apreciador de livros e postulados literários.
Aqui, na nossa querida Amulmig, florescem Cultura, Educação, Ética, Ensinamento. E mais, o mais precioso e fraternal acolhimento em sessões qe se tornam fontes de saber, pela contribuição de seus componentes no trazer textos poéticos e trechos prosaicos, ricos de conteúdo em direção ao Bel
Presidente César Vanucci, faço-lhe hoje a entrega de um bem muito precioso para mim: a direção da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais.
Nos oito anos em que a presidi, e nos anos em que participei de seus quadros, muitas riquezas foram acrescentadas ao meu currículo. Além de conduzir esta plêiade de escritores, zelar pela  nossa sede com reformas, decoração do ambiente e do paisagismo, controlar e preservar o nosso patrimônio físico e financeiro, reformar o Estatuto e o Regimento da entidade, acompanharam-me a Amizade e a Fraternidade neste trajeto.
Muitos foram os oradores ilustres que nos brindaram com palestras, inseridas na História de Minas Gerais, na Poesia, na Literatura, nas Ciências Humanas. A Música, a decoração natalina sempre artística, as comemorações tradicionais e obrigatórias pelo Estatuto, como as datas do aniversário, o dia de São Francisco, nosso Patrono, as Sessões Solenes de Posses, a lembrança de nossos acadêmicos falecidos, os acontecimentos que povoaram estes últimos anos, são constituintes da história cívica e cidadã da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais.             
É este tesouro que conservo no coração e que lhe passo, esperando que seu desempenho à frente desta entidade, conserve e reanime esta convivência amena e fraterna.
Presidente Cesar Vanucci, espero que sua ação presidencial seja coroada pelo brilhantismo e pela competência, que lhe são peculiares, junto a esta missão sagrada. “

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