A arte lírica e
popular do “Caffeine”
Cesar Vanucci
“É na arte que a gente se
ultrapassa.”
(Simone de Beauvoir)
Quem viu, não teve como não se render
incondicionalmente ao fascínio do espetáculo. Quem não viu, passou batido.
Perdeu a chance de se deleitar com uma apresentação musical de raro esplendor.
Não sei de muitas realizações do gênero, em palcos brasileiros ao longo dos
anos, que se lhe possam equiparar.
O “Caffeine Trio na Era do Rádio”,
encenado no Centro Cultural Banco do Brasil, Praça da Liberdade, Belo
Horizonte, foi uma manifestação cultural arrebatante. Estrelada por conjunto
vocal de coruscante brilho, provido de atributos abundantes para despertar
encantamento, em qualquer lugar, em plateias ávidas por exibições artísticas
requintadas.
O “Caffeine Trio” é um conjunto de
cantoras com formação lírica. O grupo tem pleno domínio ainda, ostentando estilo
todo seu, sublinhado por ricas modulações vocais, das técnicas brejeiras de
interpretação da MPB. A moldura estética do show constitui outro ponto forte do
trabalho artístico oferecido pelas esplêndidas intérpretes Carolina Rennó,
Renata Vanucci e Silvia Klein. Brindando os espectadores com saboroso desfile
de canções, as jovens, talentosas e belas cantoras criaram no teatro uma
atmosfera de enfeitiçante magia, que projeta, ao mesmo tempo, refinamento
erudito e exuberante alegria da autêntica arte popular. Esbanjando charme e com
movimentação cênica que prende a atenção o tempo todo, o Trio consolida de vez
seu prestígio e conceito no cenário artístico. Promovendo entretenimento de
elevada qualidade, com tempero, cores e vibração bem brasileiros, revela-se
apto a lançar audições fadadas a sucesso em qualquer parte. Nada a estranhar,
por conseguinte, quanto às informações sobre o êxito alcançado em turnê
empreendida, meses atrás, por cidades da Alemanha.
Relembrando os anos de ouro do rádio, o
“Caffeine Trio” contou, nesse espetáculo patrocinado pelo Banco do Brasil, com
o acompanhamento de excelente time de instrumentistas, integrado por Cláudio
Faria, Guilherme Vincens, Pedro Cliveralli e Sérgio Rabelo. Valendo-se de
primorosos arranjos vocais bolados por Avelar Júnior, dividiu o palco, por
instantes, em diferentes dias, no desdobramento da série de shows, com alguns
personagens de presença realçante no panorama da música popular brasileira.
Maria Alcina, Arrigo Barnabé, Elza Soares e Alaíde Costa reavivaram, com a
participação das jovens intérpretes, a memória afetiva musical das pessoas, em
feéricas e emocionantes apresentações.
Pelo que se sabe, os clássicos do
repertório da MPB apresentados pelo “Caffeine” nas audições no Centro Cultural
do BB serão lançados em DVD e CD. É muito bom que isso aconteça. Os
apreciadores de música passarão a dispor de interpretações magistrais, diria
mesmo, antológicas, de algumas canções inesquecíveis guardadas no baú da
memória.
Não resisto, por derradeiro, à tentação
de fazer aqui ligeira associação de ideias do espetáculo citado com um musical
anos atrás levado ao ar pela Globo, que valeu o primeiro “Emmy” conquistado por
um artista brasileiro, meu saudoso mano Augusto Cesar Vanucci, então diretor da
linha de shows da emissora. O musical em questão, “Arca de Noé – Vinicius para
criança”, possuía um irresistível toque de fantasia infantil que, num que outro
instante, cheguei a vislumbrar no “Caffeine Trio na Era do Rádio”. Mais um
ponto para as meninas que tão bem sabem mesclar arte erudita e arte popular!
Todo mundo
Cesar Vanucci
“Vai ser um presente de Natal!”
(Eduardo
Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados, anunciando
livro em
que promete contar coisas sobre os bastidores políticos)
“Todo mundo”: esta a enfática resposta dada
por Eduardo Cunha à pergunta de um repórter sobre quais seriam os personagens
de destaque do livro que prometeu lançar contendo explosivas revelações sobre
políticos brasileiros. A levar em conta numerosos episódios do passado, em que
figurou como protagonista, bem como os métodos de ação costumeiramente
empregados pelo ex-todo poderoso presidente da Câmara dos Deputados em sua
agitada carreira, não constitui tarefa difícil profetizar que vem vindo chumbo
grosso por aí...
Quando a metralhadora giratória (calibre
ponto cem) desse cara entupido de ressentimentos, carregando volumosa carga de
queixas quanto às “traições” de que teria sido “vítima inocente”, for acionada
pra valer, vai ter “corre-corre” danado em tudo quanto é reduto partidário.
Quem se aliou a ele e às suas maquiavélicas propostas de controle do poder – e,
ao que parece, foi quase “todo mundo” – passará por maus pedaços. Vai ter que
engolir, a contragosto, o pão que o tinhoso amassou. Recorrendo-se a uma
expressão em voga no passado, as denúncias alusivas a malfeitos supostamente
cometidos por integrantes das patotas frequentadas pelos delatores Delcidio
Amaral e Sérgio Machado serão reduzidas, certeiramente, a “café pequeno” no
momento em que forem disparados os “obuses”, com fatos verazes ou não – quem
saberá dizer com certeza? – prometidos por esse “astucioso” estrategista de
bastidores. Um indivíduo em que mundão de gente depositou a mais completa e
irrestrita confiança, deixando-se emaranhar em pactos e composições nem sempre
muito católicos...
Notícias chegadas constantemente de
Brasília dão conta de um clima de apreensão bastante pronunciado quanto ao que
possa ainda vir a pintar no pedaço, em função de atos e manobras articulados
por Cunha. As preocupações não envolvem apenas numerosos integrantes da sigla
partidária a que ele pertence. Até mesmo pela circunstância de o parlamentar
recém-cassado sempre se considerar, sendo assim também reconhecido fora de suas
hostes, um prócer extra partidário, um líder predestinado a voos mais altos em
seu itinerário na vida pública. Notabilizou-se pela “competência”, ao “fazer
amigos e influenciar pessoas”. Revelou-se sempre solícito no apoio assegurado
tanto a gregos, quanto a troianos. Pode-se mesmo dizer, em tom xistoso, que se
especializou, prevalecendo-se dos privilégios do acesso fácil às fontes
arrecadadoras de recursos de empreiteiras inidôneas, em “praticar o bem, sem,
desprendidamente, olhar a quem...”
No inevitável acerto de contas a ser
firmado com a Justiça, admitida a hipótese de querer livrar a cara, ou amenizar
a culpa no cartório, ele acabará inevitavelmente por botar a “boca no
trombone”. Já deixou manifesto tal propósito em vociferações repletas de mágoa
despejadas no ar. Nelas, alvejou companheiros que, em seu modo de entender,
deixaram-no ao desabrigo no instante crucial do ocaso parlamentar. “Houve muita
hipocrisia. Não há razão para eu manter convivência com um governo que me
cassou”, sustenta, com fervor, acrescentando que “a guerra está só começando”.
Parte daí para anunciar que no livro serão relatados pormenores “das reuniões,
dos diálogos, tudo (sobre o processo de impeachment), doa a quem doer”. O
lançamento da publicação está previsto para o fim do ano. “Vai ser um presente
de Natal!” assegura, deixando subentendido que o “brinde” contemplará “todo
mundo”. Não carece maior esforço de imaginação estimar que Eduardo Cunha
delate, monte versões, enrede um bocado de viventes com relatos reais ou (quem
poderá garantir?) fantasiosos, alvejando, além de excelências já carimbadas nas
investigações sobre mutretas e maracutaias, outros cidadãos por agora mantidos
acima de suspeita...
Esperar pra conferir.
Adeus
ao
Jornalista Fabiano Fidelis
Cesar
Vanucci
“Minha
morte nasceu, quando eu nasci.”
(Mário Quintana, poeta)
Socorre-me
a memória velha de guerra para anotar que o fraternal relacionamento mantido
com o saudoso Fabiano de Freitas Fidelis remonta ao final dos anos 50. Começou
na redação do “Correio Católico” (“A pena é mais poderosa que a espada”), um
diário destemido, com mais de dez mil assinantes, quantitativo extraordinário
para a época. Esse jornal viveu coerentemente o slogan adotado. Concorreu
significativamente para a formação de uma consciência comunitária de crítica
social aprimorada na vida regional. A redação, bem como a oficina de impressão,
funcionava em prédio contiguo à catedral da Arquidiocese, local que hoje abriga
uma unidade educacional.
Sempre
que vinha de Brasília para visitar parentes e amigos em Uberaba, Fabiano dava
uma chegadinha no “Correio” para dois dedos de prosa com os colegas de
profissão. O intercâmbio de ideias girava em torno de coisas relacionadas com a
atividade que tanto fascínio despertou, vida em fora, tanto no seu, como no meu
espírito: o jornalismo. Certa feita, ele presenteou-me com uma apostila sobre
publicidade e relações públicas. Dela extraí valiosos subsídios para aulas
ministradas, como titular das cadeiras de Técnica de Redação e Publicidade, na
Faculdade de Ciências e Letras Santo Tomaz de Aquino, das Irmãs Dominicanas.
Essa passagem permite lembrar-me que as valorosas educadoras foram pioneiras em
Minas Gerais na implantação de curso universitário na área da Comunicação.
Deu
pra perceber em Fabiano, desde aquela época, inteligência vivaz, capacidade
criativa e arrojo empreendedor. Tais atributos afloravam de forma exuberante no
que dizia, divulgava e fazia. Ele botava nas palavras e projetos de vida, como
ficou caracterizado em fecunda trajetória profissional, ardor, vibração e
combatividade característicos daquelas levas precursoras de brasileiros que
assumiram a empreitada do povoamento de Brasília, nos primeiros tempos da
estupenda e épica proeza histórica nascida dos sonhos do incomparável estadista
JK.
Isso
aí. O chamado “espírito de Brasília” palpitava nas ações e reações de Fidelis.
E tanto isso é verdade que ele, em certo momento, abrindo veredas novas na
caminhada humana e profissional, já exercendo relevantes encargos na esfera da
comunicação social brasiliense, resolveu bancar a circulação de dois jornais na
capital da República. Essa iniciativa marcou o ponto de partida de sua ação
empresarial, desdobrada, anos após, na fundação do vibrante “Jornal de
Uberaba”, onde Fabiano pontificou também com iniciativas vanguardeiras. Ele
concebeu jornal com a cara da cidade que lhe empresta o nome. Adaptando um
conceito do dramaturgo Arthur Miller, “um jornal onde a cidade fala com seus
botões”. Tudo isso ancorado em sua crença na nobreza da profissão e no talento,
tato e vivacidade que soube imprimir nas tarefas abraçadas.
Fabiano
teve, como sabido, participação ativa na vida comunitária. Deixou suas pegadas
nela impressas. Exerceu galhardamente a missão que lhe tocou na peregrinação
pela pátria terrena. Valho-me de uma explicação de Richard Bach sobre o sentido
oculto da caminhada da existência como fecho deste comentário, uma singela
mensagem de saudade ao companheiro que partiu antes de nós: “Existe um jeito simples
de saber se está cumprida a missão de alguém. Se está vivo, não está.”
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