O maior
evento
do cinema brasileiro
Cesar Vanucci
“Está aí
uma façanha histórica!”
(Secretário da
Cultura Angelo Oswaldo)
Assisti a
primeira. Compareci a algumas mais. Acompanhei à distancia as outras. Estive presente
agora na vigésima edição da Mostra de Cinema de Tiradentes. Os da minha
convivência conhecem de sobra o fascínio que carrego, não é de hoje, por
cinema.
Desde os
distanciados tempos da escola risonha e franca, fiz da “sétima arte” referência
maiúscula na lista das predileções pessoais em matéria de entretenimento. Na
juventude, ao abraçar com febril ardor a profissão de repórter eclético inclui
entre as tarefas cotidianas a apreciação dos filmes exibidos nos cinemas de
minha cidade. Ajudei a criar, com outros contumazes cinemeiros, um “Clube de
Cinema”. O clube promovia com constância animadas tertúlias à volta de
projeções de fitas famosas em 16 milímetros. Eram alugadas ou trazidas da
coleção particular de alguém fissurado em cinema. Não perdia lançamentos.
Cheguei a “disputar” recordes de permanência em salas de projeção.
Surpreendi-me, mais de uma vez, deixados os pagos natais em viagens de férias,
a percorrer horas seguidas (até doze horas, vejam só!) salas de projeção nas
antigas “cinelândias” de São Paulo e Rio de Janeiro e no circuito fílmico de
Beagá. Cometi a proeza de acompanhar, em dois dias consecutivos, as três
sessões diárias de “A Doce Vida”. Perdi o número das vezes em que vi
Casablanca, Sinfonia de Paris, Cantando na Chuva, 12 Homens e uma Sentença,
Adivinhem quem veio para jantar?, O Homem que matou o facínora, O pagador de
promessas, 2001 - odisséia no espaço e Orfeu do Carnaval. A lista comporta,
obviamente, outros títulos. Pela minha contabilidade, nas salas de cinema, ou
diante da tevê e de vídeos de locadora, enlevei-me com Retratos da Vida
“apenasmente” 12 vezes. À conta disso, pude inteirar-me dos três diferentes
epílogos bolados pelos produtores dessa encantadora fita francesa. Do que nunca
fiquei sabendo, todavia, foi do tipo de conveniência a que essas mudanças no
fecho do enredo procuraram atender. Tem mais: li e mantenho em minha biblioteca
razoável volume de livros alusivos à temática cinematográfica. Entre eles,
ocupa lugar de destaque na estante a coleção produzida, com talento e apuro de
linguagem, pelo amigo e companheiro Guido Bilharinho, da Academia de Letras do
Triângulo Mineiro.
Falo dessas
coisas com o fito de enfatizar, convicto, não me faltarem credenciais na
condição de espectador, mode que poder afirmar, com todas as letras, acentos,
parágrafos, pontos e vírgulas, que a Mostra de Tiradentes - como restou
exuberantemente provado nesta vigésima versão - representa o mais importante
evento do cinema brasileiro. Seus idealizadores, Raquel Hallak D’Angelo,
Quintino Vargas Neto e Fernanda Hallak D’Angelo, estão cobertos de razão quando
proclamam, tomados de compreensível ufania, que em Tiradentes funciona hoje a
principal fonte de inovação e divulgação do cinema brasileiro. Podem,
perfeitamente, jactarem-se de que a exuberante trajetória percorrida pela
Mostra assegurou-lhe posição de invulgar realce no “centro da história do
áudio-visual e no circuito de festivais realizados no Brasil.”
Enfeixando
na programação, como é do feitio da promoção, diversificadas manifestações da
arte – cinema, música, teatro, literatura, dança, desenho e pintura -,
estabelecendo vinculações competentes e proveitosas com os movimentos sociais e
com a sociedade, a Mostra teve o condão de criar poderosa mística em torno da
tricentenária Tiradentes como novo e esfuziante centro moderno de irradiação
cultural. Fez infletir no formoso burgo - relicário de preciosidades
históricas, arquitetônicas e paisagísticas – o foco das atenções
turísticas.
Nesta
recente edição, afirmando-se como plataforma da produção fílmica independente,
divulgou 108 filmes em pré-estréias mundiais. Promoveu mais um seminário de
estudos com movimentados debates a cargo de renomados especialistas. Patrocinou
oficinas de cinema e implantou a sugestiva Casa da Mostra, ponto de encontro
para pesquisa, produção do conhecimento e do fazer cinematográfico.
Por
derradeiro, o repórter que esta subscreve não resiste à tentação de anotar
fatos que o deixaram um tanto intrigado, ocorridos na imponente solenidade de
abertura da Mostra. Numa criativa e bem documentada exposição visual, foi
mostrada, aos milhares de convidados presentes no Cine-Tenda, uma retrospectiva
dos festivais anteriores, entrelaçada com cenas frisantes da historia
brasileira dos últimos 20 anos. A reação do público, composto predominantemente
de moradores de Tiradentes, deu o que pensar. Nas vezes em que aparecerem suas
imagens no telão, Michel Temer e Aécio Neves foram intensamente vaiados. Luiz
Inácio Lula da Silva foi intensamente aplaudido. Para Dilma Roussef e Fernando
Henrique Cardoso não houve nem aplausos nem apupos.
KALIL
PREFERE O
GRAFITE COLORIDO
Maria Inês Chaves
de Andrade
Vice-presidente da ONG “O Proação”
O
Prefeito Alexandre Kalil foi de uma profunda sensibilidade política, valorizada
a Pólis em sua definição mais essencial, ao perceber que os grafites embelezam a
cidade e a arte urbana merece guarida. Na verdade, sua decisão se distende para
além do que apenas parece, embora aparência seja o que motiva o conflito em São Paulo , sejam gostos
e desgostos. O fato é que neste sufocamento do dia a dia, a grafitagem oferece
uma saída, deixando inspirar e expirar a poesia possível sob a prosa impossível
do cotidiano. Mas, a pensar-se bem, tudo é grafite,
esta cor da arte, bem como da sisudez, cinza tempestuoso. De todo modo, de
grafite-cor tudo se pode grafitar. É legal sem ser nem um pouco “legal”. Grafite
por grafite, Kalil preferiu o colorido enquanto de grafite-cor escreve o projeto
Profeta Gentileza para incentivar a arte da grafitagem por aqui. Ora, não
há muito, aos 29 dias do mês de outubro do ano de 2014, nesta nossa Capital, se
reuniram, no Museu das Minas e do Metal, durante o evento nominado Arte Solidária, várias entidades sem
fins lucrativos e artistas de todas as artes, pela assunção do compromisso
inconfidente de continuidade do desenvolvimento da ideia de liberdade,
proclamada em Minas, quando se instaurou o Solidarismo Mineiro como movimento cultural artístico-humano, cujas
bases se apresentaram pela confecção
do “homem como a maior obra de si mesmo”, tornado ser humano a partir de sua
intervenção sobre a realidade, na valorização de uma estética do bem. Assim,
Kalil vem ao encontro deste propósito comum, o de que a expressão do mundo dos
sonhos e da realidade não apenas exerça influência sobre os artistas e suas
criações, mas também se ofereça às suas influências. Conspiração e inspiração,
veladas e desveladas, figurativas ou objetivas, mas intencionalmente
artísticas, como uma contra-corrente tanto quer romper os grilhões que sufocam
a essência humana de expressar-se. A falta de sentido das linguagens que nos
confundem e nos tornam seres aleatórios subjugados pelo nada quando tudo o que
ansiamos é reconhecermo-nos humanos, sendo, através do outro, seja ele quem
for, na sua infinita multiplicidade.
O solidarismo mineiro
é um movimento que envolve todas as artes e quer influenciar toda a sociedade
como manifestação artística que despreza a nossa pasteurização como cópias
naturais, ditas homens apenas, quando o que nos distingue uns dos outros são a
nossa humanidade e o belo que podemos e que toma a “ética como estética da
existência”. Este movimento instaurado em Minas e sob os ventos que ora sopram com
Kalil releva a demanda que temos a propósito do enfrentamento de todo tipo de
violência e da indiferença que nos constrange a Razão humana. A arte é mesmo instrumento
de intervenção na face do mundo e enfrenta a corrupção como degenerescência da
essência humana sob a potência do bicho-homem. Ora, o poder precisa mesmo
reconhecer-se como “força a serviço da liberdade”, que emana do povo e em seu
nome deve ser exercido, quando a omissão relativamente à humanidade imanente em
nós tem favorecido a que a irracionalidade contrabalance-se a si no equilíbrio
de forças brutas.
O belo artístico que se quer com o grafite
colorido promove a reconciliação do espírito humano enquanto exterioridade e interioridade,
homem e ser humano, superando a cisão natureza-espírito para tomar a obra de arte
não só como objeto sensível, finito e transitório, mas forma de deixar
transparecer a plenitude do divino e do sagrado em nós, objetivamente. “A arte
cultiva o humano do homem”. O objetivo último da arte é mesmo “despertar a
alma”, “é revelar à alma tudo o que a alma contém de essencial, de grande, de
sublime, de respeitável e de verdadeiro”. A promoção de nosso Prefeito é a do
espírito estético que exige, neste momento, que a ideia de ser humano e sua
manifestação exterior, homem, redimensionem a arte para atender as necessidades
tanto da sensibilidade como da razão, reconciliando a finitude da aparência e a
infinitude da essência, de modo a fazer renascer a arte na história de nossa trajetória.
“A verdadeira política é um modelo, uma forma que resolve, a cada momento, a
exigência histórica de um povo” pelo que Kalil, na arte da política, assume um
compromisso racional e estético de intervenção na face de nossa cidade, intercedendo
por uma estética humana e, na produção de sentidos ajudando a construir,
objetiva e subjetivamente, o sentido da vida do belorizontino. Agora, os muros e os viadutos de Belo Horizonte vão se
oferecer à abstração no concreto, nesse concreto armado de nosso país, já
armado até os dentes. Kalil arrasou!
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