precisam ser
ouvidos
Cesar Vanucci
“A
seguridade social é deficitária? Não!”
(É o que dizem a Associação
Nacional dos Auditores Fiscais e a OAB)
Não
há como persistir em fazer ouvidos moucos às veementes manifestações da
Associação Nacional dos Auditores Fiscais. Com o decidido apoio da OAB e outras
instituições representativas de respeitáveis categorias profissionais, os
auditores denunciam clamorosos equívocos que estariam sendo deliberadamente
cometidos pelo governo na condução do processo da polêmica reforma
previdenciária. A tecla martelada pelas instituições é de que a alegação de
rombo descomunal nas contas não passa de engodo. Estratagema produzido com
objetivo de desviar a atenção pública dos problemas que atormentam
presentemente a Nação, gerando desassossegantes presságios.
Acossado
por índices de credibilidade e popularidade baixíssimos, sem similares na vida
republicana; emaranhado em colossal teia de denúncias de corrupção, implicando
figuras de proa da coalisão de legendas que lhe garante sustentação política, o
governo central vem procurando vender à sociedade a chamada PEC 287, como verdadeira
“salvação da lavoura”... Tratar-se-ia de medida providencial – como enfatizado
na retórica empregada – capaz de libertar o país das enormes encrencas
econômicas e sociais em que se meteu. Encrencas essas, como sabido até pelo
mundo mineral – diria com seu verbo cortante o Mino Carta – brotadas da
incompetência administrativa e de promíscua mistura dos negócios públicos com
bandalheiras privadas.
O
principal argumento invocado na defesa da PEC, ou seja o rombo nas contas, tem sendo desmontado por
convincentes dados trazidos pelos auditores fiscais. Estranhavelmente, em que
pese a origem tecnicamente correta dos demonstrativos lançados em contraposição
às falas dos porta-vozes do Planalto, a comunicação midiática de maior alcance
revela-se completamente desinteressada em conceder publicidade a tais dados. Não
se anima, tiquinho que seja, sabe-se lá porque cargas d’água, em estimular o
debate geral e irrestrito, com solar transparência, da candente questão, como conviria
ao interesse público.
Ao
contrário do que se trombeteia, a seguridade social não é deficitária
coisíssima alguma. O diagnóstico é tão falso quanto nota de três reais, asseveram
os auditores. Não passa de falácia a declaração de que a Previdência quebrou. O
que existe, no duro da batatolina, como era de costume dizer-se em tempos de
antigamente, é uma inocultável trapaça contábil.
Pelos
estudos dos órgãos que se opõem à reforma projetada, a arrecadação da
seguridade social é superavitária. Brasília sonega a informação de que parte substanciosa dos
resultados favoráveis auferidos tem sido desviada para cobrir outras despesas.
A
disseminação das explicações alusivas ao momentoso assunto, mesmo enfrentando
indisfarçável má-vontade da grande mídia, já criou, a esta altura, resistências
mais sólidas às propostas da supressão de direitos sociais. Percebe-se que as
modificações vêm sendo rechaçadas pela maioria da sociedade.
A
Associação dos Auditores explica como o “déficit” é fabricado. Em 1994, foi
aprovado mecanismo que favoreceu a utilização de parte das receitas da
seguridade para pagar outras despesas, da maneira que melhor conviesse ao
Governo. Esse mecanismo é conhecido pela denominação de DRU (desvinculação de receitas
da União). Permite o desvio de 30 por cento do caixa da seguridade para outras
finalidades. É por isso que, supostamente, a conta não fecha. Entre 2012 e
2014, os recursos desviados roçaram a casa dos 190 bilhões, consoante análise dos
auditores. O orçamento da seguridade apontou, entre 2007 e 2015, montante
superavitário equivalente a 540 bilhões de reais de acordo com estudo extraído
de dados dos Ministérios da Previdência, Planejamento e Fazenda. Em 2015,
ocorreu o superávit menor detectado no período da avaliação. O ano foi de
aprofundamento da crise e de aumento bastante expressivo da taxa de desemprego,
o que naturalmente afetou a arrecadação previdenciária. As receitas, mesmo
assim, superaram as despesas em 20 bilhões.
Todos
esses elementos informativos conduzem à certeira convicção de que a reforma almejada
alveja inclementemente direitos consolidados. É mais do que compreensível, por
conseguinte, a reação, que parece já ganhar corpo também no meio parlamentar,
contra a aprovação açodada da PEC.
Estabeleceu-se
o conceito de que qualquer discussão em torno do aperfeiçoamento do sistema previdenciário,
que naturalmente acarrete alterações de regras, não poderá ser executado sem
que sejam debatidos à exaustão todos os aspectos em jogo. Ademais, clama aos
céus possa cogitar-se, a qualquer título, na base do monólogo tecnocrático, de
alterações tão significativas, afetando dramaticamente o tecido social, sem a
mais leve tentativa de correção prévia de abusos e desperdícios detectáveis em
outras áreas da administração. Caso, por exemplo, das dezenas de milhares de
marajás da União e dos Estados que percebem remunerações infinitamente
superiores aos tetos salariais fixados em lei. E que, além dos polpudos
estipêndios, desfrutam de outras estarrecedoras mordomias...
Política e picadeiro
Cesar
Vanucci
“Se
fôsseis admitidos a contemplar
(esse
espetáculo), amigos, conteríeis o riso?”
(Horácio, 65-8, “Arte Poética”, mencionado
por Paulo Rónai em seu “Dicionário de citações”)
Episódios
divertidos do trepidante cotidiano político narrados de forma bem humorada por
apreciados colunistas.
·
Mino Carta, “CartaCapital”, edição de 8 de março, comenta a performance
carnavalesca de Ju Isen, celebrada pela mídia como “musa do impeachment” à
época da campanha pela destituição de Dilma Roussef, por convocar uma greve do
sexo enquanto a queda da chefe do governo não se consumasse: “Na terça gorda Ju
saiu para “pular carnaval” completamente nua e em boa parte pintada de verde,
sem exclusão daquela porção do corpo humano onde as costas mudam de nome. Mostrada
ao vivo pela Rede TV”.
·
Élio Gaspari, em “O Tempo”: “Eremildo, o idiota – Eremildo é um idiota e
entendeu tudo. Todos os capilés de empreiteiras dados ao PT eram produto da
corrupção, de propinas e da promiscuidade que os comissários mantinham com as
empresas. Todos os capilés a políticos de todos os outros partidos que estavam
no poder em seus Estados, ou mesmo no governo federal petista, eram legítimas
doações de campanha”.
·
Coluna “Sensacionalista”, “Veja” 8 de março: “Família imperial se antecipa e
afirma que Dom Pedro jamais teve contato com a Odebrecht – Dilma, Temer, Aécio,
Marina, Eduardo Campos. A delação da Odebrecht pega um, pega geral, pega até
quem não está mais entre nós. Com uma lista cada vez maior de pessoas que
receberam dinheiro da empreiteira, os Orleans e Bragança, a família imperial
brasileira, procuraram a imprensa. Preocupados, os príncipes garantiram que
nenhum de seus antepassados que governaram o Brasil teve contato com a
Odebrecht. Nem dom Pedro I nem dom Pedro II. Diante de suspeitas sobre o nobre
francês casado com a princesa Isabel, um assessor esclareceu: “O Conde D’Eu,
mas nunca recebeu”.
A
mesma coluna registra mais este tópico: “O próximo discurso de Romero Jucá será
no Comedians – Ele fala de sexo, de religião e usa fatos históricos sem
sentido. Líder do governo Temer no Congresso, o senador Romero Jucá mostrou seu
talento para o humor e já está negociando apresentar-se no Comedians, o clube
de comédias de São Paulo. Reclamando da restrição do foro privilegiado, ele
disse que “suruba é suruba, não pode ser suruba selecionada”, que “a imprensa
persegue os políticos como os nazistas perseguiram os judeus”, e ainda botou a
revolução francesa no meio, afirmando “que estão apontando a guilhotina para os
parlamentares”. Se juntar tudo isso com seu bigode, é mesmo de matar de rir”.
·
Nirlando Beirão, artigo “Temer no Parnaso”, comentando o lançamento do livro de
poemas “Anônima intimidade”, de autoria de Michel Temer: “A musa Erato, patronesse das elegias amorosas, baixa
invariavelmente em Michel Temer “nas viagens aéreas do trajeto Brasília–São
Paulo”. Dar polimento a súbitos poemas nas citadas circunstâncias tem o condão
de inflar ainda mais seus méritos de rapsodo, já que, em jatinhos da FAB, o
máximo de intercâmbio erudito a lhe caber poderia ser a eventual presença de um
Moreira Franco (nom de plume: Gato Angorá).
Porque com caronas como Paulo Skaf, o da Fiesp, fica difícil encetar qualquer
veleidade intelectual. Skaf jamais leu um livro na vida”.
·
E, por derradeiro, o registro de um psicodélico diálogo ocorrido segundo o
noticiário político de 9 de março numa audiência judicial. Daniel Raizman,
advogado do réu Sérgio Cabral, questiona Rogério Nora, ex-presidente da Andrade
Gutierrez, sobre “propina atrasada”. Pergunta: “Houve um saldo dentro dos
pagamentos de propinas. Ou seja, teriam de ter pago um valor, mas pagaram um
menor. Essa diferença não foi paga. Desculpe lhe perguntar, mas só para que
conste na ata, a empresa pretende pagar essa diferença?” / Resposta: “Não.”/ P:
“Por que não?” / R: “Não, já não gostaríamos de ter pago nem a primeira
condição. E é uma propina, é ilegal. A empresa está no compromisso de não
participar desse processo.” /
P:
“Não haveria hipótese de a empresa do senhor pagar essa diferença?” / R: “Não.”
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