Todas essas
pessoas...
Cesar Vanucci
“O espírito
humano é que nem o Paraquedas, só funciona aberto.”
(Louis
Pauwells)
Essas pessoas
que na contemplação do mar só encontram palavras, como anota Chesterton, para o
enjoo...
Essas pessoas
que absorvem imperturbavelmente, sem questionamentos, a ideia de que o mundo
funciona mesmo assim: “manda quem pode, obedece quem tem juízo...”
Essas pessoas
que não encontram dificuldade alguma em admitir que “amigo meu não tem defeito,
inimigo se não tiver eu boto”...
Essas pessoas
que se comprazem sempre em erguer-se da cama um bocadinho mais cedo, no afã de
dispor de mais tempo pra nada fazer no restante do dia...
Essas pessoas
que, hermeticamente fechadas em si mesmas, consideram sinal de “fim de mundo”
uma desagradável (ou mesmo traumática) abordagem de pivete no meio da rua e que
não ligam a mínima ao noticiário da noite relatando o drama dos refugiados que
perderam a vida em travessias marítimas...
Essas pessoas
que encaram a ciência, a psicologia e a sociologia como impenetráveis florestas
de tabus, escandalizando-se com as interpretações da vida formuladas pelos
aludidos setores, que costumam, quando em vez, lançar estrepitosamente por
terra rançosos paradigmas culturais, obsedantemente cultivados...
Essas pessoas
que diante, por exemplo, do imponente maciço florestal amazônico só conseguem
conceber, utilizando mais do que depressa o computador cerebral para cálculos
aritméticos, o quão fabulosas são as “vantagens pecuniárias” que poderiam
derivar da exploração da madeira...
Essas pessoas
que, fitando o esplendor e as cintilações do firmamento, encontram insuperáveis
dificuldades pra entender o raciocínio e as conclusões de um pensador como Teilhard de Chardin, quando proclama que só o fantástico tem
probabilidade de ser real na escala cósmica e que as coisas, no universo, não
são apenas tão fantásticas quanto a gente imagina, mas muito mais fantásticas
do que jamais se possa imaginar...
Essas pessoas
que não se apoquentam, tiquinho que seja, com a revelação de que os 80 caras
mais ricos do mundo acumulam fortunas de
valor superior a 2/3 da renda dos habitantes do planeta...
Essas pessoas
que não se comovem em saber que, apesar da superprodução de alimentos, milhões
de criaturas em diferentes lugares confrontam a perspectiva da fome por conta
da distribuição incorreta dos produtos e partilha socialmente injusta dos bens
criados para o bem-estar comunitário...
Essas pessoas
que, diante da constatação de a metade da população brasileira ser composta de
negros, gente de cor, como é de hábito dizer, não se mostram surpresas, nadica
de nada, com a rarefeita presença de membros dessa faixa racial nos ambientes
mundanos frequentados, nos locais em que trabalham, nas atividades
profissionais que desenvolvem, nos estamentos sociais ocupados...
E, por derradeiro,
essas pessoas amargas, presas fáceis da intolerância e da paranoia, faltas de
sensibilidade, afastadas por distâncias estelares dos valores que conferem
dignidade a aventura humana, essas pessoas todas, falar verdade, carecem ser
reconectadas com sua humanidade, de forma a não desperdiçar indefinidamente as
chances de evolução espiritual que a Vida oferece!
Calamitoso
epílogo
Cesar Vanucci
“Não se
espantar com mais nada talvez seja o único meio...”
(Horácio, nas
“Epístolas”, em 658 a.C, jamais imaginando que seu conceito
pudesse se aplicar, mais de dois mil anos depois, à realidade política brasileira)
pudesse se aplicar, mais de dois mil anos depois, à realidade política brasileira)
É fato
incontroverso que o acúmulo das evidencias de mediocridade intelectual,
incompetência gerencial e insensibilidade social reinantes nos redutos
palacianos contribuiu para gerar a expectativa de que o governo Temer,
encerrada a missão que o destino lhe reservou, não iria deixar lembrança
positiva na memória das ruas. Mas o que agora está acontecendo extrapolou todas
as perspectivas, mesmo as mais pessimistas, desenhadas nas pranchetas dos
especialistas em estratégias políticas. Ninguém, ninguém mesmo, entre os mais
experimentados analistas da praça, conhecendo a fundo as manhas e artimanhas,
as tricas e futricas do solerte jogo político, teria sido capaz de vaticinar
que o interinato presidencial descambasse, inesperadamente, para epílogo tão calamitoso.
Deu pra
perceber de há muito que, em relação ao dirigente desse esquema governamental
agonizante, a intuição popular jamais falhou. Assumindo as rédeas do poder em
circunstâncias traumáticas, decorrentes do impedimento de sua companheira de
chapa, Dilma Rousseff, personagem desprestigiada no conceito das ruas e
despojada do respaldo político necessário para continuar, àquela altura,
conduzindo administrativamente o País, Temer não conseguiu, em momento algum,
conquistar a simpatia da sociedade para o trabalho, dito de reconstrução
nacional, que se dispôs a levar a cabo. Seus índices de credibilidade e
popularidade, medidos em sucessivas pesquisas, mantiveram-se sempre em níveis bastante
insatisfatórios. Chegaram até a ficar abaixo dos que foram anotados nas consultas
populares referentes à própria antecessora na época do seu defenestramento. As
medidas por ele açodadamente anunciadas, com o suposto propósito de endireitar
os negócios públicos, à falta de diálogos construtivos, de entendimentos
saudáveis com correntes representativas do verdadeiro pensamento nacional,
foram recebidas com enorme desconfiança, quando não com manifesto
inconformismo. Tentando viabilizá-las, de certo modo na marra, valeu-se dos
mesmíssimos manjadíssimos expedientes e posturas encharcados de pragmatismo e
fisiologismo identificados pela opinião pública como altamente nocivos aos
interesses coletivos. Arranjos partidários nebulosos, trocas de favores ao
arrepio da ética, distribuição copiosa de cargos e concessões pródigas de verbas
por conta de duvidosos apoios em votos: em sua atuação à frente do Governo nada
de novo pôde ser vislumbrado no efervescente front político. Tudo continuou
como dantes no quartel de abrantes. A enfática promessa de um Ministério
composto de notáveis esboroou-se. O que se ofereceu, no lugar disso, foi a debochada
designação de uma pá de figuras carimbadas em traquinagens já apuradas, ou em
vias de sê-lo. A sensação amarga passada a uma plateia ávida por processos administrativos
verdadeiramente transformadores foi a de se estar a assistir, outra vez mais, a
filmes já exaustivamente reprisados.
Eis-nos, agora,
portanto, diante de uma situação extremamente difícil. Situação que requer das
lideranças mais lúcidas da Nação ações prontas e eficazes, nutridas de bom
senso, muita serenidade, fervor republicano, respeito institucional e
consciência democrática. As alternativas que despontam como saída para o caos
em que fomos lançados por razões amplamente conhecidas e deploradas, são alinhadas
na sequência. Renúncia, descartada de
pronto por Temer. Impedimento via Congresso, algo assemelhado com o processo
que resultou no afastamento de Dilma Rousseff. Cassação da chapa presidencial
vitoriosa no pleito de 2014, em vias de ser julgada pelo TSE. Esse último item
das opções levantadas oferece ensancha oportunosa para uma reflexão amarga a
mais sobre o comportamento ético, costumeiramente condenável, das elites
brasileiras. O pedido de cassação da chapa foi formulado por um partido que
hoje faz parte, com participação abundante em cargos bem remunerados, da
chamada base governamental. E tamos conversados...
Na eleição
indireta que se prenuncia, ou na hipótese menos provável de uma alteração constitucional
que desemboque nas “diretas já”, vai ser preciso levar em conta uma exigência
fundamental. A ocupação dos postos de comando do poder precisa ser confiada a
cidadãos realmente comprometidos com o autêntico sentimento nacional. Pessoas
com espírito de grandeza, em condições intelectuais, éticas, morais
irrepreensíveis. Providas de capacidade de liderança, que saibam colocar os
superiores interesses do Brasil acima de quaisquer outros interesses. Que
saibam promover a retomada do crescimento econômico e o estudo aprofundado de
reformas sociais genuínas que elevem os padrões do bem-estar comunitário.
Cidadãos que se inspirem no exemplo de JK e que deem de si o melhor no sentido
de imprimir aos negócios da Nação um ritmo de trabalho compatível com a vocação
de grandeza deste País de potencialidades humanas e naturais incomparáveis.
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