Mexeram com os
brios dos mineiros
Cesar Vanucci
“Estamos unidos no propósito de defender o patrimônio
de Minas Gerais.”
(Trecho da Carta aberta em defesa das usinas da Cemig, subscrita pelas
lideranças mineiras)
Minas Gerais dá nesta hora uma soberba demonstração de
unidade de pensamento em torno de uma magna questão ligada a respeitáveis interesses
econômicos e sociais comunitários. O pacto celebrado por suas lideranças
políticas e representativas dos segmentos produtivos, com o propósito de
defender o patrimônio de conquistas construído pela Cemig ao longo de sua
trajetória de 65 anos de fecundas realizações, exalta nossos foros de
cidadania. Exprime espírito de civilidade e sensibilidade política, ao enunciar
que desavenças partidárias estão sendo momentaneamente deixadas de lado em prol
de uma conjugação de vontades poderosa. Uma junção de esforços que fornece
condições propícias para enfrentamento, com altivez e vigor, dos graves
problemas gerados pela intransigência e incompetência do Governo central, outra
vez mais flagrado em notórias dificuldades de entendimento quanto à forma
correta de conduzir os negócios nacionais no rumo do progresso e do
desenvolvimento.
A “Carta aberta em defesa das usinas da Cemig”,
traduzindo clamor geral da sociedade mineira, representada pelo Governo do
Estado, Prefeituras de 500 municípios, bancadas parlamentares da Assembleia
Legislativa, Câmara dos Deputados e Senado da República, associações,
sindicatos, entidades de classe e movimentos sociais, denuncia que a Cemig
corre o risco de perder algumas de suas maiores usinas. Recusando-se a pagar
essa conta, é sublinhado, os mineiros opõem-se com veemência a que isso venha a
acontecer.
No documento citado clama-se do Governo Federal que
respeite os contratos assinados e busque um acordo para renovação das
concessões. De forma didática são alinhados os itens que embasam a justa
pretensão da sociedade mineira. Vale a pena insistir na propagação desses
argumentos. Minas não pode aceitar que sua vitoriosa estatal energética seja
desfalcada das usinas de Jaguara, São Simão e Miranda por um bocado de razões.
Ei-las: 1) Quem pagará a conta, afinal, seremos nós, consumidores: 2) O valor
da conta de energia sofrerá reajustes, pesando em nosso bolso e afetando a vida
de milhares de famílias; 3) A Cemig, hoje a maior geradora de energia do país,
perderá aproximadamente 50% de sua capacidade de geração; 4) Isso resultará em
drástica redução de investimentos, tanto em relação à empresa quanto ao Estado;
5) Tudo isso poderá prejudicar a qualidade no fornecimento de energia e também
afetará a geração de emprego e renda em Minas Gerais; 6) O patrimônio da Cemig
foi construído com o nosso trabalho, com o nosso suor, o trabalho e o suor dos
mineiros; 7) Não é justo que um patrimônio de todos os mineiros seja usado para
pagar uma conta que não é nossa.
A conta de que se fala é a dos desequilíbrios de caixa
da União, provocados, como sabido até nos reinos mineral e vegetal, por
incapacidade gerencial e por outros fatores revoltantes. Fatores esses
indicativos de ações produzidas por administrações impopulares, desacreditadas
e consideravelmente distanciadas do dia a dia do brasileiro comum. E, pela
mesma forma, desvinculadas das aspirações sociais generosas que brotam do
sentimento das ruas.
Na expectativa de que o bom senso e a justiça acabem
prevalecendo, nalgum instante, nas tratativas em andamento, o País das Gerais
deixa claramente estampada a disposição de levar às derradeiras consequências,
nas instâncias próprias, seu inconformismo com o tratamento que se lhe está
sendo dispensado.
Como já foi dito, mexer com a Cemig é mexer com os
brios dos mineiros.
Debaixo
do Amazonas
tem outro rio
Cesar Vanucci
“Você sabe que há um rio que
corre debaixo do Amazonas? Não é um aquífero.”
(Alice Spindola, escritora,
poeta, acadêmica)
Quem
me chamou a atenção para o intrigante assunto foi a respeitada escritora Alice
Spindola. Comentando, com lisonjeiras referências, a série de artigos que vem
sendo estampada neste acolhedor espaço sobre a momentosa questão da cobiça
estrangeira pelas riquezas armazenadas no dadivoso solo e subsolo da brasileiríssima
Amazônia, ela colocou a seguinte indagação: “Você sabe que há um rio que corre
debaixo do Amazonas?” Aditou sugestiva informação: “Não é um aquífero. Este rio
desagua no Atlântico”.
Nos
papos que travamos posteriormente a respeito, a acadêmica Alice Spindola, que
se confessa amante dos rios, estudiosa das águas do mundo, sendo ainda autora
de uma sequência de livros sobre rios do mundo, retratados em prosa sugestiva e
versos inspirados, ofereceu-me abundante material informativo acerca de um
grande rio que corre debaixo do rio Amazonas a uma profundidade de 4 mil
metros. Sobre minha culta interlocutora faço questão de também registrar
tratar-se de alguém celebrado como figura de realçante presença no círculo dos
poetas ibero-americanos.
Antes
de brindar meu atento leitorado com as informações colhidas no enriquecedor
diálogo, anoto para conhecimento do mesmo os títulos de alguns dos livros da
alentada obra de Spindola: “Araguaia – Rio&Alma de Goiás”; “Loire - poema
fluvial da França”; “Vou pelo rio Tornes”; “Bajo el Zumo del Tempio”, que
também fala sobre o rio Tornes. Seja acrescida a informação de que a escritora
conserva inéditos, para lançamento adiante, livros sobre os rios Amazonas,
Araguari e Napo. Este último, rio formador do Amazonas. Cabe anotar também que
em seu trabalho intelectual, viajando muito e promovendo acuradas pesquisas, a
escritora estabeleceu substanciosos contatos com ribeirinhos, mode que coletar
dados específicos sobre os fluxos fluviais focalizados.
Falemos
agora do rio desconhecido de quase todo mundo. Não se trata de um rio
subterrâneo, que corra por enorme túnel nas profundezas da terra. Em sua
caminhada na direção do Atlântico, conforme afiançam os geólogos responsáveis
pela fascinante descoberta, ele se infiltra nas rochas sedimentares. Foi localizado
a partir de análises de dados geológicos referentes a poços de grande
profundidade abertos pela Petrobras nas décadas de 1970 e 1980. Em vez do
petróleo procurado, os geofísicos acabaram topando com um descomunal rio
subterrâneo. O maior do mundo. Vejam só, o maior do mundo em suas
características, circulando justamente debaixo do maior rio visível do mundo, o
nosso portentoso Amazonas.
A
equipe do Observatório Nacional engajada na pesquisa resolveu batizar de rio
Hamza a caudal subterrânea localizada. A denominação homenageou o geofísico e
hidrogeólogo indiano Valiya Mannathal Hamza, que assessorado pela geóloga
brasileira Elizabeth Pimentel coordenou o grupo.
O
trabalho identificou um volumoso movimento de águas subterrâneas em
profundidades de até 4 quilômetros sob as bacias sedimentares dos rios Acre,
Solimões, Amazonas, Marajó e Barreirinhas. Mas o rio subterrâneo poderá se
estender ainda por outras áreas, de vez que os poços profundos perfurados pela
Petrobras cobrem apenas parte da descomunal região amazônica. O rio subterrâneo
corre do oeste para o leste a partir da região do Acre. Passa pelas bacias dos
demais rios citados despejando-se no oceano nas adjacências da foz do Amazonas.
Os
dados geofísicos levantados apontam um diferencial grande no sistema de vazão
dos rios superpostos. A vazão média do Amazonas é estimada em cerca de 133 mil
metros cúbicos por segundo. Já a vazão do Hamza é estimada em 3.090 metros por
segundo. Embora pareça pouco em relação ao Amazonas, esse volume de água
revela-se superior – cabe consignar, à guisa de comparação – à vazão média do
nosso rio São Francisco.
As
conclusões da pesquisa produziram forte impacto nos meios científicos, dando
margem a alguns questionamentos por parte de outros geólogos. A controvérsia
aberta sugere a retomada do assunto em artigo vindouro.
De volta ao rio
embaixo do Amazonas
Cesar Vanucci
“A vazão do Hamza é superior às vazões do São
Francisco e Tietê.”
(Afirmação dos geólogos responsáveis pela descoberta do rio subterrâneo)
O anúncio acerca da existência do rio subterrâneo
embaixo do rio Amazonas, descoberto numa pesquisa promovida por equipe de geólogos
do Observatório Nacional em 2011, assunto focado no comentário anterior, desencadeou
naquela ocasião acesa controvérsia. Pouco
depois da comunicação oficial a respeito, transmitida no 12º Congresso Internacional
da Sociedade Brasileira de Geofísica, alguns técnicos da Federação Brasileira
de Geólogos trouxeram a público observações críticas ao trabalho apresentado.
Sustentando a impropriedade do emprego da expressão “rio” para classificar o
fluxo de água descrito, o referido grupo acentuou que a pesquisa como um todo
não é absurda, mas que as conclusões oferecidas seriam de algum modo precipitadas.
Na contraposição às alegações contidas no trabalho dos
geólogos Valiya Hamza, Elizabeth Pimentel e demais componentes da equipe do Observatório
Nacional, os críticos afirmaram que chamar de rio o fluxo de água indicado é o
mesmo que dizer “que uma caneta em forma de lápis é um lápis e não uma caneta”,
o que lesionaria “conceitos arraigados nas geociências”. O fluxo de água
subterrâneo detectado, segundo ainda os contestadores, é lento. Sua velocidade mostra-se
infinitamente menor que a do rio
Amazonas.
Mas, isso - redarguiram enfaticamente os autores da descoberta
– não constituiria motivo para não chamar de “rio” a caudal apontada na
pesquisa. “Não existe definição na ciência para a velocidade máxima ou mínima
de um rio”, na maneira de ver do geólogo Valiya Hamza. Acrescenta ele:
“Inclusive no Brasil, existem rios com velocidade inferior àquela detectada,
como o rio do Sono, no Tocantins. Além disso, o nosso rio tem um fluxo de 3.900
metros cúbicos por segundo, muito grande se comparado ao do rio São Francisco,
por exemplo”.
Na avaliação dos cientistas do Observatório Nacional,
o emprego do termo “rio” é, por conseguinte, mais do que adequado, uma vez que,
além do rio a que estamos acostumados, que corre na superfície, dois outros
tipos de rio são reconhecidos pela Geologia: o subterrâneo e o atmosférico. Eles
embasam sua tese em argumentos que descrevem características especiais
oferecidas pelo rio subterrâneo embaixo do Amazonas, rio esse, como já
explicado, batizado de Hamza em homenagem ao coordenador da equipe responsável
pela descoberta. Mesmo contendo apenas 2% do volume da vazão média do rio
Amazonas (estimada em 133 mil metros cúbicos de água por segundo), a força do
Hamza, com vazão de mais de 3 mil metros cúbicos por segundo – assinala-se
também - é superior à de dois outros rios relevantes no sistema fluvial
brasileiro. O São Francisco, que atravessa Minas e o Nordeste, beneficiando
calculadamente 13 milhões de pessoas, cuja vazão é de 2,7 mil metros cúbicos
por segundo. O Tietê, em São Paulo, que acusa vazão de pouco mais de 1 mil
metros cúbicos por segundo, quando de calha cheia. Para os pesquisadores existe
ainda outra explicação simples para a suposta lentidão do fluxo subterrâneo. Em
terra, a água movimenta-se sobre a calha do rio como um líquido que escorre
sobre a superfície. Nas profundezas, não há túnel por onde a água possa escorrer.
A caudal vai pouco a pouco vencendo a resistência de sedimentos que atuam como
gigantesca esponja. O líquido vai se ajeitando nos poros da rocha até ser
despejado no mar.
Controvérsia científica à parte, esse rio embaixo do
rio Amazonas, o de maior extensão do mundo nessa peculiaridade, é uma em meio à
enormidade das exuberantes amostras das oferendas com que a Natureza
dadivosamente cumulou o Brasil nessa parte de seu território chamada Amazônia,
onde estão concentradas as maiores riquezas minerais, vegetais e hidrográficas
deste nosso conturbado planeta azul. Um portentoso pedaço de chão, como sabido
não é de hoje, vorazmente cobiçado por gringos com inclinações coloniais de
diferentes sotaques.
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