Cesar Vanucci
“Desapartada
dos valores humanísticos e espirituais, a economia colide com a justiça
social.”
(Antônio Luiz da Costa,
educador)
Em
tudo quanto é pedaço de chão deste mundo convulsionado o que se contempla é uma
avalancha de desatinos. Uma agressão belicosa à ordem social, econômica e
política, gerando fieira interminável de injustiças e indignidades. Como
costumava dizer um governante – cujo nome a maior parte das pessoas só ousa
pronunciar debaixo de certas cautelas, dando três batidinhas no tampo da mesa e
dizendo bem baixinho, mas com firmeza, “mangalô”, também três vezes – a
economia vai bem, mas o povo vai mal. E, falar verdade, isso não ocorre apenas
aqui por estas bandas desguarnecidas do sul do Equador. O cenário pode-se
garantir se reproduz por aí afora. Com maior contundência ali, mas configurando
sempre que as coisas funcionam mal, que o “Projeto da Criação”, previsto para
este planeta pelo bom Deus, vem sendo conspurcado em suas propostas originais.
Um
estudioso em economia, de espírito desarmado, que consiga se desvencilhar da
“síndrome do economês”, poderá resumir rápido e rasteiro em não mais do que
duas frases, todo o drama econômico-social asfixiante destes tempos modernosos.
A economia não pode ser considerada um fim em si mesma. Há que ser vista como
um meio para se atingir um fim. O fim é sempre social. Está dito tudo.
Os
que alcançam esse nível correto de entendimento sabem muito bem que os rumos
trilhados pela economia, nesta hora de tremendos disparates globalizantes, continentais,
nacionais, regionais, carecem urgentemente de impactantes corretivos. As
correções a serem feitas terão que estar compatibilizadas naturalmente com os
ditames da cidadania, o sentimento democrático e os valores humanísticos e
espirituais que conferem dignidade à aventura humana. As coisas não podem
continuar indefinidamente do jeito que andam sob pena de se deixar largada à
cobiça, ambição e mesquinhez de poucos a construção de um destino que se
descortina catastrófico pra todos. Transformando o dinheiro em ícone sagrado
nas ações ruidosas com que movimentam as engrenagens sociais, numerosos
detentores do poder político e econômico, com a responsabilidade de quem se
acredita a emitir, por desígnio divino, éditos imperiais para a coletividade
inteira, só fazem alargar, insensata e incessantemente, o fosso que separa o
pedaço do mundo povoado pelos pouquíssimos que têm muito de tudo, do pedaço
habitado por multidões desprotegidas que pouco ou nada têm.
A
distribuição da riqueza mundial é extremamente perversa. Um pequeno exemplo. Cingapura
é um dos menores países desta nossa ilhota perdida no oceano cósmico. A bem
dizer, não é um país. É mais uma cidade pomposamente rotulada de país. Não
extrai nadica de nada do solo. Sua ostensiva pujança, cantada pela “neobobice”
em verso e prosa, deriva de situações puramente artificiais, engendradas nos
altos conselhos dos grandes cartéis e da megaespeculação financeira.
Singulares
critérios geopolítico-econômicos fazem do minúsculo território, que é regido
por figurino governamental despótico, onde as pessoas podem ser severamente
punidas pelo “crime” de transportar no bolso goma de mascar, um centro de
polarização de investimentos algumas vezes superiores à movimentação financeira
de todos os países, juntos, do continente africano. O jogo dos interesses
econômicos e a gula insaciável, para exemplificar, dos setores bélico,
petrolífero, farmacêutico traçaram destinos muito diferentes para Cingapura e
para a África. Tai devidamente caracterizada uma colisão da “economia” com a
vida.
Cumplicidade muito estranha
Cesar Vanucci
“Os
interesses geopolíticos são, às vezes, medonhos.”
(Antônio Luiz da Costa,
educador)
A
geopolítica tem “razões” que a própria razão desconhece. A cumplicidade dos
governos das grandes potências com os interesses da Arábia Saudita documenta
isso magistralmente. O país, feudal, retrógrado, é comandado com mão de ferro
por uma realeza dócil às corporações petrolíferas. Os direitos humanos são ali
sistematicamente espezinhados. Um fundamentalismo religioso radical, de forte
influência na comunidade, opera ininterruptamente como fonte matricial em ações
de terroristas que apavoram o mundo.
Essas
circunstâncias negativas todas, denunciadas por jornalistas isentos, caso do
famoso Michael Moore, já premiado com um Oscar, não impedem em nada continue a
Arábia Saudita a desfrutar de prerrogativas e privilégios no conceito universal,
graças a poderosos aliados que fingem nada saber do que ali costuma
incessantemente rolar.
A ser
verdade o que uma rede estadunidense de televisão mostrou, algum tempo atrás, o
governo dos Estados Unidos conservou oculta da opinião pública uma informação
muito importante relacionada com os atentados terroristas de 11 de setembro. Ao
ser editado o vídeo, levado ao ar numa cadeia mundial, em que o líder da Al Qaeda,
Osama Bin Laden, aparecia rodeado de prosélitos, a comentar as brutais
ocorrências, suprimiu-se trecho, assaz elucidativo, onde o feroz personagem fazia
alusões claras, com entusiasmo, ao apoio recebido, em suas empreitadas
terroristas, das lideranças religiosas que comandam os destinos da Arábia
Saudita. Segundo o que chegou a ser divulgado, no trecho suprimido, Bin Laden
falava de seu perfeito entrosamento, nas ideias e atos amalucados, com os mulás
wahhabitas que dominam, a partir da influência exercida sobre a casa real
saudita, a vida política, espiritual e social naquele misterioso país, apontado
pelos Estados Unidos como o mais “leal” dos aliados no mundo árabe. E que,
coincidentemente, é o detentor no Oriente das maiores reservas petrolíferas.
Laden chegou a afirmar que a colisão dos aviões com as torres conduzidos por
pilotos fanáticos – todos coincidentemente sauditas - foi celebrada nas
mesquitas de Riad como uma forma gloriosa de sublimação religiosa.
Com
base nas escassas informações que conseguiram superar o silêncio oficial a
respeito de tão desconcertantes revelações, sabe-se que, na época, porta-vozes
da Casa Branca ensaiaram uma explicação que acabou se revelando insuficiente e inconsistente,
no ver de abalizados analistas da política internacional. O trecho suprimido
seria, segundo os porta-vozes, de audibilidade imprecisa. Desse curioso comportamento
oficial estadunidense, pode-se defluir que poderosas injunções geopolíticas,
por maior que tenha sido o mal-estar produzido pelos desconcertantes fatos, “desaconselharam”
o reconhecimento de que o “leal amigo” não é lá tão leal assim. O embrulho
ficou maior quando se relembra o compromisso enfático do então presidente
George Bush de atacar o terrorismo em qualquer lugar do mundo onde ele estivesse
encastelado. Não padecem dúvidas quanto ao teor extravagante da retórica
presidencial. Parece de todo inconcebível, na estratégia estadunidense,
cumprir-se a tal promessa, em se tratando da Arábia. As tropas americanas
acantonadas no território estão ali para defender consideráveis ativos
petrolíferos. Não, por certo, valores éticos e democráticos.
Diante
do exposto fica fácil entender das razões pelas quais os EUA sempre fizeram e
continuarão fazendo, não importa se a Casa Branca seja ocupada por republicanos
ou democratas, vista grossa ao que ocorre na Arábia Saudita, em termos de
sistemáticas violações dos direitos humanos fundamentais. Engasgada em
contradições, cuidará sempre de bem absorver eventuais hostilidades das
lideranças fundamentalistas que ali vivem, mesmo sabedora de suas estreitas
relações com os terroristas de ontem, caso da Al Qaeda, ou de hoje, caso do EI.
As conveniências negociais petrolíferas falam mais alto que quaisquer outros
interesses.
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