sexta-feira, 10 de novembro de 2017

As agruras de um 
“orador oficial”

Cesar Vanucci

“Quem fala muito dá bom dia a cavalo.”
(Adágio popular)


Chegou na Associação de Pais e Mestres no finzinho da reunião e foi logo recebendo da Presidente inesperada incumbência: saudar visitantes ilustres do exterior. Professores e estudantes da Pensilvânia, campeões de “wakeboarding”. “Enfatize o feito esportivo. Vamos entregar-lhes um troféu. Temos interesse em fortalecer o intercâmbio com eles.” Foi o que disse a presidente, sem lhe conceder tempo para argumentar, antes de deixar, às carreiras, a sala. Toda festiva, os braços abertos em sinal de fraterna acolhida, caprichando no timbre de voz para os “rauduidus” de praxe, ela conduziu a comitiva até o auditório. “Eles apreciam pontualidade e eu também”, asseverou.

- E essa agora? Questionou-se com os seus botões, pensamento embaralhado, o nosso indigitado orador. Lamentou haver comparecido à reunião. “Não estaria agora a pagar esse baita mico. E que diacho de coisa é esse tal de “wake sei lá o quê?!” Sentiu-se perdido em meio a solitárias e silenciosas indagações. Lançou um olhar súplice ao redor. Percebeu logo que ninguém ali estava a fim de compartilhar suas aflições. A mesa da sessão começava a ser composta. O público numeroso cuidava, em ruidosa movimentação, de se apoderar dos assentos não ocupados no auditório. Suas ruminações mentais não calavam. Tentava, embalde, consolar-se com a ideia de que, diante da inevitabilidade da incômoda situação, o melhor a fazer era relaxar. Classificava, tardiamente, de supina besteira a concordância dada, dias antes, para a inclusão de seu nome, como “primeiro orador oficial”, na chapa da Associação. O hino de abertura da sessão acabara de ser entoado. A hora do pronunciamento se acercava e ele ainda sem saber como se arranjar na fala para os gringos. Pior, consciente da condição de analfabeto de pai e mãe com relação ao tal esporte de nome complicado. Que tal se invocasse ajuda da Medalha Milagrosa? Descartou a opção por lhe parecer oportunista, consideradas as circunstâncias de nunca lhe haver passado pela cachola a intenção de integrar o grupo de devotos fervorosos da santa. Na busca de auxílio providencial, agarrou-se à ideia de invocar São Judas Tadeu. Adepto do santo não podia, em boa e leal verdade, dizer que era. Mas, de qualquer maneira, pesava a favor o fato de haver acompanhado a patroa em celebrações no santuário erigido em louvor de São Judas pela veneração popular. Mesmo após a invocação sentiu a estrutura óssea balançar, no momento crucial da chamada à tribuna. O coração saltitante, esmerou-se em pronunciar pausadamente as palavras. Rodeou toco o quanto pôde, com filigranas retóricas. Não se atreveu, estrategicamente, uma vez sequer, a citar a modalidade esportiva em foco. Com algum domínio da situação, deixou-se arrastar pela empolgação. Proclamou então que os homenageados, educadores de escol e coisa e loisa, cumpriam exemplarmente histórica missão, aplicando os recursos de um esporte tão apaixonante e valoroso no burilamento da têmpera e caráter dos jovens. Lastimou que tão enriquecedora prática não recebesse entre nós o incentivo devido. Arrancou, para surpresa, uma ovação. Os desportistas campeões abraçaram-no efusivamente, impressionados com tão incisivo apoio à sua causa esportiva.

Um grupo de estudantes, seu filho entre eles, trouxe-lhe, na hora dos cumprimentos, inusitada proposta. Já que se confessara simpático à prática do “wakeboargding”, a moçada resolvera elegê-lo, ali mesmo, patrono do nascente time do educandário. Tocava-lhe, à vista disso, a suprema honra de abrir, com substanciosa doação, o livro de ouro instituído para a aquisição do material de treinamento. Meteu o chamegão no livro, sem tugir nem mugir, o sorriso amarelo, com a cara de quem estivesse conquistando o troféu de “cavalgadura do ano”.

Ainda por se refazer das imprevisíveis emoções do dia, sentiu a língua coçar de tanta vontade de perguntar ao filho, na volta pra casa, o que vinha a ser mesmo esse tal de “wake... sei lá bem o quê...”. Faltou coragem...



Flagrantes deste 
instante político

Cesar Vanucci

“A vida política é carregada de imponderáveis.”
(Antônio Luiz da Costa, professor)

O imponderável não pode deixar de ser levado em conta nas avaliações políticas.

- Lula. A avalancha de acusações, rendendo ininterruptas manchetes, parece não haver afetado pra valer pelo menos até aqui a popularidade de Lula. O ex-presidente vem mantendo com folga, já por considerável espaço de tempo, em todas as consultas de preferência de voto, a dianteira entre os outros presumíveis candidatos, não importa quais sejam os cenários objeto de avaliação. Os fervorosos prosélitos do dirigente petista mostram-se exultantes com as pesquisas. Consideram “favas contadas” sua vitória nas urnas, na hipótese de que venha realmente a concorrer. Concebem, na pior hipótese de previsão eleitoral, que a força política lulista seja capaz de conduzir à rampa do Planalto pretendente por ele apoiado, caso se torne inviável sua participação na pugna.  A quem se espante com os resultados dessas sucessivas pesquisas, convém lembrar que, dono de indiscutível carisma, Lula recebeu positiva avaliação pela razoavelmente bem sucedida política de inclusão social levada a efeito em suas gestões.
A visão otimista da legião petista encontra também alento noutra revelação vinda das pesquisas de opinião. Embora os eleitores deixem consignada forte rejeição às legendas de um modo geral, o PT consegue alcançar, ainda assim, índice de apoio de 17 por cento, enquanto os oponentes próximos não atingem sequer 2 por cento. De qualquer forma, fica difícil pacas arriscar palpite com relação ao que poderá vir acontecer na campanha sucessória de 2018. Mesmo que se reconheça plausível alguma alegação dos petistas de carteirinha, no que tange à inconsistência de um que outro item nas volumosas acusações levantadas contra Lula, impõe-se reconhecer que a carga das delações e indícios sobre sua participação, diretamente ou por criticável omissão, nos eventos delituosos trazidos a furo é consideravelmente pesada. Muitas as situações comprometedoras descortinadas a deporem contra a tese, sustentada por alguns, de que ele esteja totalmente isento de culpa no cartório. Mas, por outro lado, com esse “acordão de cavalheiros” escancaradamente à mostra, graças a incrementadas movimentações nos círculos do poder, movimentações essas já não circunscritas apenas aos bastidores, pode acontecer que sobre também para o ex-presidente alguma “cota de benefício” no processo em gestação. Esperar pra ver!

-   Geddel. Intrigante, sem dúvida, a súbita “promoção” a “chefe de organização criminosa” do ex-ministro e ex-deputado Geddel Vieira Lima. Na presunção geral – e não apenas na de um senador tido e havido como comparsa do ousado baiano em rendosas mutretices –, o dito cujo se notabiliza pela competência demonstrada no desempenho dos postos de realce assumidos no esquema mafioso, mas é inocultável a evidência de que, na verdade, seus atos respondam a vozes de comando de graduação superior. A mais recente de suas proezas, transformando luxuoso apartamento em “caverna de Ali Babá” para guarda de um tesouro em notas de 100, a serem repartidas entre 40 (ou, quem sabe lá, mais) cupinchas, não lhe assegura, por si só, jeito maneira, direito a galgar a posição que lhe foi de “mão beijada” atribuída. Ferinas avaliações sugerem que a “designação” de Geddel como “chefe de quadrilha” seria de molde a amparar, sutilmente, mais na frente, interpretação jurídica que o impeça de aderir à “delação premiada”. Em condição que tal, ele certeiramente se tornaria, pela familiaridade com as entranhas das maracutaias, um novo “homem-bomba”. Que nem, pra dar exemplo, o ex-ministro Antônio Palocci. Aguardar os desdobramentos pra conferir! 

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