A contundente
distribuição
da renda
Cesar Vanucci
“A turma (mais
afortunada) do 1 por cento levou para casa, no ano passado,
36 vezes o que
ficou com a metade mais pobre dos brasileiros (...),
grupo formado por pessoas
com renda média de 750 reais mensais.”
(André
Barrocal, jornalista)
Dados
recolhidos nas declarações anuais do Imposto de Renda, objeto de comentários
técnicos em órgãos especializados, estão alinhados num trabalho jornalístico de
fôlego de autoria de André Barrocal, na apreciada revista “CartaCapital”,
edição de 27 de junho passado. O trabalho oferece sugestivo retrato de corpo
inteiro da contundente distribuição da renda nacional. Revela, como ponto de
partida, com base em informações coletadas pelo IBGE na “Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios (PNAD)”, que de uma população de 207 milhões 124 milhões
de pessoas possuem algum tipo de renda, derivada de trabalho remunerado,
aluguéis, aposentadorias, pensões, mesadas, aplicações, benefícios sociais,
assim por diante.
O salário é
apontado como a modalidade mais importante de renda, fonte de provento para 86
milhões. Desses, 860 mil são identificados como integrantes da faixa mais
afortunada em matéria de rendimentos, pela circunstância de abiscoitarem, em
média, 27 mil reais por mês. Fazem parte do conjunto dos 1 por cento mais bem
posicionados financeiramente. Esta categoria responde por 20 a 25 por cento da
riqueza brasileira.
Estudos a
respeito das desigualdades sociais na vida contemporânea ressaltam que a
concentração de renda nas mãos de pequenas minorias constitui fenômeno mundial.
No Brasil, os índices que falam da perversa discrepância são considerados
maiores do que em boa parte dos países de economia pujante. Noutras palavras,
os sinais dos gritantes contrastes na apropriação de bens mostram-se, cá por
estas bandas, mais visíveis do que em outras plagas.
Os 5
brasileiros mais ricos somam haveres calculados em 87 bilhões de dólares. No ano passado, os algarismos acumulados do
ervanário pertencente ao reduzido grupo correspondiam – ora, veja, pois! - ao
patrimônio somado de 100 milhões de compatriotas da metade mais pobre. De outra
parte, os 15 maiores ricaços brasileiros, elencados em trabalho da revista
“Forbes” ao relacionar as 1000 fortunas mais avultadas do planeta, detinham
recursos da ordem de 124 bilhões e 700 milhões de dólares. Da comparação do PIB
brasileiro (1.796 trilhão de dólares, em 2016) com o patrimônio desses 15
magnatas extrai-se a conclusão de que a participação dos mesmos na renda
nacional anda por volta de 8 por cento.
A lista dos
nossos miliardários comporta outros sugestivos registros. Dos 5 mais bem
aquinhoados, ocupando o primeiro, o terceiro e o quarto lugares, três fazem
parte de um mesmíssimo conglomerado empresarial, ramo de bebidas. Na sequência,
no sexto e sétimo lugares, se posicionam 4 dirigentes de uma mesma instituição
bancária. Os 13º e 14º lugares da lista são de executivos de uma outra
organização de presença realçante no cenário industrial.
Ao time do 1
por cento toca, no bolo da riqueza coletiva, fatia equivalente a 36 vezes mais
a da metade mais pobre, que sobrevive com renda média mensal de 750 reais.
Abaixo, como sabido, do pífio piso salarial vigente, piso que o governo cismou
em não elevar para o ano vindouro.
Louvando-nos
ainda nos informes da “Forbes”, tomamos ciência de que, entre 2016 e 2017, dos
2.043 triliardários listados no mundo inteiro 31 eram de nacionalidade
brasileira. Em 2018, mais 12 entraram no seleto clube.
As análises a
que nos reportamos fornecem copiosa informação sobre as características da
distribuição da renda brasileira. Em 2017, 28 milhões de contribuintes
prestaram conta ao Leão. R$ 137 mil foi o ganho médio mensal declarado de 1.300
dirigentes de empresas com ações negociadas na Bolsa. De R$ 100 mil mensal foi
a renda média anunciada por 9.600 donos de cartórios possuidores de bens
avaliados, em média, de 1,4 milhão de reais e de patrimônio de 1,3 milhão.
Trinta e cinco mil e 200 membros do Poder Judiciário assinalaram renda média
mensal de R$ 51 mil, enquanto 2.600 diplomatas afirmaram possuir renda média
mensal de R$ 36 mil e riqueza individual de 1,6 milhão em média. O patrimônio
médio e a renda mensal anotados por 323 mil médicos foram, respectivamente, de
R$ 850 mil e de R$ 28 mil. Já o patrimônio registrado por vinte e oito mil
advogados foi de 540 mil, enquanto sua renda média atingiu 28 mil.
O amplo painel
de dados vindo a lume no trabalho jornalístico citado não levou em conta, óbvio
supor, os valores presumivelmente altíssimos das fortunas pessoais amealhadas
no plano – chamemos assim – da informalidade. Bufunfa respeitável acha-se
guardada, com certeza, em contas ultrassecretas nos chamados “paraísos
fiscais”. Locais que a hipocrisia social e os manjados esquemas de malfeitorias
em permanente funcionamento fazem questão de manter, receptivos, ativos e
prósperos, em variadas paragens deste mundo amalucado, começando pela ladina e
neutra Suíça.
Mas isso, como
era de costume dizer-se em tempos de antanho, já são outros 500. 500 milhões,
ou bilhões, em dólar, euro, libra, por aí, por aí...
Momento
brasileiro
reclama reflexão
Cesar Vanucci
“"Uma crise no Judiciário contribui
para elevar ainda mais
a desconfiança da população nas instituições e na
própria Democracia".
(Ciro Gomes)
Agora, que o
sonho do hexa se esvaiu que nem bolha de sabão solta no ar, deixando na boca um
gosto azinhavrado de cabo de guarda-chuva umedecido, o jeito que tem é encarar
a realidade deste instante político e administrativo desfalcado de inspiração
em termos de construção humana. Com as eleições à vista, o ainda não de todo
definido quadro de candidaturas suscita preocupações à pamparra.
Revela-se
visível demais da conta a carência de propósitos, nos ditames políticos,
capazes de verdadeiramente encher de empolgação a alma coletiva. Muita gente
até aventa, a esta altura da copa eleitoral de outubro, a hipótese de que o
volume de abstenções e sufrágios nulos possa, na hora das apurações, superar o
número dos chamados votos úteis. Não há como ocultar o desencanto reinante
quanto aos nomes da lista de candidatos prováveis.
O desencanto,
fácil de ser detectado nas ruas e lares, encontra respaldo na avalancha de
malfeitos que tolda o panorama político. É um nunca acabar de casos de
malversação do dinheiro público, envolvendo dirigentes de todos os matizes
partidários, incontáveis agentes públicos infiéis e empreiteiros inidôneos. São
demonstrações abundantemente oferecidas, em diversificados escalões
administrativos, de inaptidão para o exercício do gerenciamento dos negócios
públicos. É um clamoroso descaso, nas esferas burocráticas, para com aspirações
as mais elementares da sofrida gente do povo. Em não poucas decisões relevantes
para o interesse comunitário percebe-se, com desnorteante constância, gritantes
insensibilidade social e desrespeito pelo sagrado sentimento nacional. As
indesejáveis consequências desse estado de coisas sentimo-las, todos nós, dia a
dia, na maltratada pele.
Nada obstante
os róseos comunicados sobre o que vem rolando no pedaço político-administrativo,
transmitidos sem o mais leve rubor na face por porta-vozes palacianos
reprovados pela opinião pública no quesito empatia, os fatores que medem o
bem-estar social continuam a apresentar tendências declinantes. O desemprego
cresce a olhos vistos. As atividades produtivas sinalizam estagnação. Os preços
dos produtos essenciais aumentam continuamente. Idem, idem com referência aos
combustíveis e taxas de serviços nas áreas da saúde e noutras modalidades de
prestação de serviços imprescindíveis à coletividade. Os escorchantes juros
bancários desencorajam promissores empreendimentos, afetam negócios em
condições de gerar oportunidades de trabalho e promover a prosperidade. E o que
não dizer, quedando por ora na listagem dos tormentos cotidianos, da violência
urbana que grassa solta na praça?
Como se toda
essa carga descomunal de questões mal resolvidas, em razão da insensatez
político-administrativa prevalecente, já não fosse suficiente o bastante para
apoquentar a paciência das pessoas, incrementando o desassossego social, ainda
estamos sendo agora constrangidos a confrontar, impotentes e aturdidos, mais
uma encrenca inusitada, perturbadora, inacreditável. Nutrida, de certo modo,
por exacerbações egolátricas e passionalismo de personagens que deveriam zelar,
por dever de ofício e ética profissional, pela isenção nas decisões, a
ostensiva e tensionante politização da Justiça, nos dias de hoje, alimentando
torrente de manchetes, alveja respeitáveis postulados democráticos.
Alguns
representantes do Poder Judiciário nas diferentes instâncias arvoram-se do
direito de reinterpretar, a seu talante, de acordo com convicções ideológicas
pessoais, preceitos constitucionais, inserindo um toque anárquico no ritmo
processual. Produzem entendimentos dúplices, por vezes altamente conflituosos,
em situações de características legais rigorosamente idênticas. Não passa
desapercebido, mesmo a olhares leigos em matéria jurídica, que de tempos para
cá os holofotes midiáticos andam mexendo bastante com a cabeça de ilustres
cidadãos que carregam a responsabilidade de decisões relevantes.
Isso remete à
admissão de que já está passando a hora, conforme reconhecido pelas mentes mais
lúcidas da Nação, de os setores encarregados de zelar pela ordem jurídica se
empenharem, urgentemente, numa reflexão aprofundada do que vem acontecendo. E,
a partir dessa avaliação, adotarem procedimentos, definirem fórmulas
producentes no sentido de desfazer a baita confusão jurídica implantada, que
tanta inquietação tem causado no espírito popular.
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