sexta-feira, 5 de outubro de 2018


Está chegando a hora

Cesar Vanucci

“Eleição é um teste cívico periódico para se manter a boa saúde democrática.”
(Antônio Luiz da Costa, educador)

Em idos tempos, anteriores ao estrondoso advento da era da comunicação digital, disputantes de cargos eletivos e próceres partidários costumavam recorrer, nalguns instantes de efervescência política, a uma frase declinada como uma espécie de refrão. A frase “em tempo de guerra, mentira como terra...” sintetizava, com adequação, o duelo flamejante das acusações e denúncias trazidas a público.

De meu isolado posto de observação, atento ao que leio e ouço dos protagonistas das competições eleitorais e porta-vozes, dou-me conta de que essa expressão parece haver caído em desuso. Está fora de moda. Pergunto-me por quê? A resposta que me acode é simples. A tal frase - com jeito, repita-se, de bordão, ou coisa equivalente - não consegue exprimir com fragor apropriado a avassaladora torrente de informações dúbias ou inteiramente falsas, os doestos, as sibilinas assacadilhas despejadas nas chamadas redes sociais. Redes sociais estas reconhecidas como as fontes de consulta mais incrementadas na atualidade. Muita gente vislumbra, nesse impactante esquema de divulgação, instrumento de propaganda de impensável descarte nestes tempos amalucados.

Admitamos, com pitadinha de condescendência, a hipótese de que a orientação geral passada pelos comandos partidários aos encarregados da marquetagem não contemple a avalancha de exageros detectada. Os excessos cometidos correriam a débito do descontrole emocional ou fanatice de apaixonados seguidores dos candidatos. Mesmo assim, sob mira crítica, não há como desfazer, ou deletar, como se diz no linguajar internauta, a incômoda sensação de que, na campanha em curso, os limites éticos vêm sendo extrapolados pra valer. A propagação, às vezes com ímpeto de rastilho de pólvora, de notícias desairosas, alvejando adversários, revela-se volumosa. Infinitamente mais do que a própria e, aí sim, absolutamente necessária disseminação das propostas de trabalho daqueles cidadãos que, na tentativa de sensibilizar o eleitorado, proclamam-se dispostos a batalhar incansavelmente pela solução das questões tormentosas enfrentadas no panorama brasileiro. E, pelo que se percebe, esse indesejável estado de coisas está longe de arrefecer. Tende, falar verdade, a agravar-se no breve pedaço de tempo que resta para a decisão soberana e inapelável das urnas.

É oportuno enfatizar que o jogo democrático tem regras claramente definidas. A livre expressão das ideias, as discordâncias, as ruidosas manifestações populares fazem parte do enredo elaborado e garantido pela Carta Magna. Levantar, a esta altura de nosso estágio democrático, desconfiança e suspeição a respeito da legitimidade e seriedade de um sistema de coleta e apuração dos votos mundialmente louvado pelo seu elevado grau de eficiência, constitui expediente nada democrático, de baixo nível e deslavada má-fé. De igual modo, há que ser visto como achincalhe aos nossos foros de cidadania bravatices do estilo “vamos acabar tomando o poder, o que é diferente de ganhar eleição...” É de se deplorar e de se estranhar também que, justamente à véspera do pleito, fragmentos de depoimentos obtidos via delação premiada, considerados juridicamente insuficientes como elemento probatório, sejam extemporaneamente liberados para divulgação espalhafatosa. Coisa assim pode ser interpretada como atentado à neutralidade que o Judiciário tem o dever de sustentar diante de uma contenda política, sobretudo marcada por acesas paixões.

Ao eleitor consciente impõe-se o discernimento de saber distinguir, na frenética onda de impropriedades espalhadas, os propósitos realmente positivos e edificantes, contidos nos projetos e propostas debatidos, daquelas maquinações demagógicas e desconstrutivas que, desafortunadamente, enxameiam a corrida atrás do voto. Por outro lado, o bom senso, os ditames éticos e legais estatuídos pelo regime democrático reclamam dos candidatos, também nesta mesma hora, que esmerem na apresentação de suas plataformas. Tratem de convencer, pela argumentação, pelo conteúdo da pregação, as legiões de votantes, tornando-os simpáticos à causa que abraçam.

A receita democrática é essencialmente esta: quem conseguir aglutinar maior contingente de votos ficará, obviamente, investido da sagrada missão de conduzir os destinos nacionais. A campanha finda no segundo turno, se houver. Ao depois de anunciados oficialmente os resultados, de acordo com o calendário estipulado, acontece a posse dos legitimamente escolhidos.

E se Deus assim permitir em resposta a justos anseios da sociedade, estaremos inaugurando uma nova etapa em nossa história política. Aguardada com expectativa, mais do que isso, com fervorosa esperança, essa nova etapa, congregando as forças vivas e produtivas da Nação, haverá de favorecer a retomada do desenvolvimento econômico e social. Haverá de garantir definitiva ruptura com esse hiato de estagnação que tanto nos amargura.


A política, segundo o 
pensador Arduini


 Cesar Vanucci


“(...) Política é nobilitante e expressa sentido de cidadania.”
(Padre Juvenal Arduini, sociólogo e professor)

Criatura admirável, provida de incomum sabedoria, soube colocar os talentos do espírito a serviço do mundo, das causas sociais, dos excluídos na partilha dos bens terrenos prodigalizados pela Natureza ou produzidos pelo labor humano.   Chamava-se Juvenal Arduini. Padre, escritor, sociólogo, professor, tribuno eletrizante. Desfrutei do privilégio de extensa convivência, muito fecunda para mim em benefícios, com esse admirável mestre. Em certa ocasião, ao homenageá-lo, disse-lhe que o considerava o padre Lebret brasileiro. Atualizo o conceito. Nutro hoje convicção plena - repassando lances do seu trabalho apostólico e revendo escritos brotados de sua pena refulgente e ensinamentos transmitidos em sua fala civicamente desassombrada - que faz todo o sentido proclamar também que o citado padre Lebret, festejado pensador, foi o Juvenal Arduini francês.

Ao relembrar personagem de tão maiúscula presença na cena intelectual, aquinhoado de dons humanísticos e espirituais invejáveis, amigo muito querido, meu compadre, tomo a liberdade de substituir, com notória vantagem para o leitor, meu comentário nesta véspera eleitoral por palavras extraídas da vasta e valiosa obra deixada pelo mestre. São pensamentos vigorosos, oportunos e atuais, como se verá adiante.

Vamos lá. Assim falou Juvenal: “Em tempo de eleições (...) é oportuno refletir sobre a política. Política deriva de “poleteia”, no grego. “Polis” significa cidade, região habitada. E “polites” é cidadão. Verifica-se que, originalmente, política é nobilitante e expressa sentido de cidadania.

Política é fenômeno eminentemente social e promove a sociedade como todo. Política tem significado de associação, convivência e aliança. A política existe para reunir pessoas, integrar grupos e povos para responder aos desafios sociais. A verdadeira política suscita a socialização substancial e elimina o dilaceramento feroz entre pessoas, organizações e partidos.

A política está organicamente ligada ao povo. É destinada a servir o povo e não a subordiná-lo a interesses mesquinhos. A Constituição brasileira foi ousada e lúcida ao tratar da relação entre poder e povo. No artigo primeiro, parágrafo 1, a Constituição declara: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Aí está proclamação constitucional lapidar que dignifica Nação moderna. O poder emerge do povo. E também é exercido pelo povo mediante os eleitores ou diretamente. O poder está no povo, permanece no povo. O povo pode outorgar funções aos políticos, mas não lhes transfere o poder. Estritamente, o poder é do povo e não dos governantes. Há políticos que agem como se fossem donos do poder, que pertence ao povo. Isso é usurpação do poder popular.

Há muitos tipos de política. A politica humanizada, social, ética e comprometida com a população. A política prostituída, corrupta e perversa. A política autoritária, tirânica e a política submissa, servil. Há política séria que responde às necessidades da população e política corrompida que se apodera dos recursos que pertencem aos pobres.” (...) “A realidade política, em si, é valor humano, social, cultural e histórico. A política sadia é necessária à sociedade. Não se trata de abolir a política, mas de limpá-la. Há que resgatar o potencial político dos povos. É urgente instaurar (...) a política da justiça e não da miséria. (...) A política da ética (...) A política da vida e não da morte. A política deve estar comprometida com o clamor da humanidade sofrida e com a responsabilidade histórica.”

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