quinta-feira, 4 de abril de 2019


O fundamentalismo saudita

Cesar Vanucci


“Na Arábia Saudita, basta ser homossexual para ter o pescoço cortado.”
(Gilles Lapouge, jornalista)

História recente. Um jornalista saudita, asilado nos Estados Unidos, de passagem pela Turquia, resolve procurar o Consulado de seu país natal para regularização de documentos. Nunca mais foi visto. O governo turco faz uma denúncia terrível: o jornalista foi detido, torturado, esquartejado. Seus despojos repousam em local incerto e não sabido. A bárbara ocorrência foi ordenada por alguém muito poderoso da realeza da Arábia Saudita.

A grita de protesto durou pouco tempo. O governo de Riad, uma ditadura cruel de configuração feudal, continuou a ser tratado a “pão de ló”, como se costuma dizer. Tudo por conta do petróleo e interesses negociais subjacentes. As conveniências geopolíticas fazem com que dirigentes de países poderosos não se enrubesçam, tiquinho que seja, em apontar a Arábia Saudita como nação moderna, baluarte da democracia na conturbada região em que se acha localizada, fechando os olhos ao cortejo de horrores ali praticados contra os direitos fundamentais. Tem-se por certo que no país, entre outras absurdidades, subsista ainda a escravatura. O tratamento dispensado à mulher atinge inimaginável paroxismo machista.

Na verdade, a Arábia Saudita é tão ou mais fundamentalista, na extensão mais retrógrada do termo, que o Afeganistão do tenebroso ciclo talebã. Mas, como frisado, é inexplicavelmente poupada nas críticas internacionais feitas às fanatices atribuídas a grupos religiosos coléricos. Quando abre espaço para denunciar despropósitos praticados por intérpretes alucinadamente confusos do Alcorão, um livro sagrado digno de respeito, a mídia se omite escandalosamente face a qualquer lance em que a Arábia Saudita figure como protagonista. Ou, pelo menos, trata com indulgente discrição os desatinos que proliferam naquele país.

São objeto de proibição, nos ermos sauditas, entre outras coisas, o álcool, a dança, a astrologia, o emprego das perigosas expressões “papai” e “mamãe” no convívio familiar, a pecaminosa participação mista em cinemas e educandários. Uma mulher, mesmo ocidental, que ouse sair na rua com trajes despojados, considerados afrontosos à moral e costumes, é açoitada publicamente pelos “guardiães da fé”.

O obscurantismo das leis chega a extremos inconcebíveis. A Arábia é o único país a punir com pena de decapitação os chamados desvios sexuais. Pessoas condenadas sumariamente pelo “crime da homossexualidade” são decapitadas em praça pública, a golpes de sabre. Houve ano em que esse processo bárbaro de avaliação da conduta social produziu 80 vítimas. Os registros dessas atrocidades passam à deriva da divulgação midiática. A ONU, as grandes potências, as próprias organizações consagradas à defesa dos direitos humanos fecham-se, estranhavelmente, em copas diante dos clamorosos acontecimentos.

Gilles Lapouge, jornalista, critica acerbamente o comportamento da sociedade internacional em relação ao que rola. O assassinato dos homossexuais mostra a dinastia saudita, por trás de sua vitrina suntuosa de magnatas do petróleo, amiga e sócia de personalidades mundiais influentes, numa versão de inaudita ferocidade. O jornalista afirma ainda que naquele canto do mundo ocorrem coisas piores que noutros lugares dominados por regimes absolutistas. A dinastia Saud, família real encastelada no poder, desfruta de total imunidade quanto aos malfeitos incessantes. A realeza saudita, afirma ainda o bem informado jornalista, anda a reboque da seita religiosa mais extremada e incendiária do fundamentalismo muçulmano. Os sunitas ou xiitas, mesmo os mais radicais, não passam de meros cordeiros perto do wahhabitas. Alá proteja quem, desventuradamente, venha a cruzar os caminhos desses tresloucados religiosos!

Michael Moore, cineasta e jornalista estadunidense, é outro autor renomado que já denunciou, em livro e filme, os delitos contra a humanidade registrados nas áreas sauditas. Ele assegura que a trama relativa à derrubada das torres gêmeas em Nova Iorque foi urdida por fundamentalistas religiosos de presença marcante no governo saudita em conluio com Bin Laden. Um dos indícios de que se vale ao sustentar tal assertiva é este aqui: os pilotos dos aviões arremessados pertenciam aos quadros da Força Aérea da Arábia Saudita.

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