Nicolau,
Cleópatra e Dumas, negros, com orgulho
Cesar Vanucci
“Faz parte do respeito à memória de uma
pessoa negra não embranquecê-la”.
(Joice Berth,
escritora)
Leitores
destas maldigitadas adicionam curiosas informações às narrativas estampadas
neste acolhedor espaço acerca do chamado “Maquiamento preconceituoso”. Estamos
falando desses incríveis relatos de descarada impostura social em que célebres
personagens negros são representados em textos, quadros, documentos variados
como se brancos fossem.
Nos
comentários que atraíram a atenção do nobre leitorado, este desajeitado escriba
alinhou, como resultado de pesquisas promovidas por especialistas em
antropologia, os nomes de duas dezenas de eminentes cidadãos brasileiros que,
mercê de seu talento e labor, alcançaram posições de inconfundível realce no
panorama brasileiro da construção humana. Cidadãos esses que, deploravelmente,
tiveram a memória aviltada em consequência da adulteração, calcada em
abominável preconceito, nos registros referentes à sua legítima condição
étnica. As informações vindas agora falam de outros personagens de destaque
histórico, não brasileiros, igualmente retratados em copiosa documentação como
brancos, apesar de serem negros. Negros como a noite.
Alexandre
Dumas, universalmente festejado autor de obras como “O Conde de Monte Cristo” e
“Os Três Mosqueteiros”, transformadas em filmes épicos que renderam grande
bilheteria, teve como pai um general e como mãe uma escrava africana.
“Adaptações artísticas” em sua imagem e currículo, com indisfarçáveis
motivações discriminatórias, levam a maioria das pessoas a vê-lo como cidadão
branco.
Recuando
mais longe na história, chegamos à figura lendária, cantada em verso e prosa,
da última rainha do Egito. Cleópatra foi sempre representada, em pinturas,
filmes e por aí vai, como belíssima mulher branca. A deslumbrante Elizabeth
Taylor foi, aliás, por sinal, a atriz escolhida por Hollywood, entre outras
beldades, todas também brancas, para representar a mitológica Cleópatra naquele
edulcorado enredo que fala do irresistível fascínio por ela exercido em Júlio
Cesar (na fita, protagonizado por Rex Harrison) e Marco Antônio (papel vivido
por Richard Burton, marido de Elizabeth Taylor). Manda a verdade dizer que a
rainha do país dos faraós nada possuía, entretanto, dos traços europeus
mostrados nas telas do cinema. Suas características raciais se enquadravam no
típico perfil da mulher negra do norte da África.
Até
para o Papai Noel – quem haveria de imaginar? - sobrou deturpação fisionômica
de cunho racista. O bom velhinho de barbas longas do trenó tocado por renas,
venerado universalmente pela criançada, não passa, como todo adulto está calvo
de saber, de uma figura de ficção. Todos, também sabemos, porém, que Noel
surgiu inspirado na vida e obra de São Nicolau, alguém do mundo real que se fez
célebre por práticas de bondade e solidariedade. Tendo em vista que São Nicolau
e Papai Noel são convenientemente retratados, ao longo dos tempos como
personagens brancos, é oportuno tomar conhecimento de um fato especial. Nicolau
de Mira nasceu na Turquia em 270, época em que o país era praticamente uma
extensão da África. Tal circunstância conduz muitos historiadores a garantirem
que o santo em que se baseia a figura fictícia de Noel era negro.
As
situações emblemáticas ora reportadas fornecem argumentos para que analistas da
candente problemática racial, repositória de carga histórica volumosa de
ignomínias cometidas contra seres humanos de origem africana, proclamem, como
anota Joice Berth, escritora, arquiteta e urbanista, líder feminista, que “faz
parte do respeito à memória de uma pessoa negra não embranquecê-la”. Mais
ainda: “Deveria existir uma lei impedindo isso, o branqueamento premeditado de
figuras negras, pra encerrar esse capítulo vergonhoso da história do racismo”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário