Evocações
do meu passaporte (I)
Cesar Vanucci
“Delhi foi fundada pelos deuses. O Mahabharata, com suas
90 mil estrofes, conta a história.”
(De
um folheto distribuído aos turistas)
Retiro hoje do baú sugestivas anotações de
viagem, de duas décadas atrás, que ainda conservam frescor de atualidade.
O guia turístico que nos acompanha numa
visita a Agra garante, num portunhol caprichado. Nessa lindíssima cidade
indiana, famosa pelo Taj Mahal e outras deslumbrantes referências
arquitetônicas, existe um conjunto de edificações milenares que suplanta, em
grandiosidade – pasmo dos pasmos – o próprio santuário brotado da paixão do
califa (destronado pelo filho) autor do gesto de veneração à mulher amada mais
famoso da história. Da edificação desconhecida, avistam-se ao longe as
reluzentes e majestosas cúpulas de mármore. Ela é, entretanto, interditada aos
turistas estrangeiros e indianos. Tudo por culpa de terroristas ligados ao
fundamentalismo muçulmano, que alegam estar a edificação plantada em solo
sagrado, hoje em poder de infiéis.
Também o Taj Mahal, pelo que revela o guia, é
alvo de atenções permanentes por parte das forças de segurança, à vista das
ameaças dos radicais religiosos. Nas três guerras com o Paquistão, os militares
criaram à sua volta artifícios de camuflagem visando protegê-lo de eventuais
ataques, inclusive aéreos.
Já noutra região menos conhecida da Índia,
Monte Abu, Rajastão, não inserida nos circuitos turísticos tradicionais, localiza-se
mais um incrível complexo arquitetônico, construído em mármore, na mesma linha
suntuosa do Taj Mahal. É o “Delwara Jain Temples”, composto de cinco santuários
lindíssimos. Do ponto de vista de esculturas, o conjunto chega a suplantar o
Taj. Pode ser apontado entre as grandes maravilhas da antiguidade.
É o mesmo caso da Cidade Abandonada
localizada na planície entre Jaipur e Agra, com seus palácios, templos e
cidadelas de beleza impressionante. Ou
da Cidade Rosada, do Fort Amber e do incrível Observatório Astronômico de
Jaipur (capital do Rajastão). Todos têm posição de justificado relevo, no
patrimônio cultural da humanidade, ao lado de outras obras portentosas indianas
e não indianas.
Nos relatos dos guias indianos, a caverna de
tesouros acumulados por Ali Babá não é lenda. A caverna existe. Está situada na
região de Fort Amber. E, pelo menos numa ocasião, em tempos recentes, o
“abre-te Sézamo” aconteceu. Foi no governo de Indira Gandhi. O Exército
vasculhou as encostas das fortificações, num trabalho extenso de escavações,
conseguindo desenterrar parte do tesouro.
Em todos os lugares que preservam tesouros
arquitetônicos de eras remotas, como o Egito, Peru, Bolívia, México, Tibet,
China, para ficar nalguns exemplos, os guias
trazem na ponta da língua as explicações sobre a origem misteriosa das maravilhas contempladas. São, geralmente,
explicações pouco convincentes. Sobra sempre a impressão de que ficaram
faltando muitas coisas, até mesmo por compreensível falta de um conhecimento
técnico mais aprofundado da realidade pesquisada. Assim também nos pontos
turísticos fabulosos da Índia. Com uma diferençazinha. Os relatos ali são mais
coloridos. Mais cheios de imaginação e de filigranas retóricas. Afinal, a Índia
é o país das mil e uma noites!
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