quinta-feira, 14 de novembro de 2019


Sonoro não aos despautérios

Cesar Vanucci

“Não se agride o espírito democrático impunemente”.
(Paulo Pinheiro Chagas, saudoso escritor e homem público)

Os despautérios cometidos por elementos do núcleo central do Governo, alvejando valores muito caros à Democracia e Cultura brasileiras, vêm jorrando, nestes nossos dias, com a mesma desnorteante desenvoltura e impetuosidade das misteriosas manchas de óleo surgidas nas faixas litorâneas em agressão violenta ao meio ambiente, às atividades turísticas e economia de centenas de municípios nordestinos. Ambas as situações são, obviamente, de feição a causar transtornos, perplexidade e preocupação à coletividade.  

Detendo-nos no primeiro fator causal do detectado desassossego comunitário, vemo-nos impelidos a lançar no ar pergunta atravessada como espinho na garganta de toda gente. Até quando persistirão esses repetitivos e inconsequentes abusos retóricos, de nauseabundo teor antirrepublicano?  A Nação anda clamando por um basta nesta história pra lá de incômoda! O pronto e decidido coro de vozes irrompido recentemente, no seio da opinião pública, há que ser interpretado como benfazeja reação ao tropel de impertinências assacadas contra o sentimento nacional.

A tresloucada opinião de um parlamentar radical, volta e meia emaranhado em bravatices de escancarado bolor totalitário, “ameaçando” o país com um novo AI-5, desencadeou compreensível clamor nacional. O fragor do repúdio fez esquecidas, por algum tempo, divergências, desencontros e até entrechoques de ideias, às vezes agudos, inerentes ao cotidiano político. Cidadãos de diferentes tendências e crenças, deixando de lado antagonismos periféricos, fizeram questão absoluta de bradar, alto e bom som, seu inconformismo e repugnância a qualquer manobra subversiva que atente contra as instituições. Sem discrepâncias ao expressarem visceral repulsa à provocação do despreparado parlamentar, lideranças de todos os segmentos e matizes deixaram evidenciada, com todos os pontos e vírgulas, firme disposição de confrontarem quaisquer vociferações e gestos bolorentos dos que utilizam a imprecação do furor para atingir a pureza e serenidade dos magnos valores culturais e democráticos.

O recado que as forças vivas da nação estão passando, aos responsáveis por atos e linguajares conflitivos com a consciência cívica, documenta discordância frontal a tudo quanto, em gestos ou ditos, possa representar ameaça ao regime democrático. Regime esse que, nada obstante perceptíveis defeitos, acha-se consagrado na memória e sentimento das ruas como único compatível com a dignidade humana. Regime que, aliás, a propósito, deu chance a alguns dos que, desastrada e equivocadamente, perseveram na inglória tarefa de miná-lo em sua essência, a serem guindados às importantíssimas funções hoje exercidas.

Fique bastante explícito, para os extremados adeptos de facções alojadas nas lateralidades ideológicas incendiárias, que os brasileiros rechaçam, com veemência, “atos institucionais” de qualquer numeração. Rechaçam obstruções de qualquer ordem à liberdade de ir e vir, bem como à livre dicção de ideias e cerceamento da voz da imprensa. Rechaçam também prisões clandestinas e torturas aviltantes, louvações, como figuras icônicas, de ditadores e torturadores. Consideram inaceitáveis o desrespeito e achincalhe de instituições representativas da sociedade livre, grosseiramente configuradas como óbices a remover em perverso esquema de erosão democrática.

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