Encruzilhada
fatal
“Apenas 26 cidadãos acumulam riqueza equivalente
à renda de 50 por
cento da população mundial”.
(Estarrecedora revelação
constante de pesquisa da “Oxfam International”)
As
evidências trazidas pelo noticiário nosso de cada dia são de clareza solar. A
sensação dominante em todos os quadrantes deste maltratado planeta azul, do
Polo Norte ao Polo Sul ainda enregelados apesar do ameaçador aquecimento global,
é de que muitas coisas relevantes e decisivas não mais serão como dantes, assim
que arrefecidos os efeitos do flagelo que ceifa vidas, destrói patrimônios e
bagunça o cotidiano das pessoas.
Nesta
hora de exacerbada tensão, muitos somos os que, tomados de ardente esperança,
nos agarramos a uma ideia generosa e redentora. Pomo-nos todos a imaginar que,
paralelamente a indesejável escalada do vírus, esteja ganhando forma, em ritmo
até – praza Deus – mais célere, nas mentes e corações fervorosos, um projeto grandioso.
Um projeto com o nobre intuito de reconectar o mundo com sua humanidade. Um
projeto a ser encampado por lideranças lúcidas, sensatas, inventivas,
empreendedoras, com capacidade para influenciar e decidir, que persiga com
obsessão santa o propósito do refazimento, necessário e urgente, das estruturas
sociais injustas que regem, ainda hoje, a marcha dos acontecimentos na pátria
dos homens.
A
crise humanitária atual escancarou, uma vez mais, de maneira contundente, o fato
de que a jornada civilizatória está diante de fatalística encruzilhada. Um
bocado de gente, presa de angústia, admite mesmo que chegamos à hora crucial do
tudo ou nada. O dilema proposto tem um jeito de esfinge egípcia. Parece dizer:
decifra-me ou devoro-te! Os dias depois do amanhã vão ser, inevitavelmente,
diferentes. Qual será a sua configuração? Claras, bastante claras, as
alternativas que se descortinam, ao olhar interrogativo e apreensivo de todos,
nos plúmbeos horizontes da caminhada humana. Ou se opta pela continuidade dos modelos
de vida vigentes, ou por uma mudança substancial de rumos. Persistir nas
interpretações equivocadas da aventura da vida, que vicejam soltas por aí há
tanto tempo, ou seja, deixar tudo ficar como está, pra ver como fica, é apostar
no desastre. É garantir a certeza inapelável de um desfile ininterrupto de
crises humanitárias, de encrencas colossais de toda ordem. É proclamar,
irresponsavelmente, definitivamente, a negação de todos os valores humanísticos
e espirituais que, teoricamente, argamassam a cultura humana. É criar condições
propicias para a implantação do caos absoluto. As calamidades poderão chegar a tal
ponto que, numa indesviável hora de acerto de contas moral e espiritual, implicando
indivíduos e coletividade, ponderar não mais restar crédito algum para
quitações derivadas das infalíveis cobranças.
O coronavírus, bem como outras tragédias esporádicas
ou permanentes que agridem a consciência humana, convocam-nos a uma reflexão sobre
flamejante questão. A questão está alojada no cerne de vasto, complexo e
perturbador estado de coisas. A perversa distribuição da riqueza construída
pelo labor produtivo da humanidade é considerada a raiz de males que aviltam a
dignidade. Pesquisa recente da “Oxfam International”, pertinente à concentração
de renda e desigualdades sociais, lançam-nos na cara, como bofetada, os dados estarrecedores
alinhados na sequência. Em 2018, 26 indivíduos apenas eram detentores, no mundo
inteiro, de soma de haveres equivalentes à renda acumulada de 3,8 bilhões de
pessoas. No período citado, a riqueza dos miliardários cresceu R$ 3,3 trilhões,
vale dizer, elevou-se a R$ 9,4 bilhões a cada dia. As impactantes revelações do
relatório global produzido pela conceituada ONG, vão muito além. Se um por
cento dos caras mais ricos do mundo fossem compelidos a destinar 0,5% a mais em
tributos sobre sua riqueza pessoal, a receita proveniente dessas hipotéticas
taxas geraria recursos suficientes, ou até superiores, para acudir a gastos essenciais
nas seguintes circunstâncias: assegurar educação a todas as 262 milhões de crianças
que deploravelmente não frequentam escolas; fornecer assistência médica continua
a 3,3 bilhões de criaturas.
As proporções descomunais dessa indecência
social, capaz de enfurecer deuses de todas as crenças, ocasionam perplexidade
ainda maior, se isso é possível, quando se toma conhecimento que 3,4 bilhões de
viventes, metade da população planetária, vivem (?) com menos de R$ 21 por dia.
Mais: especialistas em finanças calculam que, guardadinhos nos cofres dos
paraísos fiscais, a começar pela Suíça, exista, aproximadamente, uma bufunfa,
de origem nem toda ela lícita, de R$28,5 trilhões.
O papo sobre o que se está sendo dito vai ter
que ser, obviamente, espichado.
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