Prioridade
para o social
Cesar
Vanucci
“A
maneira mais fácil de antecipar o futuro é entender o presente.”
(John Naisbitt)
Em mais de uma ocasião,
expressamos, neste ponto de encontro de ideias frequentado pelo leitorado de
elevada linhagem cultural, nossa convicção em torno da prioridade absoluta que
se deve conferir nas cogitações humanas à questão social. A crise humanitária
em curso, expondo de forma mais aguda os males crônicos da caminhada
existencial, provocados em larga escala pela indecente desigualdade social,
confere atualidade mais refulgente a este tema. É a questão número um. Estamos
falando naturalmente da questão social. Prioritária dentro das prioridades.
Não importa tanto, no
contexto geral, o que pensem e digam os formuladores das estratégias da
política global de desenvolvimento. Por impecável que possa parecer, do ponto
de vista técnico, a tese segundo a qual a questão social só será equacionada em
plenitude depois de resolvidos outros desafios, fundamentalmente nas áreas
econômica e educacional, é bom não perder nunca de vista a sabedoria popular
quando apregoa que a teoria na prática é diferente.
Não há como obscurecer a
transparência dos fatos. O quadro que desfila incessantemente diante de nossos
olhares assustados exige papo curto e ação intensa e extensa. Não mais existe
fôlego suficiente, em lugar algum do mundo, para uma espera angustiante, que se
espiche no tempo. As dificuldades têm que ser enfrentadas já. Aqui e agora. Com
medidas práticas e objetivas. Com disposição e vontade política. O que não
exclui, evidentemente, a urgência na tomada de providências complexas, de maior
amplitude, capazes de assegurar conquistas futuras definitivas. John Naisbitt
ensina que a maneira mais confiável de antecipar o futuro é entender o
presente. E agir logo em função das constatações levantadas.
É como se, de repente,
enfrentando cara a cara a cruel realidade universal dos cortiços desassistidos,
dos guetos mal vestidos, da mendicância desamparada, dos atendimentos
insuficientes no campo da saúde pública, do abandono infantil retratado em
cenas de rua contundentes, espalhados por esse mundo do bom Deus onde o tinhoso
costuma fincar alguns enclaves, resolvêssemos traçar, simultaneamente, duas
linhas de atuação. Ambas fundamentais na procura das soluções pertinentes.
Numa delas, cuidando de
aperfeiçoar, com a urgência requerida, os instrumentos jurídicos em condições
de garantir a justiça social, pessoas e instituições sairiam no encalço dos
semelhantes excluídos, entregando-lhes apetrechos de pesca com orientação sobre
como fisgar o peixe. Na outra vertente, desencadeada também em ritmo de
emergência, a sociedade partiria ao encontro das populações marginalizadas,
onde necessário, para entregar-lhes postas de peixes, de forma que possam
sobreviver decentemente e manter acesa sua esperança na solidariedade humana.
Não há como fugir dessa
dupla proposta de ação social apelando para sofismas e conversa mole. Com
discurso formal evasivo, oco de conteúdo. Com alegações que camuflem a ausência
do desejo de engajamento. Ninguém, verdadeiramente permeável ao clamor das
ruas, mostra-se disposto a aceitar sem questionamentos a negligência das
lideranças, representada por manobras diversionistas. Manobras que costumam
deslocar o foco central da questão analisada, conservando incólumes as
estruturas sociais iniquas que aí estão. São estruturas, como sabido, derivadas
da indiferença e insensibilidade, da injustiça pontuada por perversa
concentração de renda, que brada aos céus.
O
sentimento do mundo é desfavorável para procedimentos esquivos, vazados em
meias-verdades, revestidos de falsos refinamento e sutileza, na verdade
potencialmente explosivos. É preciso
refazer as linhas de atuação social do mundo, reconectar o mundo com sua
humanidade. Dar tratos à inteligência e
criatividade, descartando fórmulas de diferentes tendências ideológicas e
políticas exageradamente desgastadas na busca, tão almejada pelas multidões, de
soluções para os aflitivos problemas detectados em tantos recantos socialmente
desguarnecidos deste nosso maltratado planeta azul.
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