Não
precisava ser assim
Cesar Vanucci
“Esse nosso infernal cotidiano!”
(Domingos Justino
Pinto, educador)
Carga
pesada. Isso tudo e a um só tempo. Essa infinidade de mazelas, que enxameiam de
aflição e angústia a pedregosa caminhada humana, confere algum sentido a desnorteante
observação do pensador Aldous Huxley. E se, meio assim de repente, a gente
descobrisse que a Terra é o inferno dos demais planetas da Via Láctea?
Tudo
isso acontecendo junto, neste preciso momento, neste mundo repleto de
inexplicabilidades onde o tinhoso costuma armar barraca e aprontar baitas
confusões. Pandemia desenfreada de Covid-19, vírus de origem desconhecida,
contaminando e matando milhões, disseminando pânico e estrangulando o
desenvolvimento econômico. Hospitais de menos para pacientes de mais, numa
extensão territorial que vai de Bangladesh aos Estados Unidos, passando
naturalmente pelo Brasil. Escassez de leitos em enfermarias e unidades de
terapias intensivas. Almoxarifados desfalcados chocantemente de aparelhos
respiratórios e doutros apetrechos de proteção indispensáveis, até mesmo anestésicos.
Fila pra tudo. Fila por boias de sobrevivência em mar encapelado, enquanto se aguarda
pelo barco de socorro moroso. Fila pra maca, ambulância, atendimento de
urgência, tratamentos paliativos, leitos, terapia intensiva, respiradouros,
medicamentação. Correndo paralelo à crise humanitária, os custos dos remédios escalam
altitudes himalaianas. Por outro lado, parte considerável dos necessários
auxílios pessoais de emergência fica retida no emaranhado burocrático. O mesmo
sucede com os estímulos financeiros destinados a socorrer empreendedores, tendo
por causa a tradicional insensibilidade social do sistema bancário, que nestes nossos
pagos brasileiros habituou-se a operar com os juros mais escorchantes da já citada
Via Láctea.
Indícios
de deslavada corrupção nas aquisições exigidas pelas circunstâncias de produtos
essenciais no combate à enfermidade. Incompetência manifesta de lideranças
políticas institucionalmente incumbidas de comandarem as ações de enfrentamento
do flagelo que assola a humanidade.
Em
outras frentes da batalha pela vida, mais sinais alarmantes são emitidos do
irremediável descompasso geral, flagrado a mancheia por aí, entre o que é feito
usualmente, mundo afora, e as legítimas aspirações da sociedade. Aspirações hauridas
em propostas humanísticas e espirituais capazes de recobrirem de dignidade a
aventura humana. Personagens de proa nos escalões do poder decisório alegam,
com certa frequência, que os insucessos ocorridos em seus bem-intencionados projetos
de universalização do bem-estar social potencialmente garantido pelos avanços
tecnológicos e científicos esbarram sempre em fatores fortuitos, alheios à
vontade. A “explicação” remete a uma fala famosa de São Bernardo, quando diz
que de boas intenções e desejos o inferno está cheio...
A
carga pesada despejada nos ombros dos indefesos viventes abrange mais
incontáveis itens. Corrida armamentista frenética. Guerras insanas geradas por
nebulosas conveniências geopolíticas-econômicas e por ideologias incendiárias.
Aplicação leviana de recursos públicos em gritante menosprezo às prioridades
sociais. Concentração aviltante nas mãos de poucos da riqueza produzida pelo
labor coletivo. Clamorosas desigualdades sociais. Miséria ao rés do chão em
fatias consideráveis de chão intensamente povoadas. Epidemias grassando em
lugares aonde ainda não chegaram serviços de infraestruturas básicas, tipo rede
de esgoto, água canalizada e por aí vai... Surtos de cólera dizimando
populações inteiras por falta de - imaginem só! - soro fisiológico, uma simples
mistura caseira de água e sal.
Redes
sociais na contramão de sua relevante missão, ocupadas, boa parte do tempo, com
mórbida assiduidade, por hordas de fanáticos e insensatos empenhados na propagação
de falsidades, conteúdos destorcidos da história, interpretações amalucadas do
sentido das coisas. Racismo repugnante. Intolerâncias, discriminações, fobias,
alvejando impiedosamente etnias, crenças, gêneros, faixas etárias, estabelecendo
regimes de castas institucionalizados ou não. Agressões sistemáticas ao meio ambiente.
Aquecimento global, devastação florestal, como consequências funestas do excesso
de ganância, ignorância, prepotência. Desemprego também em proporções pandêmicas.
Transtornos climáticos ameaçadores: tsunamis, ciclones, terremotos, degelo nas
calotas polares, crateras gigantescas na camada de ozônio que envolve o
Planeta.
Coisas
demais. Não precisava ser assim. É o caso até de se lançar no ar uma pergunta mesclada
de dúvida, inquietude e temor. Será que a intrigante observação de Aldous
Huxley não está provida de (alguma) pertinência?
Um comentário:
Pois é, César. Precisa ser assim?
Como pensar nas possibilidades de um mundo melhor se não temos a verdade do compromisso e respeito de representantes e representantes!
O cenário precisa ser mudado pela honra do fundamento da vida ao propósito da evolução civilizatória.
Que os alegres sons da natureza cheguem aos corações numa magia divina.
Abraços
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