Chá russo
Cesar
Vanucci
“O povo
com seu bom senso nativo, com a sua segura intuição das coisas boas, justas e
legítimas, nunca tomou chá.”
(Escritor Ramalho Ortigão, “As Farpas”,
conforme registro do “Dicionário de Citações”, de Paulo Rónai.”
· O tzar Vladimir Putin
não é de dar “colher de chá” pra ninguém. Que o digam seus adversários. Prefere
dar chávena inteira de chá. Com veneno dentro.
Quem dele ouse discordar expõe-se a
riscos. Dentro ou fora da imensidão territorial russa. O opositor da vez, na
lista dos atingidos pelos “sutis” processos empregados com objetivos de
retirada abrupta de “desafetos” do palco político, é Alexei Nalvany. O citado
cidadão tornou-se famoso pela divulgação sistemática, com ênfase nas redes
sociais, de denúncias acerca de arbitrariedades cometidas pelas autoridades
supremas do Kremlin.
O
atentado de que foi alvo pode ser assim resumido. Em Tomsk, Sibéria, ele tomou
chá num bar do aeroporto, enquanto aguardava voo para Moscou. Instantes depois,
já alojado no avião, foi visto a retorcer-se em dores. Em Onsk, a 750
quilômetros do ponto de partida, por conta do agravamento de seu estado de
saúde, o aparelho foi forçado a fazer uma parada de emergência. Inconsciente,
Alexei foi hospitalizado. O boletim de
internamento acusou coma. Companheiros seus de embates políticos, alarmados,
resolveram botar a “boca no trombone”. Bradaram alto, provocando comoção
internacional, a informação de que Alexei, a exemplo de outros em passado
recente, havia sido envenenado por ordem de Putin. A repercussão adquiriu tal
proporção que às autoridades russas não sobrou outra alternativa senão atender,
relutantemente, em meio a tensas negociações, ao apelo angustiado de parentes
da vítima e organismos internacionais vinculados a movimentos humanitários, no
sentido de que o paciente pudesse deixar a Rússia e ser medicado na Alemanha. Entregue a cuidados médicos especiais, já a
esta altura em Berlim, ele se encontra em fase de recuperação.
Os
laudos médicos alemães corroboram a suspeita de envenenamento, categoricamente
negada por fontes oficiais de Moscou.
O
amplo noticiário a respeito dessa impressionante história, que parece extraída
de novela policial, fala de uma extensa relação de casos de envenenamento
registrados, em anos recentes como já dito, envolvendo, “coincidentemente”,
outros cidadãos que ganharam notoriedade por militância ativa nas hostis da
oposição ao governo. É oportuno recordar, a propósito, que o dirigente russo
ostenta no currículo a condição de haver comandado, nos tempos do autoritarismo
bolchevista, a temida KGB.
Abaixo
vêm alinhados os nomes dos demais desafetos do mandatário russo apontados como
vítimas de envenenamento.
Iuri Sochekochikhin, jornalista investigativo.
Faleceu. Anna Politkovskia, jornalista investigativa. Sobreviveu ao “chá”, mas
foi assassinada a tiros, algum tempo depois. Viktor Iushchenko. Sobreviveu.
Alexander Litvinenko, ex-espião. Ficou seriamente enfermo, após tomar chá, em
Londres, na companhia de um colega de profissão. Serguei Skripal, ex-agente
russo. Juntamente com a filha, sofreu atentando por envenenamento numa praia no
Reino Unido. Ambos conseguiram se recuperar. Piotr Verzilov, ativista político
oposicionista. Sobreviveu, após receber, como acontece agora com Alexei,
tratamento emergencial de desintoxicação por envenenamento ingerindo chá. A
assistência médica que permitiu sua recuperação foi prestada em clínica alemã.
As
afamadas “casas de chá” de Moscou e São Petersburgo, tradicionais pontos de confraternização
mundana das celebridades russas, parecem haver perdido, nestes tempos
desvairados, seu fascínio e charme. Andam às moscas, como se costuma dizer no
linguajar das ruas... E não por causa apenas da covid-19!
· Vamos admitir, condescendentemente,
num voo condoreiro de imaginação, que 95 por cento dos malfeitos atribuídos
pela mídia a Vladimir Putin e Donald Trump não passem de meras “intrigas da
oposição”. Mas, cá pra nós, falar verdade, esses 5 por cento restantes são
suficientes o bastante pra produzir calafrio na espinha de qualquer mortal. Não
há como esquecer que ambos, os dois, ao lado de alguns outros integrantes (não
tão confiáveis assim) da confraria gestora do chamado “clube atômico”, são
detentores do poder de acionar os botões daqueles apavorantes painéis montados
com a tétrica finalidade de atear fogo no
mundo, se isso, por acaso, atender às conveniências soberanas da geopolítica
dominante. Valha-nos Deus, Nossa Senhora!
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