De xumbregância e capadura...
Cesar Vanuccci
“A capadura deverá ser a macete."
(Decisão judicial de 1833)
No documento
abaixo transcrito, que desencavei do fundo do baú, conta-se como o cabra da
peste Manoel Duda, por causa de malefícios praticados contra a mulher de Xico
Bento, foi condenado à capação a macete, nos idos de 1833, na comarca de Porto
de Folha. Já na súmula da decisão, é sublinhado que “comete pecado mortal o
indivíduo que (...) faz coças de suas victimas desejando a mulher do próximo
para (...) suas chumbregâncias”.
A decisão do
Juiz Municipal, acolhendo representação da Promotoria, é abaixo reproduzida,
respeitada a ortografia original, inclusive com a expressão xumbregância
grafada com “ch”.
“VISTOS, ETC.
O adjunto de Promotor Público, representa contra o
cabra Manoel Duda, porque no dia 11 do mês de Nossa Senhora Sant’anna, quando a
mulher do Xico Bento ia para fonte, o supracito cabra que estava de tocaia em
uma moita de mato sahiu della de supetão e fez proposta a dita mulher (...),
para coisa que não se pode trazer a lume, e como ella se recusasse, o dito
cabra abrafolou-se ella, (...) deixando as encomendas della de fora e ao Deus
dará, e não conseguio matrimonio porque ella gritou e veio em assucare della
Nocreto Correia e Clementos Barbosa, que prenderam o cujo em flagrante, e pediu
a condenação delle como incruso nas penas de tentativas de matrimonio proibido (...). As testemunhas, duas são de vista porque
chegaram no flagrante e bisparam a perversidade do cabra (...). Dizem as leises
que duas testemunhas que assistam a qualquer nauvrágio do sucesso faz prova
(...):
CONSIDERO
– que o cabra Manoel Duda, agrediu a mulher do Xico Bento por quem roia a
brocha, para conxambrar, com ella, coisas que só o marido della, competia
eonxambrar, porque eram casados pelo regime da Santa Igreja Catholica Romana; -
que o cabra deitou a paciente no chão e quando ia começar as suas
conxambranças, viu todas as encomendas della que só o marido tinha o direito de
ver; - que a paciente estava peijada e que em conseqüência do sucedido, deu à
luz de um menino macho que nasceu morto; - que o cabra é um suplicante deboxado
que nunca soube respeitar as famílias, tanto que quis também fazer
comxumbranças com a Quitéria e Clarinha, que são moças donzellas, e não
conseguio porque ellas repugnaram e deram aviso a polícia;- que Manoel Duda é
um sujeito perigoso e que não tiver uma causa que atalhe a perigança delle,
amanhã está metendo medo até nos homens por vias das suas patifarias e deboxes;
- que Manoel Duda está em pecado mortal porque nos Mandamentos da Igreja é
proibido desejar a mulher do próximo (...); - que sua Majestade Imperial (...)
precisa ficar livre do cabra Manoel Duda para secula, seculorum amém, arrefem
dos deboxes e semveregonhesas por elle praticados.
POSTO QUE:
Condeno o cabra Manoel Duda, pelo malifício que fez
a mulher do Xico Bento (...) a ser CAPADO, capadura que deverá ser feita A
MACETE.
A execução deverá ser feita na cadeia desta Villa,
Nomeio carrasco o Carcereiro. Feita a capação depos de 30 dias o mesmo
Carcereiro solte o cujo cabra para que se vá em paz. O nosso prior aconselha –
Homine debochado eboxatus mulherorum inovocabus est sententias quibus capare
est macete macetorim carrascus sine facto nortre negare pete.
Cumpra-se e apregue-se editaes nos lugares
publicos. Apelo ex oficio desta sentença para o Dr. Juiz de Direito desta
Comarca.
Porto
de Folha, 15 de outubro de 1833
a) Manoel Fernandes dos Santos, Juiz Municipal
suplente em exercício”.
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