Instrumento
de valorização da língua
Cesar
Vanucci
“O
idioma é a pátria”.
(Monteiro Lobato)
Em
sessão solene realizada no dia 24 de julho, a Academia Municipalista de Letras
de Minas Gerais deu posse aos seus novos dirigentes para o biênio 2021-2023.
Sucedeu-me na presidência da instituição, que exerci por cinco anos, a
acadêmica Maria Inês de Moraes Marreco. Trechos do
pronunciamento que fiz na ocasião são abaixo reproduzidos.
“Nosso ingresso na Academia deu-se em 2008”. (...), “Mas o primeiro contato com a entidade ocorreu muitos anos antes, década de 60, quando da posse da saudosa poetisa Eva Reis nos quadros acadêmicos deste sodalício. Fomos convidados por ela para apresentá-la. Houve um momento todo especial quando, na saudação, emitimos alguns conceitos sobre a atividade poética. Relatamos um episódio momentoso envolvendo Manoel Bandeira. Indagado quais seriam os versos mais lindos da poesia brasileira, o grande vate não titubeou ao apontar dizeres extraídos da canção “Chão de Estrelas”, de Orestes Barbosa e Silvio Caldas: “Tu pisavas nos astros, distraída”. Eis que, neste preciso momento, um ilustre acadêmico, apreciado poeta, professor Reis, interrompeu com aparte nossa fala, expressando discordância frontal ao registro atribuído a Manuel Bandeira.
Durante prolongados minutos, o ambiente
foi dominado, inesperadamente, por interessante entrechoque literário,
desenrolado em clima de extrema cordialidade. Já naquela época, demo-nos conta
de algo que nosso presidente emérito Luiz Carlos Abritta proclama com
frequência: a Amulmig é “um oásis de confraternização, solidariedade e
amizade”. Comprovamos com constância que ele está coberto de razão”. (...)
Roteiro
vitorioso
“Somos gratos aos nobres companheiros
acadêmicos o apoio nunca recusado as iniciativas e promoções. O que conseguimos
fazer foi sempre exitoso graças a essa colaboração fraternal. Como costumamos
dizer, a serenidade de Deus está sempre presente nas coisas que fazemos
juntos”. (...)
Valorização
da língua
“Procuramos conduzir os
trabalhos seguindo o roteiro vitorioso de meus predecessores. Nossos encontros
periódicos, em tempos de pandemia virtuais, nossas publicações impressas e
digitais foram sempre ricas em conteúdo cultural”. (...) “É justo reconhecer
que nossa comunidade mantem-se empenhada na utilização da palavra como
instrumento de valorização da língua. Entendemos que o idioma é a pátria, como
anota Monteiro Lobato”. (...) “À vista disso consideramos indício de indigência
cívica e mental o emprego abobalhado – que tanto se vê por aí, em
diversificadas atividades - de vocábulos estrangeiros para classificar coisas
óbvias do cotidiano”. (...)
A
palavra social
“Vemos, também, como
indeclinável à missão dos que mourejam no oficio das letras a utilização da
palavra como instrumento de ação social. A palavra há que ser utilizada aí para
criticar com veemência as clamorosas desigualdades sociais, as violências de
qualquer gênero contra a dignidade da pessoa humana”. (...) “A transferência de
poder numa instituição lembra, de certa maneira, uma prova de corrida típica de
Jogos Olímpicos. Ao dar por finda sua participação, o gestor passa ao gestor
que irá sucedê-lo o bastão que lhe foi entregue pelo gestor anterior. O bastão,
no caso, é simbólico.
Saberes
acumulados
Representa os haveres acumulados nas diversas etapas já percorridas. São saberes que têm significado de frutos generosos, brotados da inteligência, da criatividade artística, do engenho poético, da força arrebatante e fascínio da palavra bem esculpida. São frutos que permanecerão, como se diz no Evangelho. A Amulmig é guardiã serena desse admirável patrimônio cultural, construído pelo idealismo e pertinácia de seus dignos integrantes. Tal patrimônio, evidentemente, pertence à comunidade. Os gestores, a exemplo dos corredores olímpicos, incumbem-se de manter, no percurso da corrida que se lhes é confiado, o ritmo dos companheiros que lhes passarem o bastão, de sorte que a jornada culmine no pódio triunfal.”
Cultura é tudo
“Demo-nos
de nós, conscientes de nossas limitações, o melhor em esforços e boa vontade,
nos mandatos que nos foram confiados. Procuramos manter o compasso vibrante,
entusiástico, imprimido por dinâmicos e brilhantes confrades nas administrações
que precederam nossa atuação. Confessamos, em boa e leal verdade, nutrir certo
receio de não havermos alcançado plenamente nosso intento. Consolam-nos,
entretanto, os dizeres de um “ditado chinês”. Um “ditado chinês” que tomamos a
liberdade de “inventar” para este momento. Segundo o “tal ditado”, aos olhares
benevolentes dos deuses, o esforço bem-intencionado equivale a uma meia prece,
se rezada com fervor...
Realizações
enriquecedoras
De Maria Inês esperamos, todos
nós, realizações que enriqueçam a história da entidade, agigantando ainda mais
sua presença no cenário cultural das Gerais. É correto assumirmos, todos, o
compromisso de ajudá-la na execução de seus projetos.
Senhores e Senhoras, a cultura
é tudo! Parafraseando um “reclame” institucional televisivo que caiu no gosto
popular, cultura é tech, cultura é pop, cultura é tudo! Pode-se dizer até, de
modo brejeiro, aludindo ainda à paráfrase, que “agro é cultura” ...
Difundir a cultura é a missão
permanente de quem se dedica ao ofício das letras, em todos os tempos, mesmo em
épocas marcadas por adversidades geradas pelo obscurantismo, pelos radicalismos
negacionistas, pelas intolerâncias e preconceitos fundamentalistas.
Cultura é tudo! É a forma de
traduzir o sentimento nacional, o sentimento do mundo, as crenças humanísticas
e espirituais que conferem sentido à vida e garantem a dignidade do ser humano.
Goring
e Pauwels
Cultura é tudo! Ocorre-nos,
neste ponto, a lembrança de caso ocorrido nos tempos do fastígio nazista na
Europa. O segundo na hierarquia dos sinistros “camisas pardas”, Hermann Goring,
num desabafo colérico, exclamou: “Quando ouço falar em cultura, saco do coldre
o meu revólver!” O humanista francês Louis Pauwels cuidou, pouco depois, de
replicá-lo: “Quando ouço falar em revólver, saco logo do meu coldre minha
cultura!”
A cultura é tudo! A evolução civilizatória só se processa verdadeiramente com o reconhecimento da primazia das coisas do espírito sobre o resto. A cultura tem características ecumênicas, respeita as diversidades, exalta a democracia, zela pelas liberdades públicas e pelos direitos humanos fundamentais. Sentimo-nos orgulhosos de identificar na Academia que nos acolhe uma magnifica casa de cultura!
Francisco
de Assis e JK
Maria Inês,
Não lhe faltem, na missão que
lhe está sendo atribuída, as bênçãos de Francisco de Assis, nosso Patrono
Espiritual! Não lhe faltem as inspirações de cunho desenvolvimentista
democrático e republicano de nosso confrade JK – pode-se dizer – nosso “Patrono
Cívico”! Não lhe faltem os estímulos ditados pelos exemplos de trabalho e
dedicação dos fundadores, dos presidentes eméritos, dos companheiros que, ao
longo de profícua jornada, proveram a Amulmig de ideias generosas, palavras
vibrantes e ações fecundas.”
Discurso de posse de Maria Inês
de Moraes Marreco
Transcrevemos
na sequência o pronunciamento de Maria Inês de Moraes Marreco, na sessão solene
de sua posse na presidência da Amulmig.
"O futuro
é o que estamos fazendo hoje, poeticamente falando, somos seus fundadores e
reflexos do passado numa modelagem significativa da consciência do presente e
do olhar rumo ao horizonte.
Para
compensar o laconismo de um “muito obrigada” e expressar meu reconhecimento de
outra maneira, quero dizer que me sinto muito honrada por assumir a presidência
da AMULMIG, cujos membros constituem uma instituição que mantem mais vivo o
respeito pela liberdade do espírito, como veículo que levará ao público e às
associações congêneres a ressonância de suas atividades, para o conveniente
intercâmbio cultural, portanto, peça que não deverá faltar aqui, sob pena de
morrermos na poeira de um arquivo todo o trabalho realizado.
Que
esta casa, sede e lugar social do amadurecimento da nossa cultura, seja o cerne
do conteúdo do pensamento acadêmico.
Que
possamos realizar em conjunto as tarefas impossíveis de serem realizadas
sozinhas. É a cooperação que transforma os esforços diversos e dispersos em
esforços produtivos.
Espaços
produtivos, tarefas complexas que envolvem divisão de trabalho e demandam
habilidades especializadas, que não se encontram em uma só pessoa. Tarefas que
só poderão ser realizadas com a cooperação de todos, caso contrário, nenhum
produto terá condição de surgir.
Nas
palavras de Zygmunt Bauman: “... se carregar um pesado tronco de um lugar para
o outro requer uma hora e oito homens, não se segue que um homem o possa fazer
em oito (ou qualquer número de horas)”.
Assim,
apelo para os membros de nossa nova diretoria, que me auxiliem a carregar o
tronco, pois, tenho certeza de que não o conseguirei sozinha.
Aprendi
que o jeito mais fácil de crescer como pessoa é me cercar de pessoas melhores
do que eu. Dessa maneira, estarei cercada de duas Angelas, a Laguardia e a
Togeiro, Angelas cujos nomes significam anjos; um João, agraciado por Deus,
indica uma pessoa com forte espírito de liderança, cujos atos sempre visam o
benefício da maioria, pois possui nobreza de caráter; uma Altair, aquela que
confia na própria capacidade de contornar as dificuldades, outra Maria Inês, (meus
amigos, uma já vai ser difícil de aguentar, duas então!!! Por favor, tenham
paciência), mas dizem que as Inêses são calmas e ponderadas; uma Tânia, que
significa: “... pessoa que vai conseguir sucesso porque é paciente,
perseverante e habilidosa, quando precisa enfrentar obstáculos. Inimiga de
gastos supérfluos, mantém as finanças em dia. Queridos amigos, essa será a
nossa primeira tesoureira; a segunda, Maria Armanda – Maria, nome que indica
serenidade, considera o dinheiro necessário, mas não essencial, é também
senhora, soberana, sabe dirigir o leme da vida; na biblioteca teremos a Maria
de Lourdes e a Marilene, cujas competências para o cargo são indiscutíveis.
Conto
também com o valoroso apoio de todos os membros do Conselho Fiscal e do
Conselho Superior, assim como, de todos que compõem as comissões: a de
avaliação, a de relações públicas e a do departamento de artes. Saibam que cada
um de vocês representa uma fonte, cujas águas serão imprescindíveis para a
realização dos nossos objetivos.
Caros
confrades e confreiras, juntando tantas forças, só temos que acreditar no
sucesso de nossa tarefa.
A
vida me premiou com o aprendizado de que a exposição pública de certos
sentimentos, não desgasta, mas impregna o convívio humano da calidez da amizade.
Portanto, não me esquivarei de lhes confessar a emoção que este momento me
traz.
É apropriado termos nesta
solenidade uma plateia mista. Acredito na verdadeira importância da união dos
gêneros como amigos, não como adversários, para alcançarmos, por meio da
cooperação, os muitos objetivos que temos em comum e que não poderíamos esperar
realizar isoladamente.
Creio que o duplicar a massa
de faculdades mentais disponíveis, possibilita a realização de um serviço mais
nobre para a humanidade. Estou certa de que só teremos sucesso em nossos
propósitos se nos pronunciarmos com uma só voz e agirmos com a mesma energia.
Assim como, acredito na união
das nossas Academias de Letras, A Academia Mineira, a AFEMIL, a Arcádia, O
Instituto Histórico e Geográfico, e, por que não, as academias do Espírito
Santo, do Rio de Janeiro, de Barbacena, de Mariana, de Itabira, de Ipatinga e
de todos os outros estados e cidades do Brasil e do mundo. Como membros destas
comunidades, trocarmos nossas experiências e promovermos um relacionamento mais
estreito. Já que, nossos objetivos são a expansão e o aprimoramento de nossas
culturas na construção de um Brasil mais próspero, livre, democrático, seguro e
feliz.
Todos nós, membros das
Academias culturais estamos cada vez mais preocupados em corrigir os desacertos
e injustiças da sociedade moderna, o que nos impõe novos fardos. Sabemos dos
descasos com o ensino, a cultura, a leitura, a escrita e, principalmente, a
memória.
Para quebrarmos esta corrente
precisamos agir em uníssono, com otimismo, acreditando no poder de contornar
tais situações, com coragem, imaginação e força de propósito. Está em nossas
mãos mudar o rumo dos acontecimentos se o fizermos juntos.
Senhoras e Senhores,
Nesta data assumo a presidência da Academia Municipalista de
Letra de Minas Gerais com a incumbência de trabalhar para seu engrandecimento.
Sou-lhes grata por me permitirem conviver com todos e com cada um.
Tenho prazer em servir à literatura na qualidade de brasileira e
comprometo-me servir a esta Casa com dignidade e alegria. Não me esquecerei
deste momento que imprime em mim as marcas da honra e do respeito. A medida que
os dias forem passando acredito que, ao assumir este compromisso, assumirei
também o de caminharmos juntos na certeza de que, como afirmou o influente
filósofo liberal britânico John Stuart Mill:
Homem e Mulher
foram feitos um para o outro e não à semelhança um do outro, temos apenas um
direito em comum com homens que podemos reivindicar – e isso está tanto nas
nossas mãos quanto nas deles – o direito de ter alguma coisa para fazer. (MILL,
2006, p. 1)
Eleva-me pertencer a esta
instituição que resistiu à degradação cultural imposta pelos tempos atuais.
Soube manter intacta a tradição que se sabe moderna.
Sou grata aos acadêmicos que
sufragaram meu nome, indicando-me para a presidência da Casa de São Francisco,
considerando-me digna de ocupar cargo de tamanha importância.
Estou ciente do valor dos
intelectuais que hoje me dão posse. Intelectuais que cumprem com intransigência
o ritual de frequentar as reuniões, na qualidade de membros efetivos.
Agradeço-lhes emocionada.
Chego a esta Casa em busca do
convívio enriquecedor, do ensejo único de privar com a preciosa memória que
emana deste Templo da Cultura.
Sob a égide das emoções,
quantas delas sem nome, reunimo-nos aqui trazidos pelas crenças de que,
enquanto formos capazes de honrar as alianças estabelecidas com nossos sonhos,
terá valido, para nós, esta viagem que iniciamos na fonte de nossas origens.
Uma viagem que nos leva a buscar as provas do amor humano, signo maior da nossa
humanidade.
Conforta-me, pois, desfrutar
desta convivência, deste universo erigido por homens e mulheres idealistas,
confiantes de que no futuro, seus herdeiros, agradecidos, buscarão suas obras
como forma de honrar as próprias vidas.
Valho-me das palavras de Eça
de Queiroz: “A Academia deve constituir um diretório intelectual que mantenha
na literatura o gosto impecável, a delicadeza, a finura do tom sóbrio, as
purezas da forma, o decoroso comedimento de maneiras e de absoluto respeito
mútuo, com uma convivência justa e harmoniosa”.
Na expectativa de que nossa
gestão traga em seu bojo todas essas características sublinhadas pelo escritor,
assumo esta presidência sob o resguardo da honra, do trabalho, da vida
comunitária. Pesa sobre mim, neste instante, o aviso de que responderei, junto
com esta diretoria, e em estreita aliança com todas os confrades e confreiras,
pelo difícil e digno dever de conduzir esta Casa.
Que aqui encontrem acolhida os
estratos sociais até então alheios à vida acadêmica, convergindo para nós as
evidências e os antagonismos culturais para que possamos renovar o retrato do
Brasil.
Que nesta diretoria prevaleça
o zelo pela língua, pelo rigor orçamentário, pelo acervo patrimonial, pela
biblioteca, pela revista, por nossas publicações a servir de ponte entre
tradições centenárias e apelos do futuro.
Muito obrigada."
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