Cesar Vanucci *
(Orestes Barbosa, no clássico “Chão de estrelas”, composto em parceria com Silvio Caldas)
A crônica literária registra uma manifestação de
Manuel Bandeira, que causou na época em que foi feita, anos atrás, grande
surpresa e chegou a provocar, até mesmo, um certo clima polêmico. Indagado
sobre quais seriam os mais belos versos da poesia brasileira, o grande vate,
sem titubeios, respondeu: “Tu pisavas nos astros distraída.” A resposta colocou
no foco das atenções um clássico da MPB, “Chão de estrelas”, de onde os versos
apontados por Bandeira foram retirados. Conferiu, também, justo realce a um excelente
poeta popular que não frequentava os salões acadêmicos mais refinados. Orestes
Barbosa, coautor da melodia, ao lado do portentoso intérprete Sílvio Caldas.
Arrostando
rançosos preconceitos com o veredito proferido, o autor de “Evocação do Recife”
convidou-nos, de certa maneira, com a autoridade de inconteste conhecedor do
fascinante oficio da versejação, a aprender extrair das
canções populares brasileiras outros achados poéticos.
Partilhando
dessa certeza de que a incomparável música popular feita no Brasil é um
repositório de poesia da melhor qualidade resolvi, quando de minha passagem
pela direção da Rede Minas de Televisão, abrir espaço especial num dos
programas que criei (“Um livro aberto”, dedicado à temática literária) para
interpretações musicais do cancioneiro nacional. O canto era acompanhado de
comentários sobre os versos das composições.
Dentro
dessa linha de raciocínio, resolvi também, em certo período, ampliar a tal
coleção de frases com letras de melodias conservadas no carinho e enlevo pela
memória das ruas.
Algumas
delas. “A felicidade é como a pluma que o vento vai levando pelo ar; tão leve,
mas tem a vida breve, precisa que haja vento sem parar.” (“A felicidade”, tema
do filme “Orfeu negro”, Vinicius de Moraes e Tom Jobim).
“Mas
que bobagem, as rosas não falam. Simplesmente as rosas exalam o perfume que
roubam de ti...” (samba-canção “As rosas não falam”, de Cartola).
“Atire
a primeira pedra, ai, ai, ai. Aquele que não sofreu por amor.” (“Atire a
primeira pedra”, Mário Lago e Ataulfo Alves).
“Vê,
estão voltando as flores. Vê, nessa manhã tão linda. Vê, como é bonita a vida.
Vê, há esperança, ainda” (marcha-rancho, “Estão voltando as flores”, Paulo
Soledade).
“Quem
nasce lá na vila, nem sequer vacila em abraçar o samba, que faz dançar os
galhos do arvoredo e faz a lua nascer mais cedo.” (“Feitiço da vila”, Vadico e
Noel Rosa).
“Batuque
é um privilégio, ninguém aprende samba no colégio.” (“Feitio de oração”, Noel
Rosa e Vadico)
“Se
a lua nasce por detrás da verde mata mais parece um sol de prata, prateando a
solidão.” (“Luar do sertão”, toada, Catullo da Paixão Cearense).
“Vem,
vamos embora, que esperar não é saber. Quem sabe, faz a hora, não espera
acontecer.” (“Pra não dizer que não falei de flores”, Geraldo Vandré)
“O
mundo é uma escola, onde a gente precisa aprender a ciência de viver, pra não
sofrer.” (“Pra machucar meu coração”, Ary Barroso)
“Fazer
samba não é contar piada, quem faz samba assim não é de nada; um bom samba é
uma forma de oração, porque o samba é a tristeza que balança e a tristeza tem
sempre uma esperança de um dia não ser mais triste não”. (“Samba da bênção”,
Vinicius e Baden Pawell).
“Ai!
Que amar é se ir morrendo pela vida afora. É refletir na lágrima, um momento
breve de uma estrela pura cuja luz morreu.” (Serenata do Adeus”, Vinicius de
Moraes).
“Nesta
viola eu canto e gemo de verdade; cada toada representa uma sodade.” (“Tristeza
do Jeca”, toada, Angelino de Oliveira).
“Tu
és, de Deus a soberana flor. Tu és de Deus a criação, que em todo o coração
sepultas o amor, o riso, a fé e a dor em sândalos dolentes.” (“Rosa”, valsa,
Alfredo Vianna, o Pixinguinha).
“O
mar, quando quebra na praia, é bonito, é bonito...” (“O mar”, Dorival Caymmi).
* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)
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